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sexta-feira, 10 de junho de 2022

MEMÓRIAS: DISCURSO DE COLAÇÃO DE GRAU (1984) | Dr. Jomar Câmara

Memória jurídica
Do discurso de colação de grau da UFMA em 1984, o que mudou após 36 anos no mundo do Direito?

 

Por Jomar Câmara
(Subprocurador Geral do Estado do Maranhão)

 

Dr. Jomar Câmara, subprocurador geral do Maranhão | Foto: arquivo pessoal.

DISCURSO DE COLAÇÃO DE GRAU
Curso de Direito da UFMA. Ano 1984.
Teatro Arthur Azevedo. São Luís/MA.

ERA O MÊS DE JANEIRO DO ANO DE 1984. Como orador oficial da Turma Kléber José Moreira Filho, da UFMA, então concludente do curso de Direito, em cerimônia realizada no Teatro Arthur Azevedo, eu, hoje Subprocurador Geral do Estado do Maranhão, após saudar autoridades presentes, pais, familiares, alunos concludentes e, em especial, o Paraninfo Profº Nivaldo Guimarães Macieira, expressei inquietações com o mundo, caracterizado por uma multiplicidade de fatores, mas sem esquecer a sociedade brasileira.

Falando das carreiras jurídicas aos 33 (trinta e três) jovens, homens e mulheres, para os quais foi dito que teriam o instrumento prático da linguagem como moeda corrente a partir daquele instante, eis que o direito se inflacionaria e se desvalorizaria à medida em que perdêssemos o lastro da ideia. Pensava nos ensinamentos do maior orador e jurista da história, Cícero, que já na Antiguidade transcrevia “que maior e melhor presente podemos dar à República do que ensinar e educar a juventude a descobrir suas potencialidades?


Foi expressado que se a sociedade não pode igualar os que a natureza criou desiguais, cada um nos limites da sua energia moral, no entanto pode reagir sobre as desigualdades nativas, pela educação, atividade e perseverança, tal a missão do trabalho que laboraríamos daquela data em diante como membros do corpo jurídico brasileiro. Logo da análise da conjuntura social brasileira naquela época foi dito que devíamos pensar como Rui Barbosa, em sua obra “Oração aos Moços” no qual adverte: “ides consagrar à lei, num país onde a lei absolutamente não exprime o consentimento da maioria, onde são as minorias, as oligarquias mais acanhadas, mais impopulares e menos respeitáveis, as que põem, e dispõem, as que mandam e desmandam e tudo a saber; num país onde, verdadeiramente, não há lei, não há moral, política ou juridicamente falando”.

Então, falei nas dificuldades a serem enfrentadas. Pois, no Brasil, a lei se deslegitima, anula-se e se torna inexistente, não só pela bastardia da origem, senão ainda pelos horrores da aplicação. Neste contexto, o ordenamento jurídico brasileiro da ocasião era insuficiente para reordenar o Estado, reclamando assim convocação de uma Assembleia Nacional Constituinte, revogando-se a legislação autoritária como a Lei de Segurança Nacional, tendo o novo ordenamento jurídica concepção de uma “Ordem Jurídica” por uma Constituição outorgada, legítima em um Estado Democrático de Direito.

A questão fundiária, tratada com certa dificuldade, naquele momento era controvertida, ensejando Reforma Agrária adaptada às suas exigências sociais, diluindo o conflito direto entre posseiros, de um lado e grileiros e proprietários de outro, na luta pela posse e propriedade da terra, uma vez que a moderna concepção da propriedade como função social vinha sendo desrespeitada e ignorada em diversos episódios referentes à posse da terra.

Os problemas eram tantos em 1984 que a Crise na Economia mundial e consequente Recessão Econômica no Brasil, exigia, como de fato, ainda, exige modernamente, uma reforma tributária, estruturada nos moldes da real vida social no país, objetivando-se a oferecer a todos mais participação no produto da arrecadação da União. Não cabia naquela época, assim como nesta, simples instituição de tributos, tirando-se diretamente ou indiretamente do contribuinte aquilo que é peculiar à sua existência. Os Estados e Municípios precisam de sustentáculos e mais repasses da receita bruta nacional.  Esse argumento, trouxe ao contexto que o Apóstolo Paulo em suas pregações falava que boa é a lei onde se executa legitimamente” BONA EST LEX, SI QUIS EA LEGITIME UTATUR”- querendo transmitir que- Boa é a lei quando executada com retidão, ou seja, boa será, em havendo no executor a virtude, que no legislador não havia.

Então, era vital reforma do judiciário brasileiro inspirando-se nos reais interesses da justiça, trazendo proposta séria e efetiva independência, política, administrativa e financeira. Sempre falando que era inadmissível o controle do Poder Executivo no processo de escolha, promoção e remuneração de magistrados. De igual forma coloquei que a instituição do Ministério Público, guardião da lei, deve ser liberada de tal subordinação, a fim de bem cumprir sua função constitucional. Que exista a independência entre os poderes da União Federal, conforme estabelecia o artigo 6º da Constituição, vigente, naquele período, mas que essa harmonia não era para tirar autonomia, quer do Judiciário, quer do Legislativo, sobrepondo o Executivo como suporte mestre de ambos. Devíamos excluir do executivo a função de legislar, como fazia esse Poder através de Decretos-Leis, como as Medidas Provisórias de hoje, uma vez agredir o homem democrático, sendo necessário nessa esteira que era urgente um efetivo sistema de assistência judiciária, a descentralização dos tribunais, o controle pelo Judiciário e Ministério Público, dos atos praticados na apuração das infrações penais, vez que, como acontecia, prejudicava a Justiça.


A sociedade humana é o meio em que o direito surge e desenvolve-se. Direito é realidade da vida social e não da natureza física ou do psiquismo da vida dos seres humanos, conforme leciona o Profº Hermes de Lima, na obra Introdução à Ciência do Direito. Por isso, trouxe à baila que deveríamos pensar nos moldes do insigne Advogado Sobral Pinto, o qual assegurava que o profissional do direito deve estar sempre dialogando com a democracia em busca da Democracia e do Estado de Direito. Democracia que para o ex-Presidente Médici é a forma de convivência política, não constituindo categoria lógica, imutável no tempo e no espaço, porém conceito histórico, sujeito às revisões impostas pela conveniência social.

Foi, então, concluída a temática, falando que nossa direção profissional diversificava-se em alguns aspectos sobressalentes como;-A questão do ensino jurídico resultante de pretensa perspectiva democrática, e as limitações do mercado de trabalho, real perspectiva de desvalorização da advocacia, com o rebaixamento de seu padrão cultural e técnico-profissional;-A dependência do Poder Judiciário e a crise na administração da justiça, configurando-se pela morosidade, custo elevado e elitismo, reclamando um esforço conjunto das três profissões forenses; magistratura, ministério público e advocacia, dando-lhes autonomia, mas garantindo ao advogado sua condição de “elemento indispensável à administração da justiça”, como está na lei;-Pesquisar objetivamente as condições do mercado de trabalho das atuais alternativas da profissão e as perspectivas de cada um.

