E N T R
E V I S T A: José Benedito Alves de Oliveira
Presidente de nova associação de pastores no
Maranhão, pastor Zezinho fala sobre
a necessidade de a igreja evangélica brasileira se unir para viver novo projeto
de espiritualidade
Por Battista Soarez
(De São Luís – MA)
Pr. José Benedito, presidente da associação de pastores AMOEMA |
O pastor assembleiano José Benedito Alves de Oliveira, 61 anos, tem uma longa página de experiência como ministro do evangelho. Casado com a pastora Vilma de Oliveira, pai de dois filhos (um casal) e avô de um neto de dois anos, pastor Zezinho, como é conhecido, tem 34 anos de pastorado e há mais de vinte é líder da Assembleia de Deus Cristo para as Nações e, ainda, é presidente de uma convenção. Com tanta experiência cuidando de ovelhas e pastores, ele acaba de assumir mais uma responsabilidade: a presidência da AMOEMA (Associação de Ministros e Obreiros Evangélicos no Maranhão), que já está tendo a aderência de centenas de líderes que comungam a mesma fé. “A ideia de criar a AMOEMA nasceu no período da pandemia, em que pastores, principalmente da periferia, eram barrados de fazer culto nas suas igrejas e impedidos de participar de reuniões com o governo, simplesmente porque não tinham quem os representasse”, diz ele. Antes, ele era o segundo tesoureiro da AME, outra associação de ministros evangélicos que, depois da morte de José Carlos Castelo Branco, seu principal fundador, entrou em colapso e se apagou. Hoje, domingo, 25 de abril de 2021, o Leitura Livre esteve na casa do pastor Zezinho onde, durante o almoço, concedeu a entrevista que você vai ler a seguir.
LEITURA LIVRE — Por que criar a AMOEMA?... Se já tinha a AME como associação de pastores evangélicos no Maranhão? O que aconteceu que a AME não decolou?
PR. ZEZINHO — Quando criamos a AME, ela veio com uma grande visão: juntar todos os pastores e líderes de todas as igrejas evangélicas no estado do Maranhão. Esse era um sonho do presbítero José Carlos Castelo Branco, da Igreja Cristã Maranata em São Luís, e que se tornou realidade. Naquele momento, todas as lideranças acharam por bem escolher uma pessoa que não fosse pastor. E o escolhido foi exatamente o próprio Zé Carlos, que era dono do restaurante Cheiro Verde. Durante a gestão do Zé Carlos, todos os pastores se empenharam e, aí, a AME tornou-se realmente uma grande realidade. Fizemos grandes encontros. Boas articulações nas relações sociais e até na política do Maranhão. Pastores batistas, presbiterianos, assembleianos, quadrangulares e as lideranças evangélicas, em geral, como, por exemplo, da CEADEMA, na pessoa do pastor Coutinho, pastor Pedro Damasceno e outros, se fizeram presentes dando apoio de maneira significativa e bastante valiosa. Mas, infelizmente, com a morte de Zé Carlos, a AME perdeu toda a sua força. Naquele momento, o vice-presidente era o apóstolo José de Jesus, da Igreja Batista. Então, naturalmente, seria ele quem devia assumir a presidência da AME, convocando todos os pastores para formar uma nova diretoria. Mas não foi assim que aconteceu. O pastor Aranha, que era o secretário da AME, fez uma reunião sem nenhuma convocação técnica. De posse da documentação, por ser o secretário, ele chamou meia dúzia de pastores e formou uma diretoria. E essa diretoria não funcionou. A partir dali, a AME deixou de ser aquela organização atrativa como vinha sendo ao longo de sua existência. Daí a AME nunca mais cumpriu o seu papel para o qual ela foi criada. Ganhou outros rumos e passou a caminhar no anonimato.
Pr. Zezinho e esposa, Pra. Vilma de Oliveira |
L. LIVRE — Em algum momento, após a morte de José Carlos Castelo Branco, o pastor Francisco Aranha procurou o senhor para falar sobre a possibilidade de reimpulsionar a AME?
PR. ZEZINHO — Não. Aranha nunca me procurou para falar a respeito disso. Mas, por meio de comentários, fiquei sabendo que ele queria entregar a AME para mim. Sabendo disso, fui até à residência dele e falei para ele sobre essa questão. E quando falei com ele, no primeiro momento, ele demonstrou interesse de me repassar a AME. Mas, numa segunda reunião em que estive com ele, aí já percebi que ele não tinha mais interesse de entregar a instituição. Foi aí que assimilei a necessidade urgente de criar outra instituição, no modelo da AME, que pudesse funcionar realmente como associação cristã dentro dos princípios do evangelho de Jesus.
