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sexta-feira, 19 de junho de 2020

VIDA CRISTÃ PÓS-PANDEMIA - Artigo - PR. ANDRÉ SOUZA


VIDA CRISTÃ PÓS-PANDEMIA





PR. ANDRÉ SOUZA
Presidente da COMADEMA/CADB no estado do Maranhão.




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EM APOCALIPSE 3.11 lemos: “Eis que venho sem demora; guarda o que tens para que ninguém tome a tua coroa”.
Como pastor, me preocupo com as novas formas de vida cristã após um período de pandemia como este. O impacto da pandemia na vida da igreja — com a vinda do coronavírus sobre a humanidade — pode ser visto com outro olhar a partir do afastamento da comunhão dos crentes uns com os outros.
O momento atual é de profunda reflexão, haja vista que todos nós ficamos preocupados. Até aqui parece ser um momento único. Igrejas fecharam suas portas. Polícia na rua controlando a vida e o direito de ir e vir das pessoas. O medo instalado no coração e na mente daqueles de ideias mais fixas. Pastores doentes. E nós, de fato, perdendo muitos amigos e parentes.
Mas, por outro lado, vemos muita gente mais preocupada com a impossibilidade de poder ir ao culto e adorar a Deus do que com a doença da COVID-19. Muitos buscaram alternativas e formas diferentes de fazer viver a fé. Os cultos on-line vieram como uma luva. O distanciamento entre seres humanos imprimiu na mente da humanidade uma nova cultura. Inclusive na mente da igreja.
A fé, de repente, passou a ser transmitida por computador, numa perspectiva diferenciada, suscitando perguntas e respostas sobre a vida cristã atual. Viver a espiritualidade de forma intensa passou ser um desafio para homens e mulheres em busca de sentido para suas vidas. Aliás, é um desafio que nos coloca frente a frente com o sofrimento e a morte em que a situação nos joga.
Todavia, em Mateus 28.20, Jesus disse: “Eis que estou convosco todos os dias até a consumação dos séculos”. Isto nos garante que, em qualquer situação, nunca estamos sozinhos. Em meio a problemas, desilusões, sofrimentos, crises, pandemias, etc... o Senhor sempre estará conosco. Estamos vivendo em tempos difíceis. Tempos em que, por vezes, temos a sensação de que Deus se distanciou. Parece que, por um momento, o Senhor deixou a humanidade sofrer um pouco as consequências do seu pecado.
No mínimo, as trevas do isolamento social, das ruas vazias, lojas fechadas e funerárias abertas 24 horas por dia mostram um espelho nada animador. O quatro é de incertezas, medo, dúvidas, silêncio mórbido e tristeza. Sempre que nos deparamos com pessoas na rua, seus olhares nos dão a impressão de um vazio desolador, que paralisa tudo no transitar do cotidiano. A verdade é que, nesse prisma sociológico, nos vemos temerosos e perdidos.
Mas a narrativa bíblica dos discípulos a caminho de Emaús nos dá a certeza de que, nas noites escuras da vida e da história, o nosso Senhor Jesus Cristo caminha conosco nos servindo com sombra e proteção. É certo que quando mantemos comunhão com Ele, temos a certeza de sua presença: ou nos livrando do leito da doença ou nos agraciando com o paraíso maravilhoso da vida eterna. Mas a verdade é que nunca estamos sozinhos. Ele só nos tira deste plano terreno quando nossa tarefa, aqui, terminou. Quando não faz mais sentido estarmos aqui neste mundo, Ele nos promove para uma vida superior ao lado dEle na eternidade.
Se você tem convicção da sua fé em Cristo, este tempo grave de pandemia pode até fechar as portas do templo para você assistir ao culto de forma física, mas não poderá fechar a porta do seu coração para orar, buscar a Deus, pregar a palavra e ler a Bíblia. Não poderá privá-lo de assistir aos necessitados com a justiça do evangelho: criando redes de solidariedade e levando pão e água a quem tem fome e sede de justiça. Esta e outras práticas cristãs da igreja invisível, de fato, nos enchem de espiritualidade em Deus.
Mesmo com os desmandos dos governos estaduais e municipais — tirando proveito financeiro da situação de crise e praticando suas injustiças contra a sociedade que já sofre com tantas mazelas da realidade social — a vida cristã segue seu plano de crescimento espiritual naqueles crentes que realmente nasceram de novo em Cristo.
Não se pode prevê até quando esta crise vai durar. Mas podemos intensificar o nosso compromisso com Cristo e nossa responsabilidade de vivermos este momento sem titubeio. Como pastor, tenho a responsabilidade de incentivar a minha igreja a cuidar da sua própria vida e da vida do próximo dentro da lógica do sentido bíblico.
É importante pensar na vida espiritual [e também social] da igreja de Jesus após a pandemia. Certamente nossa inteligência espiritual continuará se esforçando para descobrir uma nova forma de se fazer presente nas casas, nas famílias e na vida das pessoas sem quebrar a comunhão no aspecto físico. O corpo de Cristo é uma comunidade de fé, comunhão e, portanto, relacionamento. Um aperto de mão, um abraço afetuoso, uma conversa olho-no-olho e um sorriso gracioso são coisas que nunca devem ser trocadas por distanciamentos e/ou isolamentos.
Nossas celebrações na Assembleia de Deus Missão (ADM) voltaram e continuarão sendo presenciais. Jesus Cristo está presente em nós e, por isso, somos um corpo de verdade nEle. Por isso nos reunimos para orar, louvar, ouvir a palavra, pregar, celebrar a Santa Ceia e, assim, ter vida abundante em Jesus. Afinal de contas, a igreja reunida fisicamente é sinal da presença real do Cristo ressuscitado (Mt 18.20). É isso que faz os nossos corações se manterem aquecidos no amor do Senhor, de forma ardente e não fingida (1Pe 1.22-25). É este nível de espiritualidade que faz a igreja ser bênção na vida das pessoas no âmbito da comunidade. Há absoluta primazia no culto presencial.
Portanto, em vez de se alimentar o medo de visitar alguém e ficar vendo o que algumas televisões propagam para causar pânico nas pessoas, é momento de a igreja se voltar para a palavra de Deus. Devemos alimentar nossa esperança no Cristo de Deus, crescer nEle porque, pelos sinais que vemos acontecendo, uma nova ordem econômica mundial, no após-pandemia, poderá estar se organizando, em que o anticristo estará pronto para assumir e governar o mundo. Todavia, sabemos que Cristo está perto de voltar para levar a sua igreja para o céu de glória quando, então, estaremos com Ele para sempre.
Afinal, Ele nos garantiu: “Eis que venho sem demora; guarda o que tens para que ninguém tome a tua coroa” (Ap 3.11).


segunda-feira, 8 de junho de 2020

DOR E SOFRIMENTO - Artigo - PR. BATTISTA SOAREZ

ONDE ESTÁ DEUS 
QUANDO A DOR 
NOS ATORMENTA?





PR. BATTISTA SOAREZ
Escritor, jornalista, professor universitário, psicoterapeuta e teólogo. Autor do livro A igreja cidadã (AD Santos Editora).





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MORO NUMA CIDADE cercada de praias por todos os lados. Quem conhece São Luís, capital do Maranhão, sabe que para qualquer direção que a gente caminhe vai se deparar com maravilhosas águas do oceano atlântico. Quando quero pegar um mergulho nas ondas do mar, relaxar e higienizar a mente, não preciso percorrer muitos quilômetros e nem me preocupar com a distância.
A casa onde hoje moro, localizada na parte central da “ilha do amor” — como São Luís é conhecida pelos maranhenses, principalmente escritores, poetas e artistas da terra — é rodeada de algumas árvores frondosas e frutíferas. Isso atrai pássaros de várias espécies que, logo de manhã cedo, por volta das cinco horas, me acordam todos os dias. Então, num cantarolar festivo de passarinhos, me acostumei levantar nessas horas da manhã para fazer meu café, preparar cuscuz de milho e, assim, fazer a primeira refeição do dia. Depois de comer algumas frutas frescas, me debruço nos livros para estudar, orar. preparar aulas ou escrever. E olha que até pouco tempo atrás, eu morava no bairro do Turú, o que me aproximava ainda mais da praia, possibilitando-me descer a pé e, em poucos minutos, estava pegando ondas, depois de um breve exercício físico.
Quem ler este relato de parte da minha vida cotidiana poderá imaginar que, por vezes, a felicidade não se afasta, dando lugar ao sofrimento e à dor. Mas é fato. Nesse período de pandemia, eu fui infectado. Passei quase dois meses na fossa, tentando superar a dor de estar doente e a dor da preocupação com o meu filho, de apenas sete anos, que ainda depende muito de Deus me manter vivo para criá-lo. “Deus, eu não tenho medo de ir para junto te ti, mas ainda tenho algumas missões que tu me deste, e elas ainda não estão concluídas”, era a minha oração diária. Depois de quase dois meses, orando, recuperei com ajuda de remédios e uma alimentação balanceada.
Alguns amigos meus não tiveram a mesma sorte. Partiram para a eternidade após serem infectados pela Covid-19. Um amigo muito chegado morava numa casa de luxo a poucos metros da praia do Calhau, na avenida Litorânea, uma das mais bonitas da capital. Recebendo mensalmente uma generosa quantia como desembargador aposentado, ele praticamente não sabia o que era sofrimento. Sua vida podia ser definida numa palavra: conforto. Mas um dia a dor da doença causada pelo coronavírus chegou. Mesmo sendo internado no melhor hospital particular da cidade — que a sua generosa condição financeira lhe permitia — não resistiu às complicações respiratórias implicadas pelo vírus. Ele foi a óbito. E o pior de tudo é que a família não pôde fazer um velório digno para celebrar o último adeus. Do hospital, o corpo foi direto para o cemitério.
Você de fato sente o peso da dor quando pega uma doença grave, quando é desprezado, jogado à solidão ou quando perde um ente muito amado. É nessa hora que a sua alma grita a Deus com toda força da pressão psicológica e emocional: “Deus, onde tu estás?”. Na dor, o amor e o sofrimento parecem se convergir. No holocausto, Hitler não sentia dor alguma quando estava matando os judeus com toda frieza do ódio etnocêntrico. Ele não tinha amor humano. Por isso não sentia dor, nem remorso. Mas, e os familiares que ficaram vivos sentindo a dor da perda dos seus parentes? E a dor psicológica daqueles que estavam na fila esperando a hora de morrer, sentindo desesperadamente o tic-tac das batidas do relógio de seu coração que contavam até o último segundo? Dizem que, no sofrimento, as sensações de vida e de amor se misturam.
O escritor cristão Philip Yancey traz à lembrança o fato de que os estudiosos da medicina falam que, numa ferida profunda, há dois tipos de tecido que precisam de cirurgia. Há o tecido conjuntivo — sob a superfície — e a camada externa que protege a pele. Em situação de rompimento profundo, ambas precisam ser curadas. Num comparativo com a dor do sofrimento, as camadas física e emocional da pessoa precisam ser tratadas. Não adianta só orar ou tratar a dor física. É preciso um processo de cura interior, em que entram em ação as sessões psicológicas nas relações com a pessoa ferida. Nossas feridas emocionais precisam ser cicatrizadas. Recentemente, vi na televisão sobre um caso em que um homem deu vários golpes de faca na própria esposa. Ela foi para o hospital, recebeu tratamento médico e ficou bem. As feridas no seu corpo físico foram cicatrizadas. Mas e as emocionais? As pessoas precisam entender que feridas emocionais são profundas e matam até mesmo o prazer de viver. Matam a alegria da alma.
Como cristãos, almejamos seguir um homem que veio de Deus, enviado por Ele, há dois mil anos. A gente lê os evangelhos e encontra uma única cena em que alguém se dirige a Jesus diretamente como Deus, dizendo: “Senhor meu e Deus meu!”. Quem falou isto foi Tomé. Aquele que todo mundo chama de incrédulo, mas eu o vejo com outro olhar. Tomé estava mergulhado na dor da tristeza de ter perdido recentemente o amigo e Senhor, a quem aprendeu a amar com dedicação e admiração. Jesus, para os discípulos, não só era amável, mas também admirável. Quando Ele morreu na cruz, aos olhos de todos, os discípulos mergulharam em profunda dor e tristeza, haja vista a forma cruel do sofrimento e morte que eles presenciaram. Aquelas imagens pincharam a sua mente e certamente lhes deixaram profundamente perturbados. Imagine! Portanto, Tomé ficou impactado com a surpresa gerada pela notícia da incrível ressurreição. Ele viu Jesus morrer e ser lançado numa tumba. E como é que, de repente, alguém chega e diz “eu sou o Senhor”? Além disso, Jesus havia orientado os discípulos dizendo que se alguém lhes dissesse “eu sou o Cristo”, era pra eles não acreditarem. E parece que Tomé foi o único que guardou essa orientação do Mestre. Por isso duvidou, e exigiu provas de que aquela figura era mesmo o Cristo. Claro, Tomé não queria ser enganado. Qualquer crente cuidadoso e vigilante faria o mesmo. Inclusive eu.
Jesus, então, compreendeu a dúvida de Tomé e fez questão de aparecer ao discípulo tristonho em seu novo corpo transformado para apagar todas as dúvidas. Todavia, o que parece ter motivado aquela explosão de fé em Tomé — que se alegrou dizendo “Senhor meu e Deus meu!” — foi exatamente a presença das cicatrizes. Jesus disse a ele: “Vê as minhas mãos”. “Chega também a mão e põe-na ao meu lado”. Numa revelação surpreendente, depois de verificar as devidas evidências, Tomé viu a maravilha de Deus, o Senhor, sendo condescendente e assumindo nossa dor, completando a união com a raça humana.
Na hora da dor — em que, por vezes, somos levados a perguntar “onde está Deus que não vê o meu sofrimento” — imaginemos que nem mesmo Deus ficou isento dela. E quando perguntamos “onde está Deus agora em que estou sofrendo?”, a resposta da verdade absoluta é: Ele está junto a nós participando plenamente da nossa condição humana. Ele está sentindo conosco a nossa aflição. Naquele momento, Tomé reconheceu a verdade mais fundamental do universo. A verdade de que Deus é amor. Por isso Ele nos ama. E amar significa sentir a dor do outro. Por isso Ele sente a nossa dor. E a dor manifesta a vida. Foi o que Jesus fez. Ele levou sobre si nossas dores e enfermidades, e nos deu vida em Deus.
Agora, tudo o que devemos fazer é seguir Jesus de perto e observar como Ele respondeu às tragédias do seu tempo. É só você olhar para os milagres que Ele fez e logo verá onde está Deus quando estamos em situação de dor. Ele está exatamente no mesmo lugar e situação em que você se encontra em sofrimento. Normalmente, as pessoas que se aproximavam de Jesus clamando por socorro estavam em situação de dor. Como, por exemplo, uma viúva que perdeu seu único filho. Um homem por nome Jairo cuja filha falecera. Ou até mesmo um soldado romano cujo servo contraiu uma enfermidade. Em momento como esses, Jesus nunca fazia sermões de julgamentos. Em vez disso, Ele respondia com compaixão, palavras de conforto e cura. Em latim, a palavra “compaixão” significa “sofrer com...”. Portanto, Deus sempre está ao lado de quem está sofrendo. Você está sofrendo dor e decepção? Lembre-se: Ele está exatamente aí, junto a você.