Destarte, não nos desvairíamos em nosso inexperiente entrar no mundo jurídico-profissional: cultivando as relações de poucos amigos, inescrupulosamente escolhidos entre homens que nos pareçam mais graves e estudiosos, buscando os nossos livros que são amigos insuspeitos, verdadeiros e úteis, eis que o futuro grandioso nos esperava, na certeza de que Deus iluminaria nossos espíritos para conhecermos o caminho que devíamos trilhar, nos movendo o coração sempre para o bem. Obrigado!

Passados 36 anos, fica uma pergunta: existem diferenças entre a sociedade jurídica do Brasil daquela época e a de hoje?

domingo, 29 de maio de 2022

Entrevista: PR. FRANCISCO TAVARES | Missões com "barreiras"

ENTREVISTA: PR. FRANCISCO TAVARES

Missão sem “fronteiras”. Mas com muitas “barreiras”
O pastor missionário Francisco Tavares, da AD no Maranhão, fala da dificuldade de evangelizar sem salário e diz que a igreja evangélica cruzou os braços e fechou os olhos para a obra missionária.


Por Battista Soarez
(De São Luís - MA)

Pr. FranciscoTavares em São Luís, onde mora com a esposa | Foto: Battista Soarez

“EU SINTO MUITA TRISTEZA quando vejo a forma como estão tratando a obra missionária atualmente. Uma verdadeira injustiça”, diz o pastor Francisco Travares, 59 anos, membro da Igreja Evangélica Assembleia de Deus no Maranhão. Tavares é casado com a missionária Eliene de Jesus Mendes Tavares, filha de pastor, e, como muitas esposas de pastores, se mostra bastante entristecida quando o assunto é o ambiente cristão. O casal tem dois filhos. Um homem e uma mulher. E dois netos.

O pastor-missionário é evangélico desde criança. Cresceu sob as orientações doutrinárias da Bíblia e cedo ingressou numa carreira profissional promissora. Ainda muito jovem, foi executivo de três multinacionais como Ambev, Alumar e Vale do Rio Doce. Nos anos 1990, recebeu um convite da Assembleia de Deus em São Luís para ingressar no ministério pastoral, o que o levou a abrir mão de um ganho de quase 50 salários mínimos, à época, para ser pastor. Formado em química, sociologia, filosofia e pedagogia, resolveu também se capacitar na área teológica com o intuito de servir a igreja evangélica. Bacharelou-se em teologia, fez mestrado em antropologia missionária e ainda fez dois doutorados.

Depois de tudo isso, teve a primeira decepção: o acordo da igreja não foi cumprido. Com isso, vieram as dificuldades e Tavares teve de se virar dando aulas em instituições de ensino superior para sustentar a família. Ao ingressar na CEADEMA (Convenção Estadual da Assembleia de Deus no Maranhão), nunca recebeu uma igreja para pastorear. E, como pastor, nunca teve salário. Foi aí que ele resolveu ser missionário em tempo integral, recebendo doações de voluntários para sobreviver. Pastor Tavares tem viajado por regiões do Brasil em busca de conhecimento e capacitação para servir a obra de Deus. Mas percebe que a idade está passando rapidamente e do muito que aprendeu pouco tem sido aproveitado ao longo do seu sofrido ministério.

Em entrevista ao Leitura Livre, Tavares falou em tom firme, deixando claro que conhecimento ele tem com fartura para administrar qualquer situação ministerial em matéria de igreja. Nesta entrevista, fica claro que a liderança da igreja evangélica não está sabendo aproveitar seus soldados, em detrimento de políticas eclesiásticas míopes e assassinas de dons e ministérios em homens que Deus chamou e capacitou para fazer a sua obra. Vamos à entrevista. Longa, mas que vale a pena ler para conhecer a realidade do campo missionário:

LEITURA LIVREO senhor é visto como um dos pastores da CEADEMA (Convenção Estadual da Assembleia de Deus no Maranhão) mais bem preparados e dedicados na obra de Deus na sua convenção. Para o senhor, hoje, que se preparou intelectual e teologicamente a vida inteira para servir a igreja, o que significa fazer missões numa denominação como a Assembleia de Deus que, no Brasil, não tem visão missionária?

PR. FRANCISCO TAVARES — É uma pergunta um tanto difícil de ser respondida. Porque, quando nós olhamos para a estrutura denominacional de uma igreja do porte das Assembleias de Deus no estado do Maranhão e comparamos essa estrutura enorme com a sua incapacidade de ver e enxergar os campos brancos, a gente fica até constrangida de fazer algum tipo de avaliação ou crítica, ainda que seja construtiva. Porque a disparidade, a discrepância entre a estrutura de natureza econômica, financeira, física, prédio, veículo etc. e a necessidade que existe no campo, é tão grande que é como se comparássemos o padrão de vida de quem mora na África do Norte com quem mora na Suécia, por exemplo. Porém, respondendo de uma forma mais objetiva à sua pergunta, fazer missões nas condições em que vivo hoje e numa igreja sem nenhuma visão missionária, significa três coisas.

Pr. Tavares em um assentamento em Humberto de Campos | Foto: Divulgação

L. LIVRE — Quais?

PR. TAVARES — A primeira é renunciar o básico como, por exemplo, almoçar e jantar. Renunciar andar de carro particular ou de coletivo e ter que andar a pé, caminhar por até 200 quilômetros como eu tenho feito ao longo do meu ministério missionário. A segunda, significa se tornar antipático, inimigo, como se a gente fosse um comunista, esquerdista, sanguinário, daqueles que são considerados como se fossem stalinistas. Assim são vistos aqueles que têm visão missionária dentro da nossa denominação. E a terceira, significa ter de chorar, orar e derramar muitas lágrimas e dividir estas lágrimas com milhares de pessoas carentes e necessitadas somente no Maranhão.