L. LIVRE — Isso, então, é o que justifica a criação da AMOEMA? Como ela nasceu?
PR. ZEZINHO — A ideia de criação da AMOEMA nasce exatamente no momento da pandemia em que os pastores, principalmente os da periferia, eram barrados perante a instituição Estado. As políticas de funcionamento eram direcionadas para atacar as igrejas como se as igrejas fossem inimigas do Estado. E não são. O governo precisa entender que somos parte das ações políticas públicas e sociais, independente da nossa fé. Pregamos e educamos o povo nos caminhos do Deus da justiça, o Todo Poderoso, Criador dos céus e da terra e de tudo o que neles há. Ajudamos a socializar e ressocializar pessoas. Fazendo isso, estamos contribuindo com o governo a ter menos problemas e, consequentemente, menos gastos com políticas de combate à violência, à fome e à miséria. A igreja é muito consciente e justa no que ela faz. Ensinamos o correto caminho aos indivíduos a respeito de como se tornar cidadãos de bem. Então, a igreja e o Estado são parceiros. Não inimigos. Não entender isso é falta de inteligência social e, também, é não querer o bem da sociedade. Além do mais, somos contribuintes. Milhares de contribuintes. Portanto, diante das ações contra a igreja, os pastores ficaram preocupados. Inclusive, nas reuniões com o governo, os pastores, como embaixadores do Deus Criador e Dono do universo, não tinham representantes e, por isso, não eram convocados. Então, nesse momento, eu me preocupei junto com eles e procurei algumas lideranças como, por exemplo, o pastor André Souza, presidente da COMADEMA, o apóstolo Sílvio Antônio, pastor Márcio e outros. A gente se reuniu na Igreja Batista Nacional do Cohatrac e, ali, conversamos sobre a criação de uma instituição forte, que representasse de fato e de direito a comunidade evangélica no Estado do Maranhão, levando em conta, principalmente, o princípio de unidade e comunhão do povo de Deus. E foi assim que nasceu a ideia da AMOEMA.
L. LIVRE — Está bastante visível e rápido um número expressivo de pastores do Maranhão, e até fora do Estado, aderindo à AMOEMA. A que o senhor atribui esse fenômeno?
PR. ZEZINHO — Hoje, pastores, bispos, apóstolos e obreiros em geral do estado do Maranhão estão nos procurando. Primeiro porque eles nos conhecem. No Maranhão, eu completei 34 anos de trabalho pastoral. No dia 24 de outubro deste ano, eu completo 62 anos de idade. Em todos esses anos, tenho trabalhado com liderança, organizando os trabalhos e sempre chamando a atenção dos líderes para cuidar das pessoas, tanto de ovelhas como de pastores. E quando criamos esta associação, pensamos na finalidade maior dela que é unir os líderes para nos aproximarmos mais, estarmos juntos, para cuidar uns dos outros, ajudar uns aos outros. Sei que cada pastor tem a sua igreja, tem a sua convenção, tem o seu concílio, tem lá as suas reuniões de ministério etc. Mas que isso não seja empecilho para estarmos juntos, como um povo unido numa só fé em um único Deus, como está escrito em Efésios, no capítulo 4 e versículos 4, 5 e 6. Vejo que muitos de nossos pastores estão doentes. Eles cuidam do povo da igreja, mas não há quem cuide deles. Por isso estão doentes e não conseguem desabafar com ninguém o que está se passando com eles. Sofrem em silêncio, calados. Porque se eles compartilharem com alguém sobre suas mazelas e fraquezas, certamente não serão compreendidos e vão perder carteira, a igreja, o ministério e, por vezes, perdem até a sua salvação, dependendo de como ele vai reagir, sozinho e sem apoio nenhum, a um ataque espiritual. E a AMOEMA vem exatamente com essa missão de cuidar dos líderes nas suas dificuldades espirituais, emocionais e psicológicas. Quando eles ouviram e entenderam essa missão da AMOEMA, começaram a aderir e centenas de obreiros, a cada dia, vem me procurando.