quarta-feira, 20 de maio de 2020

POR QUE PESSOAS BOAS SOFREM?

POR QUE PESSOAS BOAS SOFREM?

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Pr. Battista Soarez
Escritor, jornalista, teólogo, psicoterapeuta e professor universitário.
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Anos atrás, lá por volta de 1986, eu estava numa antiga livraria na rua Grande, centro comercial de São Luís, como era de costume fazê-lo todos os dias no intervalo do expediente do Jornal de Hoje, onde trabalhava como revisor de texto. Percorrendo prateleira por prateleira, procurando curiosamente os novos títulos do mercado editorial, quando, de repente, meus olhos se depararam com a obra “Por que sofrem os escritores”. Não lembro mais o nome do autor, mas parece-me que era um psicanalista. Lembro também de ter comentado, sobre o livro, com a minha namorada da época, chamada Tânia. Ela também gostava muito de ler e me deu vários livros de presente. Então, tudo o que eu via de novidade literária, comentava com ela, obviamente.
O livro falava da história de vida de grandes nomes da literatura mundial, dentre eles Leon Tolstói e Thomas Mann, considerados entre os maiores escritores de todos os tempos. Tanto Tolstói quanto Mann sofreram perseguição e descasos nas suas próprias famílias. Tolstói, inclusive, teve tantos problemas com familiares que, em vida, doou toda a sua riqueza — adquirida com o ofício de escritor, claro — aos trabalhadores camponeses aos quais dedicou sua vida fazendo obras sociais. Aos 82 anos de idade, após uma briga familiar, Tolstói saiu de casa com apenas uma maleta. Dias depois, o famoso escritor foi reconhecido pelo diretor da estação ferroviária de Astapovo, na província de Riaz, na Rússia. Ao vê-lo doente, com febre e tossindo muito, o diretor se aproximou e exclamou: “Doutor Tolstói!”. Então, o generoso diretor da estação levou o escritor para sua própria casa dando-lhe os devidos cuidados. Ali, Tolstói morreu dias depois de pneumonia.
Bem, uma das questões abordadas no livro “Por que sofrem os escritores” é a espiritualidade. O ofício de escritor tem a ver com inspiração. E inspiração envolve a espiritualidade. Há um jogo de energias cósmicas propulsoras: positivas e negativas. As energias cósmicas positivas são do bem, enquanto as negativas são do mal. Na positiva está Deus e os princípios da sua justiça. Na energia cósmica negativa estão as forças demoníacas que lutam contra o bem. Portanto, qualquer pessoa que promove o bem é perseguida.
Outra questão é que o escritor trabalha para transformar o mundo com suas ideias de ética e moralidade na construção do bem, e as forças demoníacas lutam para que isso não aconteça. De fato, os escritores sofrem porque há uma retaliação das forças do mal contra eles. E não só contra os escritores, mas contra qualquer uma pessoa de coração bom e que trabalha para o bem da sociedade.
Isso não acontece só com os escritores clássicos. Aliás, a gente imagina que por serem ricos e famosos, isso não pudesse acontecer com eles. Mas aconteceu com eles e pode acontecer com escritores que não são clássicos, ainda nos dias de hoje. Normalmente, os escritores são pessoas sérias, responsáveis e éticas. Porque acabam limando o seu caráter na educação que recebem baseada naquilo que leem. E o primeiro impacto no coração de um escritor ou de uma pessoa boa, é o não-reconhecimento e o não-respeito da própria família. Nisso, o nosso Senhor Jesus Cristo sabia muito bem o que estava dizendo quando asseverou: “Não há profeta sem honra, senão na sua terra e na sua casa” (Mt 13.57). Também em Mateus 10.36, ele diz: “Assim, os inimigos do homem serão os da sua própria casa”.
E este pensamento bíblico não era novo nos dias de Jesus. O profeta Miquéias, sete séculos antes de Cristo (séc. VIII a.C.), já alertava: “Porque o filho despreza o pai, a filha se levanta contra a mãe, a nora contra a sogra; os inimigos do homem são os da sua própria casa” (Mq 7.6). Esses males fazem parte do amplo conjunto de males do nosso tempo. Nossa sociedade está exatamente assim, impregnada dessas mazelas na família e nas relações sociais.
Vários homens de Deus, hoje em dia, trabalham para o bem da igreja, trabalham para o bem da família e depois descobrem que a sua família os odeia, é a sua primeira inimiga. Muitos pais de família sacrificam suas vidas dia e noite, trabalhando para ver os da sua casa vivendo confortavelmente. Todavia, nem sabiam que, ao fazer isto, estavam construindo inimigos debaixo do seu próprio teto. Na época de Jesus, ele mesmo previu esses desencontros no meio das instituições familiares. Em nossos dias, a estabilidade familiar deixou de existir. E o respeito dos filhos pelos pais sucumbiu-se no lamaçal de pecados e injustiças humanas de toda sorte. Por isso e com isso, as pessoas boas sofrem. Elas lutam pelo bem de todos, e recebem como paga o ódio, a perseguição, a falta de respeito e a ingratidão por parte da própria família.
Face a isto, Jesus ensinou, em Mateus 10.34-36, que não devemos ser coniventes com patifarias de gente ingrata e rebelde da nossa família. Eles são os nossos verdadeiros inimigos. E não só nosso, mas também de Deus. Porque, ao serem ingratos e rebeldes, estão se levantando como inimigos de Deus e da sua justiça. Por isso não devemos passar mão na cabeça de familiares rebeldes e ingratos. Eles não merecem nosso carinho. Eles são a causa da nossa vergonha e do nosso sofrimento. Isso não quer dizer que não devemos amá-los e orar por eles. Mas amar e orar não significa ser conivente com o pecado deles.
No livro de Samuel, a Bíblia relata a triste história do profeta Eli. Ele era o tempo todo conivente com o pecado intencional dos filhos. E pagou caro por isso. Meu pai sempre dizia: “Meu filho, se você fizer alguma coisa errada por aí e for preso, não conte comigo para nada. Não vou gastar um centavo, não vou mover um dedo para tirar você da cadeia”.
Em 2013, após dar uma entrevista na Rádio 92, de São Luís, sobre o lançamento do meu livro "E assim o amor acontece" (Arte Editorial, SP, 2013), uma jovem mulher me ligou. Ela disse que o seu marido acabara de deixá-la e estava vivendo com uma moça de dezoito anos. A coisa mais difícil de entender é que ela não tinha feito nada. Segundo ela, foram 13 anos de casamento equilibrado e feliz. O casal teve uma filha, que ficou com a mãe. Ela me disse que, ao perguntar ao marido o porquê da decisão, ele respondeu: “É que essa menina era virgem”.
O que eu aprendi com esse casal de jovens é que não há mais compromisso em nossas instituições modernas. Além de inimigos familiares, são irresponsáveis. Não têm a quem responder por seus atos. Não se importam.
Dizem que o credo do narcisista é: “Não tenho nada a ver com você. Nem você comigo. Eu cuido de mim e você cuida de você. Cada um por si”. O problema é que esse credo não é novo. É tão antigo quanto a história de Caim e seu irmão. Na história da humanidade, foi Caim o primeiro a dizer para Deus com desdém: “Não sei. Acaso sou guardião do meu irmão?”.
Caim não disse isso para justificar o assassinato de seu irmão Abel, mas sim para justificar sua falta de interesse pelo bem-estar do seu irmão. “Eu cuido dos meus interesses, e ele que cuide dos seus”. E qual foi a punição de Caim por isso? Por não se importar? Caim foi condenado a vagar sozinho pela face da terra, sem nenhum lugar que pudesse chamar de: "este é o meu lar". Sem nenhuma comunidade de pessoas que pudesse dizer: “estes são meus irmãos”. Caim foi condenado a caminhar na escuridão, isolado do mundo. Porque quem não se importa, quem é estúpido, quem é rebelde e ingrato e faz os outros sofrer com as suas injustiças, caminha na escuridão.
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Pr. Battista Soarez
 