L. LIVRE — Tudo isso?

PR. TAVARES — Sim. Imagine só. Quatro anos atrás, eu, juntamente com a SEPAL (Serviço de Evangelização Para a América Latina), fizemos uma pesquisa de natureza científica e constatamos, e posso provar, 35 mil povoados no Maranhão sem a presença do evangelho de Jesus. Mais especificamente por parte de qualquer igreja da Assembleia de Deus. Conheço vários municípios no sertão onde já foram levantadas várias igrejas da Assembleia de Deus e, por falta de manutenção, caíram as paredes literalmente. Porque, pura e simplesmente, não existe visão de plantio de igreja. Igreja não é como uma bananeira que a gente planta e ela cresce rápido. Uma igreja pode levar até trinta anos para crescer. Eu conheço uma província na Suíça onde dois missionários americanos passaram trinta anos e não ganharam uma alma para Jesus. Um dia tiveram que se aposentar. O segundo casal que chegou lá conversou comigo e o Reinaldo Lindório. E eu, então, perguntei para o casal: “o casal de missionários que acabou de se aposentar passou trinta anos aqui e não ganhou uma alma para Jesus. E vocês?”. Eles olharam para nós e responderam com toda força: “nós somos vocacionados. E vamos continuar pregando”. E, aí, eu lembrei de Jeremias quando tiraram ele de dentro do poço de lama e o sacudiram e perguntaram: “e agora, Jeremias?” Ele olhou nos olhos do seu algoz e bradou: “Assim diz o Senhor..”. E continuou a pregar.

Pr. Tavares levando ombro amigo a região pobre de Primeira Cruz | Foto: Divulgação.

L. LIVRENa sua visão, o que a igreja teria de fazer para que a obra missionária no Brasil e no mundo fosse mais efetivamente satisfatória? No sentido de que os missionários não passassem dificuldade no campo como o senhor vem passando ao longo do seu ministério?

PR. TAVARES — Precisamos ser mais específicos com relação a essa questão. Porque quando o senhor fala “no mundo”, o mundo, hoje, é ocidentalizado. E uma pequena parte que não é ocidentalizada, é radical. É intolerante do ponto de vista religioso. Então os países ocidentalizados, majoritariamente capitalistas, movidos por um processo de expansão universalista chamado globalização (que envolve sociedade, economia, política e cultura em nível mundial), acabam achatando todas as culturas. Inclusive a cultura religiosa. Nisso a igreja é achatada pela globalização. Nisso tem acontecido um movimento inverso, de fora para dentro da igreja. Jesus disse que a igreja tem que ser “sal” e “luz” do mundo e no mundo. Para que ela tempere e ilumine. Sal não é para salgar. É para temperar, ou seja, para dar aquele equilíbrio no sabor e ficar de bom gosto. E a luz não é para queimar ou encandear, mas para alumiar, tirar da escuridão. Só que, infelizmente, desde o pós-guerra, o cristianismo mergulhou, a partir dos Estados Unidos, numa crise sem precedente em que esse movimento passou a acontecer de forma contrária.

L. LIVRE — Como assim?

PR. TAVARES — Em vez de a igreja influenciar de dentro para fora, ela embarcou não foi numa canoa, mas num transatlântico sem leme, totalmente desgovernado, e desceu correnteza abaixo sem saber aonde vai ancorar. Hoje ela está mergulhada numa cultura capitalista, materialista, ocidentalizada, selvagem em que prevalece a lei do mais forte. Essa cultura veio para dentro das igrejas.

Pr. Tavares no sertão do Piauí, onde tem o menor IDH da América do Sul | Foto: Divulgação

L. LIVRE — O senhor pode explicar melhor isso?

PR. TAVARES — Existiu um culturalista, sociólogo, considerado um dos últimos pensadores de mentes mais férteis do século passado, que foi Zygmunt Bauman. Esse homem estudou profundamente a cultura urbana. Inclusive um dos livros dele chama-se Cultura mundo. Ele publicou quase uma centena de livros. E ele vai falar sobre uma sociedade líquida e modernidade líquida em que os relacionamentos são extremamente volúveis. Fazem-se e se desfazem com a mesma facilidade. Por isso a sociedade é líquida. Outra marca dessa sociedade líquida é que a cultura ocidentalizada, que entrou na igreja e aí essa igreja, em vez dela influenciar, ela passou a fazer parte desse sistema cruel e perverso. E aí a igreja institucional é extremamente perversa, desigual, desumana, arbitrária e até violenta. Prega e vive uma espiritualidade violenta. E eu vou lhe dar aqui um exemplo. Se você fosse hoje um governador, esquerda ou direita, não importa, e nunca foi crente. E eu sou crente há cinquenta anos. Mas se o presidente da minha denominação tivesse que escolher por cortar a cabeça entre mim que sou crente e a do governador que não é crente, ele ia optar pela minha. Ele prefere perseguir e matar o seu próprio irmão na fé. Por que?

L. LIVRE — Sim. E por que?

PR. TAVARES — Porque a igreja institucional foi engolida por esse sistema. E aí eu uso as palavras de Bauman que diz: “nesse sistema só vale quem consome e quem produz”. E para piorar, o ser humano vale menos que a banda de um frango. Porque se você for na cidade, você não vai ver um frango no meio da rua. Mesmo que seja uma banda. Mas você vai ver seres humanos na rua, jogados nas calçadas, mendigando, dormindo ao relento, pedindo esmolas e ninguém ligando para eles. Sabe por que? Porque uma banda de frango vale 20 reais e um ser humano não vale nada, inclusive para muitos crentes. E a igreja foi engolfada nesse pântano de materialismo injusto e impiedoso o qual Jesus rebateu o tempo todo. Enfim, a igreja institucional está operando o tempo todo contra o reino de Deus. Por isso ela está fazendo um papel inverso ao evangelho genuíno. Então, a igreja teria que parar e rever tudo outra vez, inclusive no que se refere à sua administração, justiça e unidade no corpo de Cristo. Alcançar o mundo para Cristo passa por essa reengenharia.

Pr. Tavares recolhendo donativos pra obra missionária | Foto: Divulgação

L. LIVRE
Com isso o senhor está dizendo que a igreja, mergulhada nessa sociedade líquida, está praticando um evangelho de injustiça, totalmente contrário ao evangelho da justiça, proposto, pregado, ensinado e vivido por Jesus no seu ministério terreno?

PR. TAVARES — Sim. Porém, quando nós falamos de igreja, que fique bem claro que me refiro à igreja institucional. Não à igreja corpo-espiritual, santa e fiel. A igreja pode ser entendida como instituição e como corpo de Cristo. Mas até a igreja enquanto corpo de Cristo também pode ser contaminada. Porque Jesus disse que o trigo cresce junto com o joio. A diferença é que a igreja corpo de Cristo tem o Espírito de Deus. Enquanto que a igreja institucional não tem o Espírito. Ela é como aquele esqueleto da visão de Ezequiel no capítulo 37. Estamos construindo templos luxuosos, mas vazios de Deus. Estamos construindo uma cultura de fossilização. Os líderes religiosos estão gastando milhões e milhões em dinheiro construindo templos pomposos, faustos, para deixarem para o Anticristo usar. Enquanto isso, estão negando o pão aos missionários que estão no campo sem comida, bebendo água barrenta, se enchendo de doenças e sem sequer uma bicicleta para andar.