L. LIVRE — E como vai funcionar essa ajuda espiritual, emocional e psicológica a pastores e líderes?
PR. ZEZINHO — Estamos criando um departamento específico que denominamos de clínica espiritual. Já convidamos o pastor Lisboa, que é psicoterapeuta, para assumir esse departamento. Ele é um pastor que veio de São Paulo e está com uma igreja aqui na COHAMA. É um homem que tem muita experiência em trabalho com liderança, principalmente nessa área de cura espiritual de líderes. Eu fiz um convite especial para ele coordenar esse departamento. Ele aceitou e, com isso, vamos ter o quanto antes esse trabalho na AMOEMA, que vai cuidar da vida espiritual dos nossos líderes. Além dele, têm outros pastores psicoterapeutas que vão estar envolvidos nesse trabalho. Já fizemos um trabalho recentemente com um pastor que teve um surto no púlpito. Demos a ele o devido apoio de clínica espiritual e, logo, percebi uma melhora significativa nele.
L. LIVRE — Qual a visão da AMOEMA perante a atual conjuntura da igreja evangélica brasileira? O que ela representa como novidade diante de outras tentativas de unir o povo de Deus para confraternizar a espiritualidade cristã mediante uma só fé num único Deus?
PR. ZEZINHO — Nossa primeira providência é buscar os pastores de todas as denominações, visando, assim, proporcionar unidade para desenvolver relacionamento sócioespiritual e prestarmos um serviço que, conforme cremos, é bem diferenciado dessa prática convencional que não restaura ninguém e nem faz um trabalho de desenvolvimento de igreja dentro dos reais princípios da comunidade da fé. Essa visão envolve tudo aquilo que tem a ver com a justiça do reino de Deus, principalmente no âmbito da condição humana a partir do que Jesus nos ensinou ao longo da leitura que fazemos do Novo Testamento. A visão de evangelho que Jesus nos deixou como exemplo não foge da responsabilidade social que a igreja tem como missão espiritual perante o mundo. Tudo isso se resume em servir o próximo e/ou viver a serviço do próximo. Isso inclui as relações da igreja com as instituições sociais, sendo que ela também é uma instituição social. Dessa visão, nascem todos os projetos e serviços da AMOEMA.
Pr. Zezinho quer pastores unidos |
L. LIVRE — Por que a igreja evangélica brasileira tem sido tão atacada por ondas de divisão e pecados de natureza moral, ética e social no cenário do mundo atual? O senhor não acha que isso faz com que ela, enquanto corpo de Cristo universal, perca a sua força social, política e até espiritual, enfraquecendo cada vez mais sua ação missionária, evangelizacional e, portanto, transformadora perante um mundo com tantas complexidades e desafios?
PR. ZEZINHO — Essa é uma pergunta que não é tão simples de responder e, portanto, requer uma resposta teológica com meio tom filosófico. Mas vou tentar ser o mais claro possível. Vejo que a igreja de Jesus, no século XXI, tem crescido muito no Brasil e em toda a América do Sul. Na medida em que ela foi crescendo, também foi perdendo seus espaços e, em consequência, um pouco da sua moral por causa de uma enxurrada de escândalos que veio à tona na figura de algumas lideranças que faltaram com a ética do evangelho. Pessoas de destaque que, inadvertidamente, cometeram erros, perdendo aquela representatividade e poder que elas tinham. Isso afetou drasticamente a igreja. Fenômenos evangélicos midiáticos como Jim Jones, Jimmy Swaggart, Jimmy Bakker, Caio Fábio e outros, somados com acusações de crimes sexuais contra evangelistas, pastores e padres mancharam gravemente as páginas da história da igreja durante as gerações 1980, 90 e ano 2000 para cá. Afora isso, as divisões no seio da igreja têm sido, quase de forma natural, uma constante. Mas, agora, com o advento dessa pandemia que assola o mundo, vejo uma igreja que está repensando seus atos, sua história e, enfim, sua espiritualidade. Percebo todo mundo correndo para os pés de Deus com medo da morte e do inferno. Não sei dizer se isso é o que de fato vai resolver o problema espiritual e relacional da igreja. Mas o certo é que a varredura que Deus está fazendo nos púlpitos e salões das igrejas tem levado muitos crentes a refletirem sobre sua fé, sua conduta, suas rebeldias, seus ódios, seus adultérios, suas heresias, sua falta de unidade e, enfim, sobre todo tipo de pecado, brincadeirinhas e afrontas contra Deus. Os que não estão morrendo, estão correndo às pressas não para os altares mas para o pé do altar de Deus. Isso, no mínimo, serve para um ajuste de conduta espiritual. Foi preciso vir a ordem do tal de “fica em casa” para muitos crentes descobriram que a verdadeira espiritualidade não está nos templos, nem em ouvir pregações ou dar dízimos e ofertas com enérgica pontualidade. Mas, sim, no verdadeiro templo do Espírito: corpo, alma, mente e coração. Todo esse conjunto de nossas estruturas humanas deve estar alicerçado em Deus. Agora, tudo pode mudar. De repente, a igreja percebeu até que, unida e viva em Deus com sua espiritualidade aquecida, pode definir uma eleição e, assim, salvar a fé dos ataques do Diabo. Mas, acima de tudo, a igreja tem que ver a necessidade de voltar para o seu papel, que é a missão para a qual ela foi levantada por Deus.