terça-feira, 24 de setembro de 2019

Artigo: O VERBO É MAIS QUE PALAVRAS - Pr. Fábio Leite


O VERBO É MAIS QUE PALAVRAS





Pr. Fábio Leite *[1]
Formado em letras e teologia, pastor Fábio Leite é capelão da PMMA na patente de capitão e pastor-auxiliar da Assembleia de Deus em São Luís-MA (área 26, Habitacional Turu), da CEADEMA (Convenção Estadual da Assembleia de Deus no Maranhão), ligada à CGADB (Convenção Geral das Assembleias de Deus no Brasil). É também coordenador do Conselho Fiscal da CEADEMA.
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No livro de Mateus (5.20), o Senhor Jesus Cristo disse, durante seu discurso no Sermão da Montanha, o seguinte: “Porque vos digo que, se a vossa justiça não exceder em muito a dos escribas e fariseus, jamais entrareis no reino dos céus”. Ou seja, o Verbo ― enquanto revelação da justiça de Deus aos homens ― é mais que palavras. Por isso a justiça dos discípulos de Jesus precisa exceder em muito a dos líderes religiosos cujas pregações são de censura e julgamentos. O Verbo, então, é liberdade. Só que é uma liberdade diferente. Trata-se de uma liberdade para manifestação da justiça que traz pão e água cuja finalidade é saciar a fome e a sede dos homens no mundo, os quais são oprimidos pelas injustiças nele existentes.
Em vários momentos do Novo Testamento, Jesus deixou claro que a justiça dos líderes religiosos da sua época, conhecidos como fariseus, era uma justiça apenas de palavras e de práticas autocontemplativas, algo não muito diferente dos nossos dias entre certos líderes de igreja. Os dias modernos têm sido difíceis para a Igreja de Jesus, uma vez que a ética e a moral dos cristãos têm merecido ser objeto de estudo.
Minha formação em letras e teologia me permite tecer um diálogo entre a palavra literária e a palavra da verdade do evangelho do nosso Senhor Jesus Cristo. Ele disse: “conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará” (João 8.32). Neste aspecto, a verdade a que o Senhor se refere está relacionada ao Verbo e à justiça do reino dele que resultarão na liberdade do homem no âmbito da sua existência: espiritualidade e materialidade, isto é, a pregação e o serviço social da igreja.
No contexto do evangelho, a palavra liberdade tem a ver com a justiça divina e com a vontade espontânea de se fazer alguma coisa. A liberdade é uma propriedade da própria pessoa humana, isto é, propriedade de si mesmo. O Espírito de Deus se manifesta no nosso senso de liberdade para fazermos, com liberalidade, as coisas que Ele coloca no nosso entendimento e coração. Entendo que a manifestação do Verbo encarnado no mundo humano nos traz liberdade. Não uma liberdade qualquer, mas a libertação dos paradigmas tradicionais que nos aprisionavam a um passado antigo, caducado na mente humana e gerando todo tipo de injustiça. Quando caducada no labirinto de culturas e crenças tradicionais, a religiosidade nos aprisiona a um circuito de injustiças que dificultam as boas relações humanas. E isso quebra os princípios sagrados universais do corpo de Cristo. Em razão disto, o Verbo se fez carne e habitou entre nós. Ou seja, ele se fez carne e habitou entre nós para nos resgatar das injustiças geradas pelas crenças tradicionais. Agora estamos diante da porta libertadora: Cristo, o Justo (1 João 1.9; Romanos 3.26; Atos 3.14; 1 João 2.1).
O Espírito Santo opera no nosso coração, nos libertando da servidão da lei para, uma vez livres, estarmos aptos para praticar a obra do Evangelho com justiça e amor no plano existencial-divino entre as relações sociais. Seguindo este raciocínio, Jesus disse que devemos amar a Deus sobre todas as coisas e o próximo como a si mesmo. O que isto significa? Significa que o Verbo, que se fez carne, trouxe uma mensagem real de vida que se traduz em pão e água aos que têm fome e sede de justiça num mundo de injustiçados. Portanto, o Verbo se fez gente como a gente, habitou entre nós e trouxe libertação aos povos do mundo, independente de sua natureza antropológica, isto é, de suas culturas e tradições.
Nesse viés, o conhecimento cristão nos dá quatro espécies de liberdade trazidas pelo Verbo que se fez carne, tornando-se, portanto, gente como a gente: (1) liberdade natural; (2) liberdade civil; (3) liberdade política; (4) liberdade espiritual-existencial. Nestes quatro pilares, vemos a expressão do Verbo que se fez carne e habitou entre nós para operacionalizar o evangelho do reino por um viés acima de tudo fundamentado nos princípios da justiça de Deus. Vejamos, a seguir, como isso ocorre.
Em primeiro lugar, o Verbo se fez carne e revelou a liberdade natural entre os homens no mundo. Esta liberdade acontece no âmbito da liberdade do homem enquanto homem, do ser enquanto ser, no plano do autoconhecimento e da autoconsciência para a governabilidade de si mesmo e do ambiente onde ele habita. Deus criou o homem para viver exatamente essa liberdade natural no crescimento e na multiplicidade (Gênesis 1.28), e, por via dessa mesma liberdade natural, governar a terra com suas ações baseadas na racionalidade. O homem é um animal racional por natureza e por isso mesmo ele pensa naturalmente os planos da existência em defesa da vida.
Em segundo lugar, o Verbo se fez carne e se manifestou na liberdade civil de grupos sociais. Esta liberdade é a liberdade do sujeito enquanto cidadão, na qualidade de “ser” organizado e participativo nas atividades de transformação social. Aqui o homem é um ser inteligente inserido no processo cultural-civilizatório e, portanto, efetivamente responsável pelo desenvolvimento da sociedade no decorrer da história. A liberdade civil trabalha exata e efetivamente as relações dos cidadãos entre si, reguladas por normas sociais e levando em conta o indivíduo considerado em suas circunstâncias particulares dentro da sociedade organizada em forma de grupos constituídos de seres humanos pensantes.
Em terceiro lugar, o Verbo se fez carne e trouxe liberdade política que, por sua vez, é a liberdade do indivíduo enquanto povo responsável pela sua organização social e autogovernabilidade. Aqui se manifestam as autocracias, ou seja, os modelos de governo humano. Assim, a liberdade política é uma arte inata inerente à consciência e à inteligência social do homem para governar a família, a comunidade e os povos. Por este ponto, o homem desenvolve habilidade basicamente peculiar no trato das relações humanas, com vista à obtenção dos resultados desejados. Quando a Bíblia diz que “o Verbo se fez carne e habitou entre nós” (João 1.14), significa que a Palavra Viva de Deus se materializou em uma humanidade dinâmica cujas atividades vislumbram uma hierarquia de forças que se estabelecem no interior das civilizações da comunidade-mundo. Este é o Deus presente nas numerosas relações sociais constituídas entre indivíduos e grupos.
Em quarto lugar, o Verbo se fez carne e revelou a sua glória como liberdade espiritual-existencial para dar sentido na vida dos que estavam perdidos no mundo. Esta liberdade é aquela liberdade que nos conecta a Deus por amor a Ele e não por obrigação religiosa. O reflexo desta liberdade alcança as relações fraternais e antropológicas na dimensionalidade do conselho divino. O Verbo é “Maravilhoso Conselheiro...” (Isaías 9.6) e o seu maravilhoso conselho veio ao mundo em forma de evangelho, sendo vida e luz aos homens que, por sua vez, viram a sua “glória como do unigênito do Pai” (João 1.3-14) e, portanto, trazendo verdadeira liberdade ao mundo (João 8.32). De fato, a liberdade espiritual-existencial é a liberdade de agir conforme a vontade do Espírito e não conforme a vontade da carne. Isto significa que podemos atuar em total concordância com a essência divina, a consciência e a vontade. Liberdade espiritual, então, é poder fazer tudo e ainda ter a sabedoria de não ser escravo das próprias vontades. Podemos fazer tudo, exercendo, inclusive, o poder da liberdade para governar nossas ações em Deus com alegria e paz no coração. Trata-se de uma autogovernabilidade no direcionamento do caminho da justiça do bem, nos livrando da escravidão do mal.
Quando o Senhor Jesus disse que “... o Verbo se fez carne e habitou entre nós...” (João 1.14), anunciou, aí, uma verdade verbalizada, mas que não era apenas palavras. Andrés Torres Queiruga, filósofo e teólogo autor de muitas obras teológicas e pastorais, disse que o Verbo manifestou-se em forma da “glória de Deus na vida humana num mundo de crucificados”.[2]
O autor fala da vida humana que sempre esteve assediada pelo mal. E a responsabilidade de quem segue o Verbo que se fez carne é resolver os problemas gerados por esse mal. Mal este que se tornou “mal social”, reproduzindo infinitas mazelas sociais como, por exemplo, fome, pobreza, miséria, violência e outras. Frente a isso, o Verbo que se fez carne gerou um corpo espiritual que, agora, está cercado de desafios. Neste ponto, o Verbo é mais que palavras, uma vez que Ele constituiu um corpo espiritual, a Igreja de Jesus, para se importar com a situação e a concretude feliz da vida humana.
Há, aqui, uma teodiceia que vocifera perante a humanidade a mensagem acerca do Deus que é justo, bom e que tudo pode diante da existência do mal no mundo. Face a isto, o Verbo que se fez carne nos leva a entender as necessidades daqueles que estão sendo crucificados por esse mal social que os deixa humilhados perante a vida.
No fundo da igreja pastoreada por mim, em São Luís do Maranhão, tinha uma famosa casa de prostituição. Naquela casa, homens e mulheres ganhavam a vida vendendo seu próprio corpo, perdendo sua própria alma e, portando, sendo humilhados pelo espírito do mal. Ali pessoas jovens e bonitas ganhavam a vida perdendo a sua alma para um mundo traiçoeiro e cruel degradador de vidas humanas. A prostituição é uma atividade aviltante e desonrosa, em que a pessoa se sujeita a expor a intimidade do seu corpo em troca de certa quantia de dinheiro que não representa muita coisa. E isso é uma situação humilhante, destruidora da honra humana. É preciso ser muito fraco da mente para acreditar que a prostituição não é uma “profissão” maculadora e vergonhosa.
Certo dia, orando a Deus, senti no coração que a igreja deveria comprar aquela casa.  Então, mobilizei a congregação, fizemos uma campanha arrecadatória e negociamos aquele imóvel por meio milhão de reais, com alguns pequenos acréscimos. Deus nos ajudou e, assim, conseguimos adquirir aquele ambiente de degradação da moral humana bem como da sua existencialidade. Com esforço e dedicação, conseguimos fazer com que um local onde era promovido culto à prostituição, agora é um ambiente de restauração de vidas humanas degradadas. Entendo que o Verbo se fez carne para realizar no mundo uma obra libertadora na mente e no coração de homens e mulheres que estejam dispostos a mudar de vida.
A justiça se manifestou no Verbo e o Verbo se manifestou em forma de justiça. Isto trouxe rupturas sociais de grandes complexidades envolvendo a cultura civilizacional dos seres históricos e gerando respostas para as grandes perguntas da humanidade. Nem mesmo a teologia explica isso com clarividência. O evangelho é processado nos quatro pilares da liberdade mencionados acima e até mesmo a igreja não consegue explicar essa equação existencial para os homens no mundo. Ela vivencia as boas novas do evangelho mas, infelizmente, não sabe discernir a sua essência perante os alcançáveis.
Enfim, o Verbo se fez carne para alcançar a todos num mundo que, agora, se encontra totalmente secularizado. Esta é uma lógica que coloca a igreja corpo de Cristo ― corpo social em Cristo ― em sintonia com os pressupostos da possibilidade de um mundo-sem-mal. A igreja não deve pregar um evangelho apenas de palavras, mas sim um evangelho de ações transformadoras. Seria o caso de se pensar em realizar um procedimento de atitudes “criaturais”, focadas em criaturas humanas com suas necessidades. Realizar ações de combate aos males do mundo traduz o Verbo que se fez carne em resultados concretos que atenuam as necessidades dos injustiçados.
O povo que crê em Deus ― e o serve ― precisa se fazer acreditar diante daqueles que já não têm esperança de um mundo melhor. Os quatro pilares da liberdade (natural, civil, política e espiritual-existencial) evidenciam o Verbo que se fez carne por meio de atitudes relevantes da igreja de Jesus Cristo perante um mundo que é massacrado por todo tipo de injustiça social-humana. Somente desta maneira o corpo de Cristo pode representar a manifestação da sua glória, com graça e verdade (João 1.14), no cumprimento da missão do Evangelho da vida (João 1.4). Vida, aqui, está na dimensão dos quatro pilares da liberdade: natural, civil, política e espiritual-existencial.



