Estatuto e família (I)
Presidente do
Instituto Brasileiro de Direito da Família (IBDFam) diz que Estatuto é heresia
jurídica
Por BATTISTA SOAREZ
A
edição de nº 2395 da revista Istoé, de 28 de outubro de 2015,
publicou uma entrevista com o especialista em direito da família Rodrigo da
Cunha Pereira, na qual o jurista critica o texto do Estatuto da Família, aprovado
por comissão especial na Câmara Federal. Presidente do Instituto Brasileiro de
Direito da Família (IBDFam), Pereira diz que o Estatuto é um retrocesso e que o
seu conteúdo é fruto de um Congresso
[Nacional] que coloca princípios religiosos à frente das necessidades sociais
do País. Ele não vê que, sem a interveniência do sagrado, a sociedade estaria
pior. Ai do mundo, não fosse a presença da igreja nele, mesmo com todos os
problemas que ela tem.
RODRIGO DA CUNHA PEREIRA critica Estatuto da Família |
Na
entrevista, alguns pontos colocados por Rodrigo Pereira atingem diretamente o
espírito moral e ético da família brasileira que, nos últimos tempos, vem sendo
atacada por novos conceitos filosóficos, psicológicos e sociológicos que têm colocado
os distúrbios sociais modernistas acima do equilíbrio estrutural familiar e dos
princípios que norteiam a paz social no mundo. Rodrigo da Cunha Pereira é
doutor em direito da família, mas não aprendeu, ainda, que se a sociedade está um
caos, em termos estruturais, é devido à desorganização familiar e ao total
desrespeito que instituições sociais, governo e autoridades intelectuais têm
demandado a ela.
Segundo
ele, o Estatuto da Família, além de retrocesso, é uma heresia jurídica, ou
seja, uma típica espécie de pregoeiro da família tradicional. O jurista é a
favor da nova tendência dos valores familiares em que há uma dialógica sem
lógica e uma dialética sem ética, numa transitoriedade social sem nenhum
controle no comportamento das pessoas. “Hoje temos novas formatações de família
que eram inimagináveis no passado — diz ele. — E isso não afeta o restante da sociedade”. Pode
não afetar na linha do raciocínio dele e de outros que pensam da mesma maneira,
mas cria conflitos sociais severos e distúrbios estruturais irreparáveis. Um
deles é a desestabilidade na estrutura psicológica das pessoas, inclusive de
crianças, jovens e adolescentes.
E,
por conseguinte, ele questiona: “Por que essa necessidade de determinar que uma
família deva ser formada por um homem e uma mulher?”, concluindo que isso só se
justifica em um “Congresso moralista, que se baseia em princípios religiosos quando
o Estado é laico”. Só para o leitor se situar, “laico” é aquilo que é próprio
do mundo, do secular e que se coloca em oposição aos valores sagrados.
Significa que as pessoas, no mundo, devem viver a seu bel prazer. Os
ensinamentos de Deus não devem ser levados em conta. Este é o posicionamento ideológico
de alguém que, diga-se de passagem, é especialista em questões de família. E a
mídia divulga isto amplamente.
Agora,
imaginemos se toda a sociedade pensasse dessa maneira? Como não estaria o
mundo? Com a legalização do divórcio (em 1970), a cultura familiar ganhou novos
rumos. Com as novas leis, da década de 1980 para cá, aumentaram alarmantemente
o desrespeito aos princípios familiares, a desarmonia social, a ganância pelo
poder, a indisciplina no comportamento das pessoas, o desrespeito aos direitos
do próximo, a falta de limites, a quebra nas relações humanas e, consequentemente, a criminalidade.
Pereira
defende as uniões homoafetivas e lembra, na entrevista, que o Supremo Tribunal
Federal (STF) já reconhece isso. Reclama que o texto do Estatuto da Família,
caso seja aprovado, todos os casamentos homoafetivos serão anulados, o que,
para ele, é um retrocesso.
Mas
é bom lembrar que o que está sendo chamado de “casamento” entre homossexuais é apenas
um contrato social que, no direito romano, civil, visa direitos patrimoniais.
Significa que duas pessoas que moram juntas, trabalham e constroem um
patrimônio conjuntamente, independente de terem relações afetivas ou não.
Independente de ser um homem com uma mulher, uma mulher com outra mulher ou um
homem com outro homem. O que está em jogo não é a relação afetiva ou conjugal,
e sim o fruto do trabalho dos dois, isto é, o patrimônio construído pelas duas
pessoas que moram juntas. Esse patrimônio tem de ser dividido entre os dois. É
como numa sociedade empresarial: os sócios da empresa, por uma questão de
justiça humana, dividem os direitos construídos conjuntamente. Ou seja, dividem
o patrimônio que, ao longo do tempo, foi sendo construído.
O
que ocorre é que as autoridades estão confundindo valores espirituais,
matrimoniais e emocionais, com valores sociais e patrimoniais. Sociedade
conjugal e/ou matrimonial só é celebrada entre homem e mulher. A palavra “matrimônio”
(que vem da língua latina “matrimoniu”)
significa literalmente “união legítima de homem com mulher”. Vem de “matri” ou “mátrio”, que quer dizer “mãe”, alguém que tem uma madre, isto é, a
capacidade de gerar e procriar, fazendo com que a humanidade se multiplique. O
conceito etimológico se refere à superioridade “matriarcal” em relação à
inferioridade do homem. Logo, a palavra “matrimônio” está diretamente ligada ao
ser “matri”, isto é, ao ser feminino dotado de uma “madre”. Se refere, pois,
definitivamente à mulher.
Logo,
o contrato social entre homoafetivos não tem valor matrimonial e, sim,
patrimonial. Ambos são direitos sociais, mas cada um dentro da sua natureza
jurídica, cultural, social e civilizatória.
(Continua na próxima
edição...)
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