Pr. Tavares levando apoio a missionários por meio do Ombro Amigo | Foto: Divulgação

L. LIVRE — Essa é a realidade que o senhor tem presenciado?

PR. TAVARES — Com certeza. Nas minhas andanças pelo sertão, tenho visto missionários morrendo de fome, comendo animais silvestres, com seus filhos sem estudar e fazendo sandálias de garrafa pet porque não recebem ajuda das suas igrejas para trabalhar na obra. Infelizmente, a igreja institucional se tornou tão perversa que vou revelar aqui um dado estatístico recente do Conselho Mundial de Missões da Inglaterra. O órgão diz que 87,88% dos recursos que sustentam aqueles que sofrem na obra missionária vêm dos aposentados e daqueles que vendem cheiro-verde e carvão nas feiras. Isso é uma vergonha muito grande. Isso mostra que a igreja institucional não está fazendo nada por missões. Fechou os olhos e cruzou os braços para missões. Está de mão encolhida. E praticando suas injustiças eclesiais. Até o ano 300 d.C., a igreja era perseguida. A partir daí, ela passou a ser perseguidora. Com o andamento da história, ela se constantinizou. E chegou a um momento em que de uma vez só ela matou mais de seiscentos mil mulçumanos. Tem pastor por aí ganhando mais de 400 mil reais de salário por mês. Sabe quem está pagando esse salário? Vendedores de bolo e de caranguejos. Eles são fiéis dizimistas e ofertantes. Enquanto isso, os grandes líderes estão se prostituindo com o poder político, o poder econômico, temporal e efêmero. É lamentável. Se, hoje, eu não tivesse feito uma decisão de natureza confessional e muito consciente, eu jamais entraria num templo denominado cristão.

L. LIVREO senhor tocou num ponto importante. Que são os altos salários de pastores e líderes de grandes igrejas e ministérios locais. Comparativamente, têm pastores ganhando mais de 300 mil reais por mês, como é o caso de um conhecido pastor do interior paraense. Enquanto há pastores e missionários sofrendo na obra sem ganhar nada, como é o seu caso e o caso de outros que não têm ganho fixo. Como o senhor vê essa desigualdade no meio de um povo que se diz de Deus e cristão, que era para fazer tudo diferente? Inclusive pagando bem os seus missionários para que eles pudessem andar melhor e ir mais longe na tarefa de evangelização?

PR. TAVARES — Eu vejo de duas maneiras. Antes quero destacar que não vejo com sentimento de revolta ou de ódio. Não. Longe de mim. Em primeiro lugar eu vejo com muita tristeza. Porque eu conheço o dia-a-dia dos missionários no campo. Apenas 2% ou 3% de missionários ganham acima de dois salários mínimos. A maioria ganha um salário mínimo. Pior: existem casos de missionários que, além de ganhar pouco, o dízimo dele é descontado na fonte. E isso é ilegal. É um confisco. Isso é apropriação indébita do alheio. Existem várias igrejas que fazem isso na surdina. E isso me dói. Me deixa triste. Mas não me enche de ódio. Por que? Porque eu tenho vida com Deus. A segunda forma de eu ver isto, é como cristão. E como cristão, eu consigo ver uma mudança. Mudança a partir de pessoas como o pastor Battista Soarez que eu o conheço há quase quarenta anos e sei da sua capacidade e da sua forma de pensar. A partir de pessoas como Rondaldo Almeida Lindório, um missiólogo conhecido mundialmente, mas um homem de uma humildade rara. E outros como um grande amigo meu, Flávio Paiva, que está na África com a família, morando no Senegal e já percorreu outros países da África. Então, existe sim uma possibilidade, ainda que remota, de a gente se juntar, fazer projetos, orar e se mobilizar efetivamente para fazer a coisa acontecer como a gente entende que Deus quer fazer. O importante é a gente não desanimar. E ficar longe daqueles que estão na igreja, mas vazios de Deus. Estão lá apenas sugando a igreja e botando o pé em cima daqueles que realmente têm Deus na vida e chamada divina. Mas estão neutralizados por líderes que há tempos perderam ou nunca tiveram a visão do reino. O certo é que é difícil fazer missões. É muito complexo ser missionário numa cultura em que o “ter” se sobrepõe ao “ser”, contrariando, aí, uma teologia de um homem que não foi um teólogo acadêmico, mas foi um erudito de mão cheia, que foi C. S. Lewis, autor de Cristianismo puro e simples.

Pr. Tavares com a esposa Eliene doando cesta básica a missionários | Foto: Divulgação

L. LIVRE — Sim. Verdade. E que não era pastor.

PR. TAVARES — Não era pastor. Mas trabalhou três ideias incríveis, que são a “ideia da rebelião”, a “ideia da graça” e a “ideia de Deus”. Ele baseou-se em três questões: quem é Deus?; o que é graça?; o que é rebelião? E quando ele fala de rebelião, ele começa por Adão e Eva. Os primeiros humanos que se rebelaram contra Deus porque confundiram o “ser” com o “ter”. Porque o diabo chegou de pronto e falou para eles: “vocês vão ter”. “Ser” eles já “eram”. Agora, eles estavam diante da proposta do “ter”. E é isso que enche e engorda os olhos da humanidade. E, nesse sentido, homens e mulheres vocacionados para missões estão sendo estigmatizados como mendigos. Alguém chega e pergunta: você é missionário? E você responde: sim, sou missionário. E aí logo você escuta: então você está fadado a ser mendigo. Eu, como pastor missionário, vivo de doações, embora seja obreiro de uma convenção rica. Não tenho salário. Agora imagine ter que dar assistência para mais de sessenta campos missionários sem ajuda financeira fixa, a mercê apenas de doações?! Não tenho nada.