[1] *Colaboração: Pr. Battista Soarez. Escritor, jornalista, pedagogo, sociólogo, Assistente Social e professor universitário.
[2] Andrés Torres Queiruga. In Degislando N. de Lima & Jacques Trudel (orgs.). Teologia em Diálogo. São Paulo: Paulinas, 2002, p. 141.

quinta-feira, 29 de agosto de 2019

FÁBIO LEITE - PRÉ-CANDIDATURAS 2020 - SÃO LUÍS/MA

Assembleia de Deus anuncia nomes de pré-candidatos para 2020
Nome do pastor Fábio Leite é preferência não somente entre evangélicos, mas também fora da igreja
BATTISTA SOAREZ
De São Luís - MA

Pr. José Coutinho apresenta Pr. Fábio Leite em assembleia geral da AD em São Luís
Num grande culto de assembleia geral no templo central da igreja Assembleia de Deus em São Luís, realizado na segunda-feira, 26, o pastor José Guimarães Coutinho, presidente da denominação na capital maranhense, anunciou os nomes de Domingos Paes e pastor Fábio Leite para pré-candidatos ao legislativo municipal de São Luís nas eleições de 2020. Os dois futuros candidatos, segundo pastor Coutinho, terão apoio da Assembleia de Deus em São Luís.

O pastor Fábio Leite, de acordo com pesquisa recente encomendada por um grupo de apoiadores, é um dos nomes mais carismáticos no cenário político maranhense perante a opinião pública. Ele já foi candidato a vice-prefeito de São Luís e atualmente é capelão da Polícia Militar no Maranhão. “O irmão Domingos Paes e o pastor Fábio Leite serão candidatos com apoio da Assembleia de Deus em São Luís e nós temos a possibilidade de elegê-los com a graça de Deus”, disse pastor José Coutinho.
O Dr. Jomar Câmara, subprocurador geral do Estado do Maranhão, esteve presente no culto também dando apoio ao nome de Fábio Leite para o pleito eleitoral de 2020. “É um nome importante pela sua visão social, destacando-se principalmente por não ter uma compreensão religiosa fechada”, pondera o jurista. Fábio Leite é formado em Letras, bacharel em teologia, cantor e tem no currículo uma longa folha de serviços prestados à população evangélica maranhense, com 20 anos de ministério pastoral. É casado com a missionária e estudante de serviço social Eliane Leite com quem tem um casal de filhos, Fabiane e Helielson.
Antes de vir para São Luís, Fábio Leite passou pelo interior do estado desenvolvendo atividades eclesiásticas e sempre prestando serviços e ações sociais junto a comunidades e pessoas necessitadas. “O que está no meu coração não é simplesmente a política enquanto instituto partidário, mas pessoas. Cuidar de pessoas, da coletividade, da comunidade é o que me move para o cenário político”, destaca Fábio Leite durante conversa com a nossa reportagem.

sábado, 23 de março de 2019

ESPIRITUALIDADE ENVOLVENTE E MISSÃO PLANETÁRIA


Espiritualidade envolvente e missão planetária
Novas perspectivas para uma evangelização humanitária com visão holística



Pr. Battista P. Soarez [1]



INTRODUÇÃO
O presente artigo nasceu de uma dialética centrada no desejo e na visão que temos dos trâmites da missão cristã que ora se volta para todos aqueles que estão inquietos sobre o futuro da missão da igreja no mundo. Neste viés, surgem perguntas como: o que vamos fazer? Como vamos fazer? Onde vamos fazer? Quando (em que momento) vamos fazer? Para quem vamos fazer? Com quem vamos fazer? Para que vamos fazer?
A construção desta dialética apresenta — dirigindo-se a pessoas dedicadas à teologia missionária praticada principalmente no Brasil, noutros países da América Latina e em diferentes partes do mundo — uma análise não só positiva, mas também crítica e entusiasticamente. Isto se diz no sentido de que muitos acreditam numa prática missionária que se move para todas as direções e vai evoluindo à medida que surgem novos padrões e/ou novos paradigmas de mudança.
Muitos missionários que se arriscam no campo sem muito suporte financeiro por vezes se autoquestionam se de fato a igreja leva a sério o “ide” de Jesus da forma como Ele ensinou àqueles que o seguiam por convicção e também porque acreditaram em tudo o que Ele disse e fez. Eles, os missionários, também se perguntam sobre as transformações que a igreja organizada socialmente pode realizar na sua práxis evangelizadora de hoje em dia, e na sua práxis evangelizadora do futuro.
Como tema fundamental da Igreja de Cristo, a evangelização se projeta de várias maneiras por uma auréola de indiscutibilidade sobre a imutabilidade do plano de Deus para o mundo. O plano de Deus para o mundo é o reino. A ação missionária do corpo de Cristo ocorre em função do reino e é uma ciência sagrada robustecida por experiências diversas no campo social-espiritual. Em tempos anteriores ― mais precisamente nos séculos XIX e XX ― os pioneiros das missões modernas fizeram uma proposta de teologia missionária compreendida como missiologia mundial, com suas diversas complexidades sociais e fazeres relacionados às relações evangelísticas e humanitárias, com uma certa tônica de antropologia social no contexto da geografia humana.[2]
Hoje podemos chamar isto de “missiologia planetária” pelo fato de incluir-se, aí, não apenas o “mundo-espiritual” humano, mas também a cosmologia social que abrange o cuidado humanitário em todos os aspectos. Isto está basicamente dentro de uma dimensionalidade daquilo que Friedrich Nietzsche chamou de a “gaia ciência” e que muitos não compreenderam e ainda hoje não compreendem. Embora o filósofo existencialista alemão esteja fazendo uma alusão à poesia moderna europeia, ele trata a respeito de arte, moral, história, conhecimento, ilusão e verdade. Claro que a ideia filosófica da morte de Deus, proclamada em parte do livro, é descartável do ponto de vista cristão. Todavia, a análise da história, da moral, do conhecimento e da verdade mostra uma cosmologia social que caminha na culminância de ordem e desordem, de criação e destruição. Ou seja, um mundo assim permite que se vislumbre o surgimento de um discurso sobre missão planetária fincada na possibilidade de novas ordens e atividades de transformação da realidade social.
A partir desta visão social ― já no decorrer do século XX com nítido vislumbre de projeção para o século XXI ― os missiologistas mais dedicados propuseram uma prática missionária que pudesse sair do gueto de sua própria confissão religiosa para ser capaz de falar a toda a sociedade.[3] Isto é, uma sociedade diversificada no seu atual estado de avanço e pluralidade. De fato, no mundo de hoje, a prática missionária e evangelizacional não se estrita mais no confessional e no denominacionalismo. Ela deve estar conectada no mundo real e, portanto, na realidade do mundo com seus avanços científicos, tecnológicos e com suas tragédias ― seja no sentido de suas necessidades no seu estado de miséria, seja no sentido da violência no seu amplo aspecto social, comunitário e familiar.
As perguntas mais frequentes que fazemos no campo missionário geram respostas que nos levam a pensar num atraente panorama: a prática missionária do “agora” e do “futuro” parece caminhar rumo a um modelo de evangelismo envolvente, relacional e ao mesmo tempo pluralista-unificado na diversidade dos dons espirituais ― sem nenhum complexo tradicional de superioridade religiosa e/ou denominacionalista ― seguindo o horizonte de uma teologia missionária voltada respectiva e tautocronicamente para o público igreja, para o público acadêmico e para o público sociedade. Nesta perspectiva a prática missionária, na lógica de sua função social, tem o objetivo de atender às necessidades das pessoas na qualidade de sujeitos sociais passíveis de transformação.
Logo, os missionários precisam ter consciência planetária e consequentemente estabelecer a função social da igreja na sua relação com o mundo. Sempre dizemos que a igreja que não tem função social não é corpo de Cristo, uma vez que Cristo é o soberano projeto de Deus para satisfazer as necessidades do mundo e, portanto, para transformar a realidade espiritual-social do mundo. Quando uma pessoa se converte a Cristo e, portanto, passa a fazer parte do corpo de Cristo, ela muda seu comportamento social. Porque? Porque o evangelho refaz o homem tanto espiritualmente como socialmente.
É por meio da sua função social no mundo (amor ao próximo) que a igreja atrai o mundo para conhecer Cristo. E este é um resultado natural: a igreja “faz” em Cristo e por Cristo e logo o mundo reconhece a sua necessidade de viver em Deus e para Deus. A compreensão do evangelho de Cristo leva o homem e a mulher à experiência do novo nascimento.

