REFLEXÃO DA MATINA
Por Battista Soarez
Costumo fazer minhas orações a Deus nas
primeiras horas do dia, antes mesmo do café da manhã. Nesta semana, algo
diferente vem acontecendo comigo. Todas as vezes que começo a cantar e a orar, meu
coração se enche de contentamento de tal maneira que os cantos entoados e a
leitura do texto bíblico saem com uma voz um tanto engasgalhada. Meu peito se
enche de uma sensação jubilosa e meus olhos ficam marejados de lágrimas
inexplicáveis. Não sou de me emocionar com facilidade. Nas profissões que
acumulei na vida (jornalismo, psicoterapia e a faculdade de direito), aprendi a
não me envolver emocionalmente com os fatos. A última vez que me lembro de ter
chorado foi em 2009, quando minha mãe faleceu.
Mas, ultimamente, simples fainas e contentamentos
espirituais têm me feito chorar. Isto ocorreu ontem, enquanto dirigia o carro,
ao lembrar do hino 166 da Harpa Cristã que há anos não cantava, desde a minha
juventude, quando, em 1983, aceitei a Jesus como meu Salvador. Para ser
honesto, já havia esquecido a melodia. O refrão do hino diz: “Deixa entrar o Rei da glória / Em ti mesmo,
ó pecador; / Quem é este Rei da glória? / É Jesus, o teu Senhor”. Hoje, no
devocional da manhã, o hino veio novamente à lembrança. Então cantei. Não deu
noutra: o Espírito me encheu e chorei. Depois, li o capítulo 20 inteiro do
Evangelho de Lucas e chorei novamente. Em seguida, orei com júbilo.
Enquanto orava, o Espírito de Deus me trouxe à
reflexão algumas lições que quero compartilhar, aqui, com os meus leitores.
A primeira delas é que os erros nos ajudam a
conhecer todos os caminhos que levam a nada. Assim, fica mais fácil seguirmos o
rumo certo que nos guiará a alguma coisa com sentido. Conhecendo todos os
caminhos que levam ao erro, ficará mais fácil, agora, seguir o rumo certo. Mas
é preciso ter inteligência espiritual para saber aprender com os erros. Do
contrário, vamos utilizá-los apenas para nos abastecermos de culpa e, então,
nos tornarmos presas fáceis do diabo. A inteligência espiritual nos leva a ter
intimidade com Deus e, aí, nossos erros se tornarão em aprendizado da fé, em
vez de pecados. A falta de inteligência espiritual (a ignorância espiritual)
nos leva a não entender o sacrifício vicário de Jesus e, ao que parece, a acreditar
que o pecado é mais forte que o preço pago por Ele na cruz em nosso favor. A
maioria dos cristãos vive num paradoxo da fé: prega que a morte de Jesus na
cruz significa também a morte do pecado, mas vive totalmente o contrário; acredita
que a ressurreição dele representa a liberdade de todo aquele que nEle crê, mas
vive numa eterna prisão religiosa.
Muitos cristãos, na prática, parecem invalidar o
poder libertador do Cristo ressuscitado e ressuscitam o pecado que Jesus matou
na cruz. Sim, isto ocorre a cada vez que, por causa de um erro qualquer, saímos
da igreja ao invés de nos apegarmos ainda mais a Jesus em busca de seu amor e
intimidade com Ele. Ressuscitamos o pecado a cada pastor que fraqueja e, em vez
de o perdoarmos, condenamo-lo a perder o ministério, matando a obra de Deus na
sua vida. Recentemente, numa revelação, Jesus falou-me da sua vinda e das
injustiças dos conselhos de doutrina das igrejas. Chamou-os de “porcos mortos”.
“Eis que o meu Espírito não está nesses conselhos de doutrina — disse Ele. — Pois eles abandonaram a
minha Palavra que ensinei no Sermão da Montanha, pregando injustiça aos homens
com seus manuais de doutrina. Por causa dessas doutrinas, eles causam divisões
na minha igreja. Não se perdoam entre si. Quando um pastor, servo meu, cai,
eles não o perdoam, ficando assim prejudicada a minha obra na vida dele”. Para
mim, enquanto intelectual que costuma ser um tanto racional e muito cuidadoso — não me deixando impressionar
com visões, profecias e revelações — foi um impacto tão forte que levantei de
madrugada e escrevi aquela revelação. Interessante é que tive esta mesma
revelação em 1983. Agora estava em 2014. Ou seja, 31 anos depois voltei a ter a
mesma revelação.