Com a esposa Eliene em viagem missionária levando Ombro Amigo | Foto: Divulgação

L. LIVRE — Imagino a sua situação...

PR. TAVARES — Não tenho, sequer, nenhum jazido para ser enterrado. Se eu morresse hoje, não teria nenhum lugar para ser sepultado. Já fui executivo de três multinacionais. Tinha um bom salário e uma vida de regalias. Trabalhava muito. Mas ganhava bem. Me sentia até orgulhoso. Gostava da vida que tinha. Estaria sendo hipócrita se eu dissesse que não gostava da vida que levava. Mas nada se compara com o que sinto hoje, ao entrar numa canoa e pegar aquele ar puro e refrescante sobre as águas de um rio em direção ao campo missionário, levando ajuda aos missionários que vivem ganhando almas para Cristo sem praticamente nada, passando dificuldades com esposa e filhos, misturando lágrimas com farinha e peixe seco. Isto é o que eu vivo. Mas sou realizado do ponto de vista vocacional. Porém, sou entristecido em ver pessoas sofrendo no campo, enquanto outros na cidade, que se dizem crentes, no topo da pirâmide, estão reproduzindo modelos de tremenda desigualdade social. Não estou generalizando. Há pessoas boas, nesse meio, que eu conheço de perto, que contribuem com o reino, inclusive por meio de suas ideias, projetos e livros. Como já disse, Battista Soarez, Ronaldo Almeida Lindório, Wayne Cordeiro e outros bons autores, inclusive dos EUA, são homens de Deus que estão dentro da instituição, mas que ainda fazem a diferença. Por causa desses homens, a instituição, no seu todo, ainda não está podre. Aqui mesmo em São Luís têm homens de Deus que ainda têm o coração na obra, como, por exemplo, o pastor Wellington Garcez, um empresário que sempre me ajuda, pegando um pouco do seu salário e contribui com a obra missionária. E ainda disponibilizou as instalações da sua igreja para a nossa Agência Missionária Ombro Amigo.

Pr. Tavares e esposa navegam 7 horas para chegar a ilhas do Atlântico levando ombro amigo | Foto: Divulgação

L. LIVRE — O senhor já disse que não tem salário como pastor missionário. Como é dar assistência para mais de sessenta campos missionários no Brasil e exterior, recebendo apenas pequenas doações de amigos? Como funciona essa ajuda?

PR. TAVARES — Na verdade, no Brasil, são 79 casais de missionários que dou assistência. Fora do Brasil são 12 missionários. Como não tenho salário, as ajudas no exterior são feitas de forma remota. Por meio de doações. À distância. No Brasil, eu vou pessoalmente. Mas todo mês Deus usa pessoas para ajudar. Como eu disse, têm pessoas que me ajudam dentro da sua possibilidade. Como o senhor, por exemplo, que me deu ajuda ontem. Mas eu sei que o senhor também não tem, a não ser a sensibilidade de contribuir na medida em que pode. Tem outros pastores que também me dão alguma coisa. Mas eu e minha esposa precisamos comer todo dia. Tenho contas a pagar. Mas ajuda mesmo da igreja ou da convenção eu não tenho. Nenhum centavo.

Caixas de alimentos são levadas a missionários em regiões sem água e luz | Foto: Divulgação

L. LIVRE — No âmbito do ministério cristão, há muitas pessoas em crise em relação ao seu chamado. Como o senhor vê essa questão vocacional hoje em dia?

PR. TAVARES — O senhor usou uma expressão que tem se tornado comum e que, no entanto, é um conceito que precisa ser revisto. A palavra “chamado”. Eu lembro de Sophie Muller, uma missionária colombiana radicada nos EUA, que no final dos anos 1940 e 1950 trabalhou com povos indígenas no extremo norte do Amazonas. Ela chegou a traduzir para a língua indígena praticamente todo o Novo Testamento. Essa mulher fez um trabalho extraordinário. Plantou igrejas, sozinha. Aprendeu a língua dos indígenas. Era uma mulher que não tinha um metro e meio de altura. Aquela mulher levantava às quatro horas da manhã e, junto com os índios numa canoa, saia visitando os lugares ribeirinhos. Porque para que você possa fazer uma tradução bíblica mais ou menos próxima da realidade nativa, é preciso que você esteja inserido no contexto daquela realidade. E quatro horas da manhã ela estava numa canoa traduzindo os textos bíblicos. E o indígena que estava remando a canoa dizia-lhe: “missionária, eu não estou aguentando mais”. E ela respondia: “calma, ainda faltam dois versículos”. Depois ela voltou para os Estados Unidos e a imprensa americana ficou encantada com o trabalho que ela fez. E um dia os jornalistas lhe perguntaram: “missionária, qual o segredo do seu chamado?” E ela, então, respondeu: “Eu? Eu não recebi chamado”. E aí eles perguntaram novamente: “e como se explica esse fenômeno na sua vida, em fazer um trabalho maravilhoso como esse, de plantio de igrejas no Brasil?”. Ela respondeu: “Eu recebi uma ordem. E eu apenas obedeci”. Então, a explicação é esta: o chamado é uma ordem. Quem decide amar a Deus, obedece.

Região de Caité | Foto: Divulgação

L. LIVRE — O senhor é mestre em antropologia missionária. Tem dois doutorados. Um em teologia cristã. E outro em educação teológica. Com toda essa bagagem, como o senhor analisa o quesito “identidade cristã”?

PR. TAVARESO verdadeiro cristão, o cristão autêntico, não tem escolha em relação ao que Deus estabeleceu para ele. A gente se baseia tanto no Antigo Testamento quanto no Novo Testamento. Então, a identidade cristã tem sido solapada, principalmente nos Estados Unidos, por aquilo que chamamos de “pós-cristianismo”. E isso tem um reflexo direto na obra missionária. Principalmente do ponto de vista transcultural. Para você ter uma ideia, no Brasil, nós estamos patinando como um carro atolado, sem sair do lugar. Agora em 2022, faz vinte anos que não conseguimos enviar seis mil missionários por ano para o campo transcultural. Ou seja, isso representa, se comparado com a quantidade de cristãos nominais, um avanço minimamente nanico. Quando o Brasil se arvora dizendo que tem mais de 50 milhões de evangélicos, se você pegar esse número e fizer uma correlação com o número de enviados vocacionados para o campo missionário transcultural, isso representa 0,001%. É como se você dividisse um em seis. E a sexta parte dessa quantidade não chega a ser uma coisa diabólica, mas é algo inócuo do ponto de vista missionário.

L. LIVRE — Nossa, Deus! Sem exagero, pastor?

PR. TAVARES — Sim. Sem nenhum exagero. Totalmente sem consistência. Quer dizer, a qualidade de evangélicos que existe no Brasil e na América Latina, e até nos EUA, é inversamente proporcional à quantidade de missionários enviados para o campo. E isso está intimamente relacionado com a identidade cristã. Por exemplo, a Universidade Mackenzie, uma das maiores de São Paulo, onde tem a maior biblioteca da América Latina, é uma instituição cristã. Mas, infelizmente, está caminhando para o secularismo. A maioria dos jovens que estudam na Mackenzie, na faixa etária entre 18 a 27 anos, é formada por ateus. Não creem em Deus. São jovens da área de ciências e tecnologias influenciados por pensamentos não-cristãos. A culpa não está nos missionários que fundaram a instituição. Isso é uma avalanche. É uma tendência cultural moderna no contexto das tecnologias da informação, como teorias, internet, ideologias etc. E só quem pode frear isso é o Espírito Santo por meio de pessoas vocacionadas. David Levingstone, missionário escocês entre as tribos africanas, passou 40 anos servindo a Deus na obra missionária. Um dia ele morreu. Os estrangeiros foram buscar seu corpo. Mas se depararam com uma situação inusitada. Um nativo pegou uma espada e abriu o peito de Levingstone, arrancou-lhe o coração e disse: “O corpo pode ser escocês. Mas o coração é africano”. Cavou um buraco e enterrou o coração do missionário ali mesmo, no meio das tribos, em pleno solo africano. Tempos depois, passaram uns missionários por aquela região e perguntaram aos nativos se eles conheciam a Cristo. E olha o que eles responderam: “Nós conhecemos um Cristo que passou por aqui. Só que o nome dele não era Cristo. Era David Levingstone”. Isto é identidade cristã. Se identificar com Cristo é ser parecido com Ele.