1. MISSÃO PLANETÁRIA EM FACE DA POBREZA E DAS INJUSTIÇAS
Na prática missionária e evangelizacional, o diálogo social com o público sociedade deve seguir um itinerário na história social do mundo pós-moderno que faça brandir o martelo missionário da igreja nas células comunitárias onde estão presentes expressões da realidade social como a pobreza, a fome e as injustiças. O mundo pós-moderno é o mundo atual com seus protagonismos da realidade social.[4] Ou seja, o mundo que nos permite percorrer pelos horizontes que estão diante de nossos olhos. Nasce, aqui, uma visão de evangelho, de reino e de mundo que podemos chamar de missão planetária por causa da pluralidade de expressões sociais que ela é capaz de abranger.
Por um lado, a profunda evolução das estratégias missionárias no contexto da realidade social nos leva a passar por experiências espirituais que, nos tempos de hoje, têm gerado um espelho social verificador do ritmo de seu encontro com outras realidades missiológicas longe dos ciúmes e dos egoísmos eclesiais. E longe, também, das divisões que historicamente têm enfraquecido o corpo de Cristo e, consequentemente, também têm feito minguar o volume de produção em matéria de resultados.
Por outro lado, temos de pensar que essa evolução de estratégias missionárias sempre estará se renovando. Nunca vão estar concluídas. Mas que, antes, novas e profundas transformações ocorrerão no mundo. Isto significa que é a própria evolução das sociedades simples (no âmbito da família)[5] e das sociedades complexas (no âmbito da sociedade evoluída cultural, educacional, científica e tecnologicamente) bem como da humanidade global é que está impulsionando as transformações incessantes das estratégicas missionárias.
Houve uma época em que cada segmento religioso pensava e levava o povo a pensar que fora do seu gueto denominacional não havia salvação. Parecia que sua mentalidade era muito diminuta em relação à plenitude do evangelho. E, logo, o seu nível de compreensão era muito baixo. Em que isso repercutia? Repercutia na relação da igreja com o mundo. Sua dialética, portanto, não era social. Era uma dialética fechada, bem como o era sua comunicação com as necessidades do mundo real.
Então os grupos religiosos divergiam entre si. Cada um criava a sua própria doutrina e a sua própria teologia. Era uma época exclusivista e excludente. Por conseguinte, a teologia de cada religião dessas era um mundo fechado. Falava para se própria num circuito cerrado. Por isso as expressões da realidade social eram ignoradas pela maioria dos grupos religiosos. Os ensinamentos de Jesus proclamados no Sermão da Montanha eram totalmente obscurecidos em detrimento das particularidades doutrinárias de cada grupo religioso.
O problema é que, do ponto de vista bíblico, a maioria dessas doutrinas era carregada de injustiças e falta de misericórdia. Um certo ímpeto de insolência religiosa estava presente aí.
Entrementes, os ensinamentos de Jesus Cristo no Sermão da Montanha não são simplesmente doutrinas religiosas. São princípios universais da Justiça de Deus que não mudam e nem se alteram. As doutrinas religiosas, sim, são passíveis de questionamentos, inaceitação e alteração. Os princípios universais da justiça de Deus, entretanto, não têm como serem questionados e nem alterados.[6] No Sermão da Montanha todas as doutrinas de Jesus não são meramente doutrinas, mas princípios universais inalteráveis e aceitáveis em qualquer cultura, em qualquer país, em qualquer nação, em qualquer língua, em qualquer civilização e em qualquer tempo. Todos os princípios de Jesus podem ser usados como método de evangelização no mundo da sociedade plural, inclusive o princípio da paz e o princípio do amor.
Nos capítulos 5, 6 e 7 do livro de Mateus, Jesus fala de princípios universais como, por exemplo, humildade, quebrantamento, mansidão, amor, justiça, misericórdia, pureza, paz, resignação, perseverança, exultação, transparência, etc. Todos estes princípios são métodos para alcançar pessoas para o Reino de Deus.
Logo, os princípios de Jesus não são exclusivistas e nem excludentes. Também não são fechados em uma única cultura. Isto é, não são, portanto, uma dialética fechada. Mas sim uma dialética aberta para a diversidade de grupos sociais com uma comunicação também aberta para as várias linguagens e culturas. Consequentemente, a comunicação e o diálogo entre o reino de Deus e o mundo dos humanos constituem-se uma comunicação verdadeiramente evangelizacional. Uma comunicação aberta e de alcance para fora. Por isso ela é planetária.
Deste modo, as perspectivas e atitudes religiosas exclusivistas e excludentes dão lugar, no âmbito das latitudes do mundo, às missões do evangelho inclusivo. Um evangelho de combate à pobreza e às injustiças sociais que mantém uma espiritualidade perfeitamente abundante e ao mesmo tempo inserida no contexto social. Aqui, por conseguinte, podemos falar de uma certa sociologia missionária, considerando o fato de que a fome, a pobreza, a miséria e a violência são problemas sociológicos. E o evangelho de Jesus é “inclusivista/inclusivo” no momento em que sua abordagem alcança as pessoas em situação de vulnerabilidade social e as inclui no contexto da vida abundante em Cristo, dando-lhes o cuidado necessário com alimentação, saúde, moradia, trabalho, renda e educação. Desta maneira, a missão planetária é existencial, isto é, centrada na pessoa humana. Na pessoa do indivíduo alcançável, a quem se pode alcançar com a ação macrossocial-espiritual do evangelho único e verdadeiro.
A missão cristã é planetária quando ela direciona suas atividades para os problemas da cosmologia social, tendo como foco o espelho social das necessidades humanas. A missão planetária é planetária porque busca corrigir a excludência das injustiças sociais por via do evangelho com a prática da sua superioridade includente. A includência social é uma espécie de ortopraxia[7] comunitária, em que ela se dirige para a correção das deformidades sociais como, por exemplo, a pobreza, a fome, o analfabetismo e a violência.
A prática da ortopraxia é uma maneira eficaz de se praticar missão planetária no âmbito do inclusivismo social como diálogo evangelizacional de participação comunitária. Isto trabalha a lógica das funções e dos resultados como ocorreu, por exemplo, entre os convertidos do livro de Atos em que, muitas vezes, as funções se tornam diretrizes e os resultados se tornam objetivos. Quando os apóstolos usavam, por exemplo, as expressões “consolai-vos uns aos outros”, “edificai-vos reciprocamente”, “ampareis os fracos”, “admoesteis os insubmissos”[8] etc., estavam estabelecendo diretrizes para a funcionalidade da igreja local. Isto se estende até hoje. A igreja, então, anuncia o evangelho da justiça de Deus para combater as injustiças dos homens numa sociedade de injustiçados. As injustiças dos homens são obras malignas de principados e potestades (Efésios 6.12) que neles operam. E a única maneira de resisti-los e combater as injustiças por eles operacionalizadas é praticando a justiça de Deus, que é fundamentada no seu grande amor. Este, de fato, é o papel da igreja corpo de Cristo operante no mundo.

2. A ESPIRITUALIDADE QUE NOS MOVE “PARA” E “NA” MISSÃO PLANETÁRIA
Diante das profundas experiências espirituais que temos tido no campo das missões evangelizacionais, temos feito pelo menos uma pergunta provocativa: como alcançar as almas para Cristo se não estivermos revestidos de uma espiritualidade que nos mantenha cheios de Deus? Podemos imaginar um suposto “mover” evangelístico carregado de nossas próprias forças individualistas, como tem acontecido em muitas épocas, mas o resultado é cansaço e enfado. Muitos líderes de missões têm sido abatidos pelo esgotamento espiritual. Lendo os fatos, percebemos que isso acontece quando, por uma razão ou outra, o líder de missões tenta administrar a obra espiritual sem a consciência daquilo que Jesus (em João 17.23) e o apóstolo Paulo (em Filipenses 4.3-6) chamam no grego de teleioo, ambos se referindo a uma mais que absoluta perfeição em unidade.
Em Filipenses 3.12-16, Paulo usa o mesmo termo para tratar da nossa soberana vocação. Para ficar bem claro, o termo teleioo é uma transliteração do hebraico yachid que quer dizer algo mais do que unidade absoluta que, na língua hebraica, é echad. Teleioo, portanto, transliterado do hebraico yachid, quer dizer um tipo de unidade que significa único. Biblicamente, este tipo de unidade só é possível quando estamos cheios de Deus. Em João 17.23, Jesus usa o grego teleioo para orar ao Pai Deus dizendo assim: “... eu neles, e tu em mim, a fim de que sejam perfeitos (ou aperfeiçoados) na unidade, para que o mundo conheça que tu me enviaste e os amaste, como também amaste a mim”.
Nesta passagem, Jesus usa o termo teleioo para dizer que Deus em Cristo e o Cristo em nós somos um corpo único. A espiritualidade que nos move para a missão planetária é exatamente a espiritualidade que nos mantém perfeitamente unidos e cheios de Deus. Esta é a nossa soberana vocação (Filipenses 3.12-16), isto é, uma espiritualidade que nos move em Deus, para Deus e por Deus em direção ao outro (Efésios 4.1-6). Esta espiritualidade de alcance ao próximo é uma espiritualidade comunitária ― “comum-unitária” ― e, portanto, uma espiritualidade planetária que, à medida que nos movimentamos, nos enche de Deus e cada vez mais nos move em Deus “para” e “na” missão planetária. Jesus disse que este tipo de “perfeita unidade” (teleioo, transliterado do hebraico yachid) é que faz o mundo conhecer que Jesus Cristo é o enviado de Deus como prova do seu grande amor pelo mundo (João 3.16). Este grande amor atrai o mundo para si, porque é reconhecido naqueles que estão em Cristo e cheios de Deus.
Portanto, crentes que estão vazios de Deus vivem na vulnerabilidade espiritual e, consequentemente, sujeitos a estarem cheios de potestades. Os crentes que andam sob influência de potestades ― que na sua maioria são líderes ― vivem dando problema na igreja. Vivem sempre tendo ideias antagônicas, distorcidas, discordando de tudo, e então não conseguem entender e nem aceitar os projetos de Deus. São líderes ciumentos, problemáticos, rancorosos e diabolicamente polêmicos. Querem administrar a obra de Deus pela sua própria vontade; com a sua mente meramente humana cheia de técnicas burocráticas, porém vazia de Deus.
Entretanto, vemos na missão planetária um evangelismo cosmossocial, um evangelismo envolvente que nos mantém espiritualmente vigilantes, em que o “nós”, cheios de Deus, caminha em direção ao “outro” carente de Deus e de tudo. Este “outro” é antropossocial e por isso mesmo planetário, isto é, um ser de relações universalizadas. Aqui o “eu-nós” sociológico acontece, enche-se de Deus e torna-se sempre atraente ao “outro” também sociológico. E é neste sentido que a espiritualidade evangelizacional é envolvente. É envolvente porque se envolve com o “outro-comunidade” para envolvê-lo social e espiritualmente no corpo de Cristo.
Neste aspecto, os alcançados e alcançáveis recebem o cuidado fraternal (do grego adelfiki agápi sto ou phileo) com relação à assistência no campo da saúde, da educação, do alimento, da geração de renda e principalmente no campo da espiritualidade. Assim está claro que missão planetária é o cuidado holístico com o “outro” alcançável e alcançado. O homem holístico, portanto, é o “outro-comunidade” social.