A segunda lição que aprendi foi que se colocarmos
os obstáculos como nossos aliados e não como inimigos, eles nos ajudarão a
chegar ao topo e vencer. Exemplifico isto com a história de um turista
americano que estava na Índia num dia dedicado à peregrinação ao topo de uma
montanha sagrada. Centenas de pessoas se preparavam para a subida íngreme e
difícil. O americano, acostumado a exercícios físicos e se julgando em boa
forma, decidiu participar da experiência. Vinte minutos depois, completamente
sem fôlego e quase incapaz de dar mais alguns passos, viu passarem facilmente
por ele mulheres carregando bebês e frágeis velhinhos apoiados em bastões. “Não
consigo entender — disse ele a um amigo
indiano. — Como é que essa gente
consegue e eu não?”. O indiano respondeu: “É que vocês americanos têm o hábito
de encarar tudo como um teste. Você encara a montanha como um inimigo e se
dispõe a derrotá-la. A montanha, naturalmente, também luta e é muito mais forte
que você. Nós, indianos, não vemos a montanha como um inimigo a vencer. Nosso
objetivo é uma unidade com a montanha. Uma espécie de amizade com ela. Assim,
ela nos levanta e nos carrega pelo caminho”. Então, matei a sacada: a melhor forma
de vencer um obstáculo é torná-lo nosso aliado. Assim, toda a sua força lutará
a nosso favor.
A terceira coisa que a reflexão matinal me fez
vê foi: todas as pessoas que se levantaram contra mim são pessoas fracassadas e
derrotadas na vida. Isso tem uma explicação. As pessoas aprenderam,
erroneamente, que para ser vencedor tem que ter perdedor. Todo aquele que se
dispõe a ser um vencedor descobre que tem de enfrentar os outros. Na sua visão,
sua ascensão é a queda dos outros. E esta maneira de ver as coisas tem suas
consequências. A inveja, por exemplo, incendeia em nós um espírito de
competição e anseio por derrotar os outros. E isso é péssimo.
Muitas vezes ajudei pessoas pensando no melhor
para elas quando, de repente, descobri que elas me odiavam meramente por inveja.
Surpreso, perguntava para um vácuo de silêncio sem resposta: “por que?”.
Simples: elas não queriam minha ajuda, queriam estar no meu lugar; queriam ter
o que eu tenho; queriam ser o que eu sou.
Mesmo no seio familiar acumulei experiências
dolorosas. Trabalhei muitas vezes para ver minha família vivendo bem e
confortavelmente. Quando menos esperava, estas mesmas pessoas a quem procurava
amparar se constituíram inimigas. O profeta Miquéias nos alerta para este
perigo: “Os inimigos do homem são os da sua própria casa” (Miquéias 7.6b).
Finalmente, a última lição desta manhã. Li, numa
certa ocasião, que, no cristianismo medieval, havia a história do
prestidigitador. Para quem não sabe, o prestidigitador é aquele artista que,
pela ligeireza dos movimentos das mãos, faz deslocar ou desaparecer objetos.
Com isto ele manipula suas mágicas, iludindo a vigilância do espectador de
maneira que parece inexplicável. E, no texto que li, conta que cada um dos
fiéis trazia uma dádiva para honrar a Virgem Maria no seu dia. Os fiéis
participantes do evento traziam presentes caros e refinados, tapeçarias tecidas
à mão e coroas incrustadas de pedras preciosas.
Numa daquelas ocasiões, havia um jovem pobre e
humilde. Ele era muito simples. Não tinha presente para oferecer e nem dinheiro
para comprar qualquer dádiva. Mas ele tinha uma coisa que os outros não tinham.
Ele sabia praticar o ilusionismo. Sem nada para oferecer, ele teve uma ideia:
começou a dançar, burilando requebrados, fazendo silhuetas, traçados com as
mãos e os pés. E, na sequência, fazia mágicas diante da imagem da Virgem, para
horror dos bem comportados espectadores. Mas ele fazia tudo aquilo de todo o
seu coração, de toda a sua alma que aquela sua dádiva foi a que teve melhor
aceitação.
O que podemos aprender com isto? Que não importa
o pouco ou o inusitado que você ofereça. Importa é que o que você faz, o faça
com a força do coração e intensidade de alma. Certa viúva pobre fez isso diante
de Jesus e se deu bem na presença do Mestre (Lucas 21.1-4).
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