Em região carente de Sucupira do Riachão | Foto: Divulgação

L. LIVRE — Incrível isso. Mas quero insistir numa coisa. Sobre o seu sustento missionário. De quanto o senhor precisaria, hoje, para sobreviver nas suas ações missionárias? E deixar de andar a pé, como o mesmo senhor disse, por até 200 quilômetros fazendo a obra missionária, por meio do Projeto Ombro Amigo?

PR. TAVARES — Eu necessitaria de oito salários mínimos por mês. Com esse dinheiro, eu conseguiria por gasolina no carro e comer durante as viagens. Coisa que dezesseis congregações, por exemplo, resolveriam se cada uma delas se dispusesse a dar uma oferta de meio salário por mês. O que é tão pouco. Não seria por amor a mim. Seria por amor à obra de Deus. Com oito salários eu viveria com o mínimo de dignidade. Sem ter que andar a pé ou de bicicleta, porque é muito perigoso. E a pé é muito dolorido. Eu já estourei unhas. Já teve vez que eu tive de tirar o sapato porque a unha estava pretinha de sangue de tanto eu andar a pé. Uma vez eu caminhei quase 70 quilômetros num dia só. Então, eu entendo, hoje, que precisaria de um valor que fosse suficiente para colocar gasolina no meu carro, pagar a prestação dele e manter a minha família com o básico. Nem plano de saúde eu teria. Mas oito salários mínimos por mês daria para eu viver com o mínimo de dignidade.

L. LIVRE — E dignidade, em matéria de obra missionária, é uma palavra que parece estar sendo totalmente relativizada ou até mesmo ignorada pela igreja instituição atualmente. É isso?

PR. TAVARES — Exatamente. O campo missionário sofre, atualmente, uma tremenda injustiça. Almas estão morrendo sem salvação, e os missionários estão passando fome e morrendo junto com elas. Tem missionário cujos filhos não conseguem nem estudar. Enquanto isso, pastores e líderes de grandes igrejas desfilam na frente da gente com carros caros e recebendo salários altíssimos, sem nenhum peso de consciência.

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Para quem desejar contribuir com o Projeto Ombro Amigo, o celular/WhatsApp do pastor Tavares é (98) 9 8448 5839.

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– Fim –

segunda-feira, 2 de maio de 2022

POLÍTICA: JOSIMAR MARANHÃOZINHO É ALVO DE PERSEGUIÇÃO POLÍTICA

ELEIÇÕES 2022

Crescimento político de Josimar Maranhãozinho incomoda opositores. Deputado sofre ameaça de cassação
Mais uma vez o parlamentar é alvo de operações da PF, acusado de desvio de recursos de emendas parlamentares. Quem está por trás disso?

 Por Battista Soarez e Roney Costa

Dep. Josimar Maranhãozinho sofre ameaça de cassação | Fotos: Divulgação/Internet


O DEPUTADO FEDERAL LICENCIADO Josimar Maranhãozinho (PL-MA) vem cada vez mais crescendo no cenário político maranhense e, com isso, despertando as arestas peçonhentas dos invejosos de plantão. Em 17 de abril o parlamentar pediu licença da Câmara dos Deputados por um período de 120 dias para tratar de assunto particular. Enquanto isso, os opositores maquinam sua desestabilização política. A intenção dos tramoiadores é cassar o mandato do deputado.

Comandada pelo deputado Paulo Azi (União Brasil-BA), atual presidente do Conselho de Ética da Câmara Federal, a representação, segundo especulação de políticos da própria direita, está sendo provocada por deputados do Maranhão que estão interessados na queda do parlamentar. A maranha contra Josimar já vem se desenrolando desde que o presidente do Partido Liberal no Maranhão começou a crescer politicamente no estado e, então, passou a ser um forte nome para concorrer como candidato a governador.

Logo os opositores, se contorcendo de inveja, passaram a perseguir o deputado na tentativa de impedir sua ascensão política. A acusação é de que Josimar é suspeito de desviar recursos da Saúde viabilizados por meio de emendas parlamentares em cidades do Maranhão. Josimar tem alguns inimigos políticos dentro do próprio grupo de direita, como é de praxe, sendo um deles o também deputado federal Aluísio Mendes (PSC-MA), que, inclusive, já tentou tomar o PL de Josimar.

Dep. Aluísio Mendes, ligado à Polícia Federal, é inimigo de Josimar


O parlamentar é acusado de ter destinado emendas no valor de R$ 35 milhões para seus redutos políticos. E apenas isso. O problema dos invejosos é que Josimar se declarou pré-candidato ao governo do Maranhão. Por ser o deputado federal que mais trabalha no estado, despertou medo nos opositores e invejosos, o que vem indignando a população maranhense, principalmente nos municípios que recebem beneficiamento e melhorias estruturais por meio das emendas parlamentares que para eles são destinadas. A intenção perniciosa dos inimigos de Maranhãozinho é desgastar a imagem do político perante a opinião pública.

Mas o que são emendas parlamentares? De acordo com a Constituição Federal, a emenda parlamentar é o instrumento que o Congresso Nacional possui para participar da elaboração do orçamento anual quanto à sua destinação para as políticas públicas. Ou seja, é a oportunidade que os deputados têm de acrescentarem novas programações orçamentárias com o objetivo de atender as demandas das comunidades que os elegeram as quais eles representam. É o chamado reduto político.

E, portanto, é por meio das emendas que deputados federais podem influenciar no que o dinheiro público será gasto. No Brasil, quem elabora o orçamento — documento que define quanto dinheiro o governo pretende arrecadar e gastar durante o ano — é o Poder Executivo, isto é, presidente da República, governadores e prefeitos.

Por isso, a participação direta dos parlamentares nessas decisões é feita por meio de emendas. Logo, não há nada de errado com o deputado Josimar Maranhãozinho. Ao destinar uma emenda para seu reduto político, ele apenas está fazendo o que manda a Constituição Federal.