3. UM EVANGELISMO ENVOLVENTE COMO MÉTODO DE ALCANÇAR PESSOAS PARA CRISTO
Em primeiro lugar, vale dizer que o evangelismo planetário é um evangelismo envolvente por se dedicar em cuidar de pessoas: do homem holístico, planetário. É um evangelismo envolvente porque é multiforme e relacional. Alcança o planeta-homem de todas as formas e de todas as maneiras. Nesta prática ou método, os evangelizadores ― isto é, a igreja como um todo ― se envolvem na comunidade e ao mesmo tempo eles envolvem a comunidade no processo de atividades e ações integralizadas do corpo de Cristo. A isso chamamos de macroevangelização,[9] porque contempla holisticamente todas as necessidades humanas no âmbito da comunidade local alcançada.
O processo de “envolver-se” e “envolver” da igreja-missionária é automático. É simultâneo. Quando, por exemplo, promovemos um almoço ou um jantar comunitário, entre amigos, estamos fazendo evangelismo envolvente. Uma conversa em família com não-crentes ou uma atividade de capacitação profissional também são um exemplo de evangelismo envolvente. Tudo aquilo que fazemos como igreja corpo social em Cristo no sentido de alcançar pessoas e de suprir as necessidades humanas é evangelismo envolvente.
As ações são multiformes. E se as ações são multiformes, o evangelismo é macro. O plano, portanto, é macro. É macro porque é envolvente. É relacional. Alcança as pessoas da comunidade naturalmente. David J. Hesselgrave sugere que sejam feitos contatos comunitários. E esclarece que estes contatos comunitários podem ser feitos de quatro maneiras primárias. A primeira delas é o que ele chama de contatos de livre associação, isto é, a interação normal e cotidiana com indivíduos na sociedade. A segunda é a iniciativa de afiliar-se a certos grupos locais organizados para promover os interesses comunitários, como, por exemplo, fazer parte de associações locais. A terceira é fazer levantamentos especiais na comunidade local. A quarta é usar os veículos de comunicações disponíveis na comunidade.[10] De maneira geral, participar de debates sobre os interesses e as necessidades da comunidade local é um jeito eficaz de fazer missão planetária e uma maneira inteligente de praticar evangelismo envolvente de excelência. Algo que gere satisfação no coração das pessoas.
Vale pontuar que o evangelho é “singularidade”, mas sua prática é “pluralidade” e universalizada. Isto porque alcança o homem integral. O evangelho é singular porque é único. Não há outro além dele. E em definitivo pertence a um único Deus e Senhor. O evangelho fez da igreja um corpo único em Cristo, perfeito em unidade, teleioo (João 17.23). Mas sua ação é “pluralidade” porque alcança todos os homens, todas as culturas, todos os “ethos” e “ethnos”. Alcança o “kosmos” social de todas as formas e maneiras. Afinal, é planetário. É planetário porque é um evangelho macro. E é macro porque é planetário. Por isso pode ser simbolizado por uma rede de pescar que, lançada às águas, alcança as mais variadas espécies de peixes.
E mais: o evangelho macro é interrelacional, carismático e solidário (cai na graça do povo). É o evangelho que opera no universo cosmossocial, geossocial-humano e antropossial. Por isso se trata de uma teologia do evangelismo que deve ser espontaneamente inclusivista. E deve acima de tudo ter resposta para todas as perguntas da humanidade. Deve administrar soluções para todos os problemas do homem holisticamente necessitado de Deus. Isto é, um homem que precisa de Deus em todos os sentidos. Nesta perspectiva, envolvimento é mais do que se envolver. Envolvimento é conhecer, conviver, cuidar e resolver. Só assim o pecador conhece quem é Deus e então entende que ele precisa de Deus.
Na signa da missão planetária, o passo ulterior ― muito diferente do evangelismo tradicional há anos praticado no Brasil ― é o evangelismo envolvente. Contam-se, aqui, experiências de relacionamentos com a comunidade externa, isto é, com as pessoas da comunidade local que ainda não confessaram Jesus Cristo como Senhor. No grego, a palavra perivállon equivale ao latim involvente (ou circuítus) e quer dizer meio circundante de determinada ação. Isto, no pensamento grego, é um relacionamento atrativo e convincente para mudança de vida. Neste aspecto o evangelho planetário é uma libertação intracomunitária. É um envolvimento intra-relacional com a comunidade social.
Na evangelização planetária, a igreja não se dirige à sociedade secular atual a partir de uma perspectiva monoconfessional. Não se entabula um debate evangelizacional de qualquer tipo com a opinião da sociedade como conjunto e fazê-lo a partir das referências exclusivas de uma religião, denominação ou confissão. O discurso evangelizacional é fundamentado unicamente nos princípios universais do Evangelho de Jesus, como Senhor da nossa salvação. Ele de fato é o Senhor da salvação daqueles que o seguem.[11]
Logo, o discurso confessional é meramente religioso, dogmático e não tem valor espiritual no contexto da abrangente universalidade do Senhorio de Cristo Jesus. Qualquer discurso meramente religioso está fora de contexto histórico, é deslocado, por desconhecimento da configuração inevitavelmente plural da sociedade atual na sua complexidade planetária. A missão planetária da igreja, então, dirige sua palavra e sua ação à sociedade plural, ao mundo hoje diferente e estranho e, enfim, à humanidade que mesmo na realidade local vive uma dimensionalidade global. Não é, portanto, um discurso evangelizacional provinciano ― limitado apenas às ameaças de sua própria confissão e levando uma visão conservadora denominacionalista ― que usa como referência seu próprio patrimônio simbólico. Mas é um discurso que se faz compreender pela sociedade plural, que para ser alcançada exige um método de evangelização multiforme, espiritual, relacional e envolvente. Ou seja, um evangelho que se importa e que por isso é “sal da terra” e “luz do mundo”.
A missão planetária, então, dialoga com a sociedade plural por via da sua consciência social e humanitária. Ela é operante junto à opinião pública. A partir dessa consciência social, que é humanitária e holística, logo se levantou a possibilidade de uma missiologia planetária que deveria transcender e integralizar ao mesmo tempo a identidade diversificada e multiforme do evangelho do nosso Senhor Jesus Cristo. Poderíamos chamar a missão planetária de missão mundial, adequando-a panoramicamente para toda a humanidade. Neste viés, caberiam harmoniosamente contradições de todas as dimensões cristãs. O poder no âmbito social, financeiro e corporativo seria extremamente maior, operante e mais abundante.
No grego, a tarefa de evangelizar o mundo é definida pela palavra euangelizõ, conforme Atos 5.42, e é traduzida como falar das boas novas de casa em casa, como um processo de comunicação que se faz todos os dias no templo, de lugar em lugar e de casa em casa. Isto nada mais é senão um evangelismo envolvente, comunitário e familiar ao mesmo tempo.

4. UMA ESPIRITUALIDADE INCESSANTE E TRANSMISSIONÁRIA
Quando o Senhor Jesus ordenou que os seus seguidores fossem por todo o mundo e pregassem o evangelho a toda criatura, Ele quis dizer que isso só seria possível com poder e autoridade espiritual. Esta autoridade está nele (Mateus 28.18). Em Atos (1.8) está escrito: “Mas recebereis poder, ao descer sobre vós o Espírito Santo, e sereis minhas testemunhas tanto em Jerusalém como em toda a Judéia e Samaria e até aos confins da terra”.
A espiritualidade da Grande Comissão está entrelaçada ao “Ide”. A Grande Comissão não parou ali nos dias de Jesus. Ela se estende até aos nossos dias. Em toda a história, a igreja parece não ter encontrado o cerne hermenêutico desta compreensão. Sempre faltou algo. Vemos que a espiritualidade do “Ide” ― principalmente no livro de Atos ― se processa em diálogos intercomunitários, intracomunitários e transcomunitários. Não é mais uma espiritualidade de tradição e palidez cultural ou doutrinária. Pelo contrário, é uma espiritualidade de novidade de vida. Uma espiritualidade de novo nascimento. Uma espiritualidade de vida abundante em Deus, com Deus e para Deus.
O evangelho, portanto, só funcionará se for assim: com uma espiritualidade [envolvente] de vida abundante. Sem vida abundante não há missão planetária. E sem missão planetária, isto é, não-focada no “outro social”, não há vida abundante. Pois estamos vivendo o tempo do esfriamento do amor. Ou teremos vida abundante para resgatar as pessoas desse mar de frieza afetiva ou então pouquíssimos [“delas” e de “nós”] entrarão no reino dos céus.
Sem vida abundante, repetimos, não há missão planetária. E sem missão planetária, centrada no “outro” e nas necessidades do “próximo”, não há vida abundante. Não há, portanto, espiritualidade incessante para que se execute a prática transmissionária. Quando há vida abundante, a fluidez do evangelho na vida do cristão é natural. Tudo acontece naturalmente.
No Maranhão, ainda não se criou, por exemplo, uma conferência inter-regional de missões. Mas há necessidade de que isto aconteça inclusive no âmbito interdenominacional. Isto quer dizer que a prática missionária ainda não teve uma espiritualidade criativa de experiências em diálogo aberto para o mundo, que envolva todo mundo que tem o coração voltado para Deus, independente da sua placa denominacional. Entretanto, é importante que a nossa espiritualidade estabeleça diálogos sobre a diversidade missionária, tendo como foco a realidade social das várias categorias de comunidades.
Para que haja este diálogo, nossa proposta é de que seja estabelecida no Maranhão uma conferência inter-regional de missões, onde se possam discutir as missões planetárias: focadas na realidade social do mundo. Trata-se de uma missão que transite por uma espiritualidade de serviços, que sempre possa caminhar em direção ao próximo no universo de suas necessidades plenamente humanas. No Maranhão, bem como em todo o nordeste brasileiro, o contexto da celebração missionária poderá conquistar despertamento e interesses de todas as denominações, quando não da maioria delas, para uma união de forças e ações em prol da obra missionária.
Por meio desta possível conferência, que deve acontecer anualmente, as iniciativas conjuntas deverão oficializar ações transmissionárias que possam ir além da busca de unidade das várias confissões de fé. Que possam ir, também, além do mero diálogo entre as diversas denominações cristãs na denúncia profética contra questões políticas dominantes como o neoliberalismo. E, ainda, crescer no aprofundamento de uma espiritualidade macroeconômica.
A prática missionária, inerente ao processo de ações planetárias, de certo modo mira as relações a partir de uma teologia missionária abrangente e acima de tudo libertadora ― que não tem nada a ver com teologia da libertação. ― Trata-se, aqui, de uma teologia missionária que é efetivamente um discurso aberto ao outro socialmente existente, e de práticas espirituais de tendência implicitamente inclusiva, em que se consiga aprofundar a espiritualidade planetária e transmissionária proposta. O ano atual é um bom momento para se pensar e trabalhar este debate, para ver se se consegue uma prática efetiva neste sentido.
Neste prisma, o caminho poderá avançar mais onde grupos multiculturais e indígenas mais autônomos possam se sentir representados. Para isto, as autoridades missionárias e eclesiásticas precisam assumir o processo de macroevangelização e impulsionar o processo de ações transmissionárias, passando pelo viés dialógico transcultural bem como intercultural. Na conferência de missões inter-regionais é possível se articular estes e outros processos da práxis missionária emergente.
As conferências missionárias, bem como os fóruns e outros movimentos, servirão para manter o debate e a criatividade nas ações. As diversas entidades de missões se manifestam com o objetivo de diálogo e acabam fomentando o desejo e as atividades no âmbito de uma espiritualidade producente e interconectada às necessidades do indivíduo que ao mesmo tempo é sujeito das ações transmissionárias, haja vista que ações isoladas são pouco produtivas. De acordo com o “Ide” de Jesus, Deus quer que o corpo de Cristo seja uno e, nesta unidade, tenha poder de ação em nível macro. Este tipo de união é planetário. Isto é, uma união planetária em termo de organização e poder de ação na busca contínua e criativa por resultados no contexto de uma espiritualidade efetiva e incessantemente missionária.
É importante pontuar que, concernente ao processo de comunicação registrado em todo o livro de Atos, a ênfase peculiar da natureza missionária se concentra nas funções e atividades missionárias planetárias, não com esta nomenclatura, claro, mas de todas as maneiras com foco na plenitude das necessidades humanas. Os apóstolos anunciavam e falavam (laleõ ― Atos 4.1, 31), evangelizavam de casa em casa (euangelizõ ― Atos 5.42), ensinavam o povo (didaskõ ― Atos 5.42), proclamavam e pregavam (kerussõ ― Atos 4.2; 8.5, 6), anunciavam publicamente (katangellõ ― Atos 4.2; 13.5, 38; 15.36; 17.3), testificavam solenemente (diamarturomai ― Atos 2.40; 28.16, 23. Este termo aparece em todo o livro de Atos), davam testemunho (martureõ ― Atos 1.8), arrazoavam, argumentavam e discutiam (dialegomai ― Atos 17.2, 3, 17; 18.4, 19; 19.8-10; 24.24, 25).
Logo, o evangelho da missão planetária foca o homem no âmbito antropossocial (compreendendo sua cultura social) e no âmbito geossocial (compreendendo a sua ação na terra no seu aspecto formal, fisiológico, ecológico, biológico, produtivo, populacional, político etc.). Nesta perspectiva, a missão planetária acontece na lógica da igreja corpo de Cristo (espiritualidade ― abundante, cheia de Deus) versus igreja corpo social em Cristo (funcionalidade ― de alcance para fora). Logo, a lógica da igreja missionária é que ela é comunidade de poder, anunciando as boas novas com o acontecimento dos sinais que são operacionalizados pelos que creem, ou os acompanharão na medida da sua fé (Marcos 16.17, 18).
Definitivamente, a lógica da missão planetária na prática do evangelismo envolvente é a seguinte:
a)     Igreja corpo de Cristo (é espiritualidade);
b)     Igreja corpo social em Cristo (é funcionalidade).
Está claro que uma igreja espiritual é efetivamente evolvente porque se entrega à funcionalidade social no corpo de Cristo, da mesma maneira que uma igreja envolvente é espiritual porque exercita efetivamente os deveres espirituais no corpo social em Cristo. A ética da espiritualidade, então, se transforma naturalmente na ética da funcionalidade, na relação efetiva da igreja com a comunidade. E aí o evangelismo é planetário porque penetra na universalidade do “planeta-homem” em todos os sentidos, alcançando-o integralmente, em todo o seu universo existencial.[12]