O que são as emendas individuais? As emendas individuais são propostas feitas por cada deputado federal ou senador para o orçamento do governo federal. Assim, cada parlamentar pode financiar uma obra ou um projeto público no seu estado. Eles podem, por exemplo, financiar a compra de mais ambulâncias. O mais comum é que as emendas beneficiem as bases eleitorais dos parlamentares, ou seja, a localidade onde vivem os eleitores que eles representam. Isso é plenamente normal.

No lugar de Josimar Maranhãozinho assumiu o seu suplente Paulo Marinho Júnior. Marinho Júnior renunciou ao mandato de vice-prefeito de Caxias para assumir a vaga na Câmara Federal. Nos bastidores da política, comenta-se que há conluio dentro da própria direita para desestabilizar e derrubar Josimar. Há alguém interessado em tomar a liderança política que Josimar tem no Maranhão. Aliás, o parlamentar não tem somente liderança. Ele também agrega competência e estrutura de trabalho no cenário maranhense. “O que eu sei é trabalhar”, afirma o parlamentar.

No início de março, Josimar Maranhãozinho foi alvo de uma nova operação da Polícia Federal. Provocados por políticos da própria direita, policiais federais fizeram uma ação de busca e apreensão na residência do parlamentar, acusando-o de desvio de recursos públicos por meio de empresas de fachada. A ação nociva dos inimigos de Josimar inclui até compra de matérias jornalísticas para serem veiculadas na imprensa nacional como Rede Globo e em blogs, que costumam cobrar por veiculação de reportagens investigativas.

Para o próprio Josimar, as operações, no mínimo funestas, têm relação direta com a sua pré-candidatura ao Governo do Estado e ao seu desempenho na articulação política no Maranhão. O que, de fato, procede haja vista que o parlamentar sabe administrar bem seu mandato e lidera a construção de um grupo que integra dezenas de prefeitos e deputados estaduais.

As perseguições investigativas que estão sendo protagonizadas por políticos nocivos podem levar Josimar a não concorrer mais ao governo do estado. Porque os velhacos — que nunca conseguiram trabalhar pelo desenvolvimento do Maranhão — sabem que se Josimar assumir o governo o crescimento do estado será alavancado em matéria de infraestrutura, educação, saúde e principalmente agricultura.

Na semana passada, o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), em articulação com outros políticos de interesses espúrios, decidiu dar andamento em pedidos de quebra de decoro contra alguns deputados federais, dentre eles Josimar Maranhãozinho. A falta de lisura nesses “trabalhos” da Câmara Federal já começa chamar a atenção por um detalhe: só acontecem em período de eleições. Todo ano é a mesma coisa. E mais: geralmente o alvo dessas tramóias são políticos de maior visibilidade por conta do seu crescimento.

Por outro lado, além da direita não ser coesa, todos os políticos que dão apoio ao presidente Jair Bolsonaro vêm sofrendo ataques à sua imagem pública. Maranhãozinho é presidente estadual do PL no Maranhão, partido que filiou no mês passado o presidente Jair Bolsonaro e seu filho mais velho, o senador Flávio Bolsonaro. E isso já explica o por que da perseguição. O Leitura Livre, em parceria com o Blog Roney Costa, está acompanhando os detalhes dos fatos e trabalhando em favor da verdadeira justiça, seja em relação a pessoas públicas ou o cidadão comum.

segunda-feira, 18 de abril de 2022

Conto: NO SILÊNCIO DA NOITE CAMPESTRE | Por Battista Soarez

SÉRIE: Contos e Memórias

No silêncio da noite campestre
Eles perderam a inocência
(Conto terapêutico. Baseado em fatos reais*)

 

Battista Soarez | Segunda-feira 18/04/2022, 21h31
(Escritor, jornalista, poeta e psicoterapeuta)

 

FOTO: Divulgação/Internet | Imagem meramente ilustrativa.

O SOL SE ESCONDEU por trás das palmeiras do babaçual, numa despedida de fim de tarde simplesmente límpida e primorosa. Os raios, levemente refletindo na superfície convexa das árvores frondosas, beijaram as folhagens na copa da vegetação do pequeno lugarejo Chapadinha, área campestre de Santa Helena, município encravado na baixada maranhense. A região era de grande biodiversidade, com abundância de rios, lagos, lagoas e igarapés. O dia então mergulhou na escuridão do início da noite e dois fachos de luz mostravam a estrada vicinal. Os faróis penetrantes de um automóvel Fusca abriam caminho pelo negrume implacável da zona rural de Santa Helena. O ano de 1976 corria normalmente.

Lentamente, o carro que levava Luiz e Inês roncava pela estrada estreita, um trecho vicinal sem qualquer iluminação, onde só as estrelas e a lua brilhavam no céu noturno. Os grilos orquestravam uma musicalidade estridente, enquanto as corujas externavam um mau presságio com o seu canto lúgubre, esquisito. Mas nada disso incomodava, nenhum pouco, o casal de namorados. Eram dois adolescentes apaixonados. Simplesmente. E apenas isso.

Para o seu encontro com Inês, Luiz pegara o carro do seu pai. Na verdade, da família. Era um Fusca 1974, com para-choques de flandres, um enfeite exposado no capô, para-lamas avantajados e um banco traseiro razoavelmente confortável, para aquela época. Eles passaram por pequenos campos de bola e outros cultivados, recortados no meio daquelas campinas de capim baixo, onde os animais catavam suas pastagens. Luiz e Inês quase não saíam com os amigos da mesma idade. Passavam o dia inteiro se enamorando. Às vezes, iam às festas dançantes da comunidade e, por vezes, a aniversários de amigos. Nos bailes interioranos, as melodias e as danças eram embaladas por músicas românticas de muito sucesso na época, como Carlos Alexandre, Amado Batista, Roberto Carlos, Bartô Galeno e outros. Isso era o que aliviava o tédio do árduo trabalho manual das roças de arroz, milho, feijão e mandioca.

Não tinham muitos noticiários. A televisão ainda era um aparelho caro. Não era qualquer um que podia comprá-lo. Alguns vizinhos mais afortunados aquisitivamente tinham o privilégio de se interconectarem ao mundo com imagens ainda em preto e branco. Muitos orgulhavam-se de terem um rádio de pilha. Era o meio de comunicação mais acessível naqueles tempos. Lamparinas, abastecidas com querosene, iluminavam as casas. As crianças se divertiam com brincadeiras de roda. Os adultos jogavam baralho e dominó. Eram estas as diversões prediletas em tempo de folga como, por exemplo, nos finais de semana e feriados.