5. FOCO NA SALVAÇÃO DE ALMAS. ALMAS SÃO PESSOAS
O discurso missionário para o mundo de hoje perpassa por um diálogo aberto no campo das ciências das religiões, da sociologia, da antropologia e da teologia que miram o fato de que, nos dias atuais, há um certo descrédito no que concerne à maioria das sociedades em relação às religiões. Observa-se que as sociedades seculares seguem por bases cada vez mais fundamentadas em inovações tecnológicas, mudanças rápidas e comunicação ultra-avançada. A igreja cristã, por vezes, normalmente se mantém fiel às tradições e, por isso, não adequa as suas linguagens à realidade do mundo contemporâneo.
Neste tom, algumas frentes missionárias seguem a orientação metodológica das suas denominações, porque, geralmente, há um código doutrinário que as impedem de aceitar o novo. Ocorre que as pessoas nas sociedades seculares seguem a linguagem das inovações tecnológicas. Neste sentido, a comunicação cristã perde. Mesmo os crentes leigos seguem nesta direção. Veja que, na sua maioria, os cultos de hoje em dia são frios, sem avivamento espiritual e de pouco compromisso com a fé genuinamente cristã. Os relacionamentos são fragilizados, indiferentes. E isso repercute na estrutura social-espiritual do corpo de Cristo.
Nossas experiências de evangelização registram a necessidade de se ter sensibilidade e capacidade espiritual para inserir as pessoas no processo da salvação. O bom senso é a compreensão quanto à forma de se relacionar agradavelmente com as pessoas. Ou seja, saber persuadi-las ou ensiná-las sobre a necessidade espiritual que cada ser humano tem de aceitar a fé salvadora. Cada pessoa é um projeto evangelístico, haja vista que cada uma tem sua individualidade; tem sua própria maneira de pensar e agir. Como operadores do evangelho, temos que ver cada indivíduo, cada pessoa, como sujeito. Temos de alcançá-la com a ação transformadora do Evangelho. Envolver pessoas no plano da salvação é um processo. Um processo que exige muito da nossa comunicação, das nossas técnicas e principalmente da espiritualidade.
Gosto muito da hermenêutica que o teólogo brasileiro Leonardo Boff aplica para João 3.8. Ele diz que o Espírito Santo enche o universo e a face da terra. Sopra onde quer e, portanto, conduz o missionário para onde quer. O missionário sempre chega mais tarde, sempre chega depois, uma vez que, antes dele, “lá estava o Espírito Santo, na história e no coração dos povos”.[13]
É um jeito divertido de o autor dizer que o Espírito Santo despertou as dimensões humanas em sua integralidade da criação:
“o amor, o cuidado, a solidariedade, a sensibilidade por tudo o que vive, a capacidade de captar as mensagens que nos vêm de todos os lados do universo, da natureza, da terra e de cada pessoa humana, o sentido de colaboração e de sofrer pelos outros, a força de gerar e de cuidar do mínimo sinal de vida, o sentido da beleza e da estética, o encantamento, a exaltação, a alegria pura e inocente e sua capacidade de capitar o invisível e de sentir Deus a partir do corpo”.[14]
Há uma ética de vida humana aí. Surge a necessidade missionária de encontrar a coerência adequada no ethos vivido e formulado com relação ao valor decisivo para a realidade humana. Não há lógica missionária sem a visão do ethos ― das várias culturas ― na devida funcionalidade da missão planetária na dimensão ética, ontológica e deontológica da vida humana.
Fazendo missões, pois, como testemunho da história e na história é o que sucede. Antes da sua morte, Paul Tillich costumava dizer que, hoje, não se pode estar em busca da verdade. Não pode sequer conhecer-se a si mesmo nem conhecer sua religião, menos que conheça a de outros. A mesma coisa dizia Paul Knitter.
Quando fazemos missões de verdade, focadas na salvação de almas, centradas no próximo e contemplando as suas necessidades, normalmente contrariamos a teologia sistemática em muitos pontos. Isto porque a teologia sistemática, pensada inicialmente por Santo Agostinho, parece limitar Deus na sua ação e no que Ele é. O problema começa quando ela, a teologia sistemática, tenta conceituar Deus, tenta defini-lo na sua infinita eternidade. Ao passo que Deus não se define pela intelectualidade humana. Ele mesmo se auto-define. Ele é “o Grande Eu Sou” e/ou “Eu Sou o Que Sou”. Isto significa que Ele “É” na plenitude eterna do “EU SOU”.
Quando a teologia sistemática tenta definir Deus, ela simplesmente quebra o princípio da auto-definição dele enquanto Criador Eterno, Infinito. Portanto, a definição humana de Deus não é válida porque Ele mesmo se auto-define.
Diante disto, a prática missionária verdadeiramente bíblica alcança o homem na sua dimensionalidade social e antropológica de uma maneira tal que vai além daquilo que a teologia sistemática define. Entendemos que a experiência e o contato da igreja com a sociedade plural transformam a comunidade alcançada e sua vivência social e, assim, direcionam tal comunidade a um novo modo de compreender o panorama do evangelho e, obviamente, entender a necessidade de se inserir no mistério da salvação. Este mistério, como disse Tillich, estará clarificado como discurso a partir de novos métodos de evangelização.
Categorias confessionais não servem para salvação de almas. Não servem porque, além de meramente religiosas, não se constituem um ambiente com visão de um evangelho planetário. É um ambiente muito doméstico, restrito, que desconhece a pluralidade da cultura do mundo. Desconhece as regras e os direitos do pluralismo social da humanidade. E não colabora com a teologia missionária dos tempos atuais, que efetivamente deve estar no nível das condições reais das sociedades do mundo atual. A igreja corpo de Cristo se auto-reconhece como igreja corpo social em Cristo e, aí, trabalha focada na cultura do mundo; focada em pessoas e nas suas comunidades bem como nas suas necessidades.
A partir desta consciência planetária e transmissionária a igreja brasileira do século XXI poderá discutir e levantar a possibilidade de propor uma prática missionária de absoluta relevância universal desvinculada da tradição que bitola a fé e a espiritualidade em nível de evangelização. Trata-se de uma visão missionária mundividente e, portanto, adequada a toda a humanidade e sem vínculo específico a nenhum segmento religioso particular. Estamos falando de uma missiologia planetária capaz de absorver um diálogo aberto a todas as culturas do mundo. Capaz de abranger a todas as pessoas inseridas exatamente nessa sociedade plural.
Aqui há um caminho que é interior em cada um de nós. O evangelho das boas novas externalizou o Espírito Santo que agora habita em cada um de nós e se encontra irradiante, atuando no cerne do anunciamento das boas novas da salvação no meio das culturas dos povos. Ele é o grande responsável de levar o nome do Senhor Jesus Cristo através das ações missionárias a cada gente. Há uma fonte que jorra as primícias do evangelho da salvação para dentro das pessoas. Então, logo é possível mergulhar para dentro do nome de Deus por meio da ação do Espírito Santo que se move em nós, age em nós e que, por meio de nós, leva as pessoas a encontrarem a vida e a nascerem de novo: da água e do Espírito (João 3.3-7). Este fenômeno do novo nascimento nada mais é senão a ação do Cristo por meio do Espírito de Deus que age em nós em favor do outro socialmente humano, carente e necessitado de Deus. E ele encontra, na pessoa do Cristo, o Deus Salvador.
Salvação é a manifestação da graça que gera arrependimento em nosso coração e nos liga a Deus por meio do perdão que recebemos ao confessarmos que Jesus é o Senhor, ressuscitado por Deus dentre os mortos (Romanos 10.8, 9, 10). Este é o maior ato de justiça que a história já protagonizou e produziu.

6. MISSÃO PLANETÁRIA, EVANGELISMO ENVOLVENTE E FUNÇÃO SOCIAL
Não tem como falar em missão planetária e evangelismo envolvente sem mencionar o discurso do apóstolo Paulo em Efésios capítulo 4 e versículos de 1 a 6, onde ele recomenda à comunidade cristã efesiense a andar de modo digno da vocação à qual foi chamada, solicitando que os crentes andassem na missão, fazendo a boa obra “com toda humildade e mansidão, com longanimidade, suportando uns aos outros em amor” (v. 2).
O versículo 3 fala do esforço que todos os cristãos deveriam fazer diligentemente por preservar a unidade do Espírito no vínculo da paz. Paulo justifica isto dizendo que “há somente um corpo e um Espírito, como também fostes chamados numa só esperança” da vocação (v. 4), porque “há um só Senhor, uma só fé, um só batismo; um só Deus e Pai de todos, o qual é sobre todos, age por meio de todos e está em todos” (vs. 5, 6).
Isto nada mais é senão espiritualidade efetivamente relacional e, portanto, ação evangelizacional envolvente, em que se verifica a concretude da função social da igreja corpo de Cristo que faz dela corpo social em Cristo e, portanto, comunidade de poder.
No livro a A Igreja Cidadã, faz-se saber que, por muito tempo, a igreja não se configurou como um foco do interesse da gestão eclesiástico-social e de uma pedagogia evangelística que pudesse educar o povo numa espiritualidade envolvente de alcance para fora. Embora constituindo-se no espaço específico que os cristãos reservaram para veicular o conhecimento do Evangelho da Salvação ― em que se julga importante transmiti-lo à sociedade de indivíduos carentes de Deus e, por isso, necessitados do novo nascimento ― a igreja permaneceu estritamente verticalizada. Agora, com o advento da modernidade e, portanto, das transformações ultramodernas das sociedades que unem o “local” ao “global”, as novas realidades trazem o papel da igreja para o centro do debate sobre a função social do corpo de Cristo. Ou seja, este debate acontece ressignificando o sentido de uma reflexão sobre a função social da igreja na formação da identidade do cidadão do céu.
Então, o debate sobre missão planetária tem por intenção trazer a lume a relação entre a função social da igreja corpo de Cristo, a gestão eclesiológica, a prática do evangelismo envolvente e a arte educativa dos princípios do evangelho de Jesus como aprofundamento da salvação, buscando compreender o mistério da vida eterna como bem supremo para a humanidade pecadora alcançável pela própria magnitude do evangelho de Cristo.
Ao refletirmos sobre a função social da igreja, a primeira coisa que devemos perguntar é: que articulação existe entre igreja e sociedade ― ou, mais especificamente, entre igreja e cidadania ― a ponto de fazer dela agente de transformação da realidade social a partir de sua prática evangelizadora?
Bem, refletiremos o seguinte: se toda a sociedade se caracteriza pela coexistência de várias culturas, tradições e linguagens, a evangelização tem significação pluralizada e particular ao mesmo tempo. A igreja, de fato, institui e trabalha o evangelho do nosso Senhor Jesus Cristo no contexto da cidadania. A igreja é o ambiente onde as pessoas deixam de pertencer exclusivamente a uma cultura particular para se integrarem numa comunidade plural, mais ampla, em que os indivíduos ― como sujeitos alcançáveis e passíveis de transformação ― estarão reunidos não por vínculos de parentesco ou afinidade, mas pelo chamado por via do evangelho para serem inseridos na simplicidade da vida abundante e, portanto, por via de uma consciência planetária, para viverem em comum. Viver em comum significa viver em comunidade (ou viver com-unidade).
A igreja, desta maneira, institui, em outras palavras, a coabitação de pertencimento de indivíduos de diferentes tradições e culturas sob a autoridade de um mesmo fundamento do evangelho do reino do único Senhor, Salvador e Rei: Jesus Cristo, o Justo.
Não se pode negar que já há, sim, uma estreita relação entre algumas ações da igreja com a sociedade, em matéria de convivência social. Mas não existe, ainda, nenhum tipo de articulação instituída entre igreja e a cidadania que se possa louvar ou celebrar como missão planetária. Ou seja, é no exercício da convivência e/ou da espiritualidade envolvente entre a igreja e os indivíduos da sociedade plural, de diferentes culturas e linguagens, que acontecem o alcance e a transformação dos sujeitos no contexto da salvação. É aqui que o cuidar planetário ocorre e é holístico. Afinal de contas, o evangelho planetário fala para o indivíduo plural, pertencente a uma comunidade plural. Plural porque agora é global.
Com esta visão planetária, a igreja renasce com uma nova noção de mundo, trabalha a contextualização de sua comunicação e linguagem para então alcançar o indivíduo pertencente a uma sociedade globalizante de cultura global transitória ― indivíduo este inserido numa comunidade plural, que transita na diversidade de consciência e sentidos.
Estamos falando de sociedades complexas ― ou da chamada sociedade do conhecimento ― em que nesse contexto o papel da igreja tende a assumir uma determinada importância sem precedentes. Neste ponto, deve-se considerar também o fato de que a igreja é uma instituição social que existe historicamente. Por muito tempo ela pensou a sociedade no âmbito de seus modelos funcionais, porém sempre se equivocou quanto ao método de evangelização. Ela se preocupou em cuidar mais de si própria ― falar para si mesma ― do que com o “ide a todo mundo” e alcançar “a toda criatura” (Marcos 16.15). “Criatura” no amplo sentido do termo.
Sempre temos dito que a prática missionária planetária consiste na concretização das condições que asseguram a realização do trabalho evangelístico prático. Estas condições não se restringem ao estritamente “teológico/pedagógico”, já que a igreja pode e deve cumprir funções que lhe são disponibilizadas pela sociedade concreta que, por sua vez, se apresenta como sociedade constituída por classes sociais cujos interesses são antagônicos entre si.
É neste nível, finalmente, que o apóstolo Paulo aconselha em Efésios 4 que os crentes devem se esforçar “diligentemente por preservar a unidade do Espírito no vínculo da paz” (v. 3), uma vez que “há somente um corpo e um Espírito” (v. 4) e, também, “há um só Senhor, uma só fé, um só batismo” (v. 5). Isto acontece, diz Paulo, porque há “um só Deus e Pai de todos, o qual é sobre todos, age por meio de todos e está em todos” (v. 6).
Paulo está dizendo com isto que a prática missionária e evangelística deve ser planetária e, portanto, envolvente porque tem em torno de si condicionantes sociais, geopolíticas, antropológicas, econômicas e espirituais que, enfim, configuram diferentes concepções de homem e de sociedade que estabelecem, aí, uma comunidade plural. Percebem-se, então, diferentes pressupostos acerca do papel da igreja nas suas relações com os sujeitos sociais que a levam a pensar em métodos e técnicas de evangelização que sejam estratégicos para alcançar cada indivíduo no meio da sociedade pluralizada de cultura global. Isto faz da igreja corpo de Cristo igreja corpo social em Cristo com absoluta função social para alcançar a todos num mundo que é complexo e, portanto, observável sob diferentes aspectos.

7. CONCLUSÃO: COLETIVIDADE E ALCANCE PARA FORA
O corpo de Cristo é coletivo. Isto quer dizer que ele é feito de relacionamentos entre pessoas. Em todo o Novo Testamento, a igreja corpo de Cristo sempre foi um corpo espiritual-social em movimento, buscando relacionamentos com o próximo. Por esta razão Jesus disse “Novo mandamento vos dou: que vos ameis uns aos outros..., e assim conhecerão todos que sois meus discípulos” (João 13.34, 35).
Jesus parece determinar, aqui, que o verdadeiro método para evangelizar o mundo é o amor. O amor une os salvos no corpo de Cristo, mobiliza-os e atrai pessoas do mundo para serem inseridas no contexto do evangelho onde, então, elas são discipuladas e cuidadas pela mobilização e consciência do mesmo amor.
A igreja é um corpo em movimento. Por isso as funções sociais que cabem a ela desenvolver são dinamizadas através de relações entre as classes sociais. Aqui é interessante considerar a contribuição de um discipulado fora dos portões da congregação que resultam em diferentes concepções do papel da igreja enquanto grupo social e, consequentemente, de sua função espiritual-social na construção do sujeito social como cidadão do reino de Deus e também cidadão do mundo.
Na verdade, discipular ou pastorear pessoas ainda não-convertidas, por meio de relacionamentos e ações envolventes, é um tema que ainda não chegou aos interesses da igreja, mas que é profundamente necessário nos dias atuais. De fato, a função social da igreja estabelece sua magnitude espiritual na arte de evangelizar o mundo e deve ser canalizada em torno do debate acerca da missão planetária. Aqui é possível identificar papéis trazidos a lume para a igreja nas suas diferentes ações evangelizadoras.
Nesta perspectiva, então, a função social da igreja, praticada do lado de fora dos portões, consiste na preparação dos não-convertidos para entenderem a sua carência de Deus e a necessidade de confessar Jesus como Senhor e Salvador. O compromisso social da igreja, enfim, é com os indivíduos de uma sociedade plural agonizante mergulhada em um mar de situações-problemas, estando aí ao mesmo tempo suas demandas sociais, existenciais e espirituais.

Referências bibliográficas
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ATTALI, Jacques. Uma breve história do futuro. São Paulo: Novo Século, 2008.
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GETZ, Gene A. Igreja: forma e essência. São Paulo: Vida Nova, 1994.
HESSELGRAVE, David J. Plantar igrejas: um guia para missões nacionais e transculturais. São Paulo: Edições Vida Nova, 1995.
MORAIS, Ione. Conhecendo para guerrear. Goiânia: Kelps, 2009.
PIPPERT, Rebecca Manley. Evangelismo natural: um novo estilo de comunicar sua fé. São Paulo: Mundo Cristo, 1999.
SOAREZ, Battista. A igreja cidadã: o evangelho real, socialmente inserido e socialmente responsável. Curitiba-PR: AD Santos Editora, 2018.
VIDAL, Marciano. Para conhecer a ética cristã. São Paulo: Paulus, 1993.
VIGIL, José María (org.). Por uma teologia planetária. São Paulo: Paulinas, 2011.


[1] Pr. Battista P. Soarez. Escritor, professor, jornalista, pedagogo, psicopedagogo, teólogo, sociólogo e assistente social. Pós-graduado em Marketing (UCAM/RJ) e em Comunicação e reportagem (UEMA), é autor de vários livros e artigos. Atualmente é o secretário de missões da COMADEMA (Convenção da Assembleia de Deus no Estado do Maranhão).
[2] Isto também pode ser chamado de antropogeografia. A antropogeografia ou geografia humana trata de todos os feitos terrestres resultantes da atividade do homem na complexidade social do mundo, em que obviamente a igreja está inserida.
[3] Marcelo Barros. A frágil transparência do Absoluto. Teologia para uma espiritualidade transreligiosa. In José María Vigil. Por uma teologia planetária. São Paulo: Paulinas, 2011, p. 60.
[4] Russell Jacoby. O fim da utopia: política e cultura na era da apatia. Rio de Janeiro/São Paulo: Record, 2001. Lendo este autor, percebem-se fragmentos ínfimos que podem levar a percepções mais agudas e, a partir daí, gerar uma noção mais abrangente da realidade social e das suas expressões sociais.
[5] David J. Hesselgrave. Plantar igrejas: um guia para missões nacionais e transculturais. São Paulo: Edições Vida Nova, 1995, p. 130.
[6] Battista Soarez. A igreja cidadã: o evangelho real, socialmente inserido e biblicamente responsável. Curitiba-PR: AD Santos Editora, 2018, p. 222-245.
[7] Ortopraxia é um termo usado no livro “A Igreja Cidadã” (Battista Soarez. A Igreja Cidadã: o Evangelho real, socialmente inserido e biblicamente responsável. Curitiba-PR: AD Santos Editora, 2018) para designar o sentido de correção de deformações sociocomunitárias. O autor toma o termo emprestado da medicina e o aplica na realidade social-comunitária.
[8] Gene A. Getz. Igreja: forma e essência – o corpo de Cristo pelos ângulos das escrituras, da história e da cultura. São Paulo: Vida Nova, 1994, p. 94.
[9] Battista Soarez. A igreja cidadã: o evangelho real, socialmente inserido e biblicamente responsável. Curitiba-PR: AD Santos Editora, 2018.
[10] David J. Hesselgrave. Plantar igrejas: um guia de missões nacionais e transculturais. São Paulo: Edições Vida Nova, 1995, p. 137.
[11] Rebecca Manley Pippert. Evangelismo natural: um novo estilo de comunicar sua fé. São Paulo: Mundo Cristão, 1999, p. 35-39.
[12] Raimon Panikkar. Teologia da libertação e libertação da teologia. In: José María Vigil. Por uma teologia planetária. São Paulo: Paulinas, 2011, p. 173-179.
[13] Leonardo Boff. Cristianismo: o mínimo do mínimo. Petrópolis, RJ: Ed. Vozes, p. 61.
[14] Idem, p. 61.