FOTO: Divulgação/Internet | Imagem meramente ilustrativa

Antes de voltar para casa, Luiz desviou o Fusca para fora da estrada e apagou as luzes. O barulho dos pneus, pressionando o cascalho, de repente parou e seguiu-se um silêncio palpável. Os grilos continuavam soltando sua estridulação num silêncio afável daquela noite de um dia qualquer de setembro. Aconchegados um no outro, Inês e seu namorado estacionaram numa área isolada, onde não podiam ser vistos. No acento dianteiro do carro, Luiz acariciou algumas partes do corpo de Inês. Ela, numa calma libidinosa, lânguida, aceitava cada carícia delicadamente. O rapaz abriu a blusa de Inês e a atirou sobre o câmbio do veículo. Tirou-lhe a saia e pressionou seu corpo contra a pele prontamente deleitosa da jovem.

De maneira voluptuosa, Luiz encostou a boca na orelha de Inês e, com a ponta da língua umedecida, lambiscou levemente no orifício do seu ouvido. A garota sentiu um arrepio estranho, intensamente ardente, enérgico, emocionante. Isso percorreu todo o seu corpo. Algo eletrizante a deixou quase extasiada. Sem querer, ela soltou um gemido ofegante. Não se mexeu. Não resistiu. Apenas se encolheu. Como num ato de calafrio. Afastou um pouco a cabeça para trás. E apenas ficou olhando para ele com um feitio arrebatante, uma feição de espanto. Penetrou o brilho do seu olhar lascivo nos olhos de Luiz, como um felino fixa sua vítima. Não que o namorado de Inês fosse sua vítima. Não é isso. É que ela, totalmente inebriada e preenchida de prazer, o olhava com intenso desejo.

Aí, meu Deus! Não sou de ferro — pensou ela. — Sempre imaginei em me  casar virgem, mas.....

Num repente mágico, apoiou as duas mãos por trás da cabeça do rapaz e puxou o rosto dele para si. E, como que num surto alucinante, enfiou meio palmo de língua totalmente salivizada dentro da boca do jovem que, àquela altura, já estava com os hormônios testosteronas à flor da pele.

Luiz deixou-se levar, naturalmente, pelo clima do momento e pulou, de maneira rápida, para o banco traseiro do carro, puxando, logo em seguida, o corpo da garota para junto do seu. Inês nunca havia visto um pênis antes. Exceto quando a sua mãe trocava a fralda de seu irmão bebê. Ela olhou mais firme para Luiz. Desceu o foco do seu olhar para baixo, fixando aquele instrumento totalmente ereto dando guinadas como se quisesse saltar para uma disputa de corrida. A moça sentiu um frio na barriga, seguido de uma sensação que nunca havia sentido antes.

— Te quero toda — sussurrou Luiz.

Inês correspondeu apenas com um fungado deleitante, soltando um gemido leve e obedecendo, como uma cordeirinha domada, todos os comandos intensamente emotivos do namorado. Inês estava próximo de fazer 16 anos. Luiz tinha 17. Ele passou a acariciá-la impetuosamente. Ajeitou-a sobre seu corpo e aplumou sua ereção na genitália úmida dela. Tudo com jeitinho, sem querer machucá-la. Apenas equilibrou bem as mãos apoiadas nas duas partes carnudas do seu traseiro e ficou “brincando” de mexer cuidadosamente, sem forçar nada. A virgindade de Inês, já perto de completar 16 aninhos, estava selada por um hímen que, honestamente, nunca tinha sido tocado antes, a não ser pelos seus próprios dedos quando para lavar as partes íntimas ou para segurar o papel higiênico após fazer xixi.

— Calma — implorou Inês, numa espécie de soluço contido.

— Terei todo cuidado. Eu sei que dói — prometeu Luiz pela terceira vez.

A garota, com a progesterona totalmente aflorada, já não conseguia se controlar. Ela mesma, num surto de prazer intenso, decidiu pressionar, com força, a sua intimidade contra a de Luiz, como numa atitude alucinante de auto-estupro.

— Aaaaiiii! — um longo gemido de Inês saiu pelas janelas do carro, misturando-se com os estrídulos dos gritos no meio do mato.

Misturaram-se dor e prazer. Inês segurou firme, sentindo-se uma mulher de verdade. Adulta e suficientemente pronta para viver sua liberdade sexual. Naquela noite, quer dizer, naquele momento efêmero e prazenteiro, Inês foi apresentada aos mistérios da intimidade humana, enquanto a lucidez da razão deu lugar absoluto ao devaneio lírico do prazer.

— Eu não sabia nadica de nada — disse ela muito tempo depois, quando já estava morando em Santa Helena. — Apenas me deixei ser totalmente dominada pela intensidade daquele desejo ardentemente prazeroso. É impossível esquecer.

Mais tarde, já convertida na igreja evangélica, Inês aprendeu que sexo, apesar de intensamente prazeroso, é pecado. Algo muito distante daquelas emocionantes histórias românticas que vivera e que lhe levaram às loucuras. Como nos contos de fadas, que ela via nos filmes de cinema sobre as histórias que aconteciam antes da Segunda Guerra Mundial.

Como muitas mulheres de sua geração, Inês também aprendeu que o sexo era, quando muito, uma tarefa ingrata. Que era melhor deixar circunscrita aos limites do casamento e da criação de uma família. Anos mais tarde — já morando em Santa Helena, para onde ela se mudou no início dos anos 1990 — Inês iria se referir a Luiz, sem citar seu nome, apenas como “o menino com quem perdi a virgindade, meu primeiro namorado”. Algo que, nela ou para ela, ficou apenas nas lembranças. Luiz foi embora para o garimpo ainda na década de 1980 e nunca mais voltou. Razão que, mais tarde, levou Inês a procurar os serviços de um psicoterapeuta.

Inês ocultou a identidade do rapaz, assim como escondeu todas as verdades desagradáveis a respeito da própria vida. Toda memória de amor que lhe houvesse causado frustração. Como admitiu décadas mais tarde.

— Nunca me casei porque nunca encontrei um homem que eu realmente amasse — desabafou ela certo dia no consultório. — Vejo muitas de minhas amigas que são casadas com homens que elas não amam. Geralmente amam o primeiro homem da sua vida. Agora, apenas emprestam o seu corpo para o homem com quem elas, hoje, são casadas, para fazer sexo e gerarem filhos. Mas o coração está lá no passado, em alguém que um dia realmente as fez felizes.

Ainda hoje, Inês diz isso porque nunca se esqueceu de Luiz. Ou daquela noite no povoado de Chapadinha, zona rural de Santa Helena, quando os dois adolescentes perderam sua inocência.

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* Atenção!
Esta história é baseada em fatos reais. Os nomes dos personagens, no entanto, são totalmente fictícios para preservar a identidade das pessoas. Portanto, qualquer semelhança de nomes é mera coincidência.