L. LIVRE – E qual é essa missão?
PR. ZEZINHO — A grande missão da igreja é dar continuidade ao trabalho iniciado por Jesus e os apóstolos, que é alcançar e transformar o mundo para Deus. Preparar esse mundo para viver o reino de Deus. Essa é a missão. O mundo está todo borrado com suas fraturas sociais e a igreja precisa olhar para isso e se empenhar em mudar essa realidade. Procurar meios e estratégias para alcançar e salvar vidas. Essa é a principal missão da igreja.
L. LIVRE — E o que a AMOEMA pretende fazer para corrigir essas várias fraturas sociais e espirituais que o senhor vem apontando durante esta entrevista?
PR. ZEZINHO — Na AMOEMA, estamos montando equipes de trabalho de acordo com as aptidões, habilidades, competências e área de conhecimento das pessoas. Ninguém consegue trabalhar sozinho. Cada equipe estará trabalhando coletivamente na sua área específica. Por exemplo, temos jornalistas e outros profissionais afins que vão trabalhar comunicação e evento, como no caso do pastor Battista Soarez. Outros estarão trabalhando na área de captação de recursos. E, assim, sucessivamente. Tudo isso será feito para o reino de Deus. A igreja do Senhor não pode pensar noutra coisa, senão no desenvolvimento do reino de Deus. E tudo o que ela fizer, seja na igreja, na política ou em qualquer outra área, tem que ser para Ele e para a Glória dEle.
L. LIVRE — O senhor pretende, então, ressuscitar, através desta nova associação de ministros evangélicos, aquela antiga prática pedagógica da igreja cristã muito atuante nas décadas de 1960, 70 e 80? Eu estou falando de escolas bíblicas, congressos, seminários e produção de conteúdo literário para crescimento e maturidade dos crentes.
PR. ZEZINHO — Esse será um grande trabalho da AMOEMA a ser realizado. Precisamos fazer um trabalho diferenciado. Temos de trazer de volva líderes que têm a responsabilidade de formar outros líderes. E que são especializados em fazer nisso. Para esse fim, vamos criar a escola de obreiros, a escola de líderes. Há uma necessidade muito grande de se fazer isso. Veja bem, as grandes lideranças estão envelhecendo. E alguns líderes de grande referência já morreram. Estão vindo aí novas lideranças que estão assumindo as igrejas. E a grande preocupação é de que essas novas lideranças não estejam prontas. E é aí que temos a responsabilidade de capacitar esses novos líderes — que mais tarde estarão substituindo os que estão envelhecendo e morrendo — para que eles continuem fazendo um trabalho correto e não corram o risco de adoecer a igreja do Senhor fazendo coisas erradas na sua administração. Não devemos pensar apenas na igreja do presente. Temos de estar preocupados com a igreja do futuro. Se Jesus não voltar logo por esses dias, precisamos ter líderes prontos para dar continuidade à obra que o Senhor tem entregue nas nossas mãos e nos levantado para fazer.
L. LIVRE — Diante de tudo isso, que palavra o senhor daria, como presidente da AMOEMA, para os pastores evangélicos em nome da nova associação?
PR. ZEZINHO — Nesse momento de crise mundial, todos nós sabemos que a igreja de Jesus foi afetada de várias maneiras, tanto do ponto de vista econômico, como social e espiritual. Há uma necessidade muito grande e urgente de os líderes se libertarem totalmente, principalmente aqueles que, de certo modo, estão engessados em suas denominações e, em razão disso, acabam não dando a devida contribuição para o reino de Deus. Então, este é um momento em que nós chamamos as lideranças eclesiásticas para uma reflexão. Estamos vivendo os últimos momentos da igreja na terra e ainda estamos preocupados com coisas terrenas. Esquecemos do objetivo maior da igreja, que é falar ao mundo caído e afastado de Deus que existe um Salvador que veio para libertar a humanidade do pecado e da morte espiritual. Esta é a grande missão nossa. Este é o grande trabalho da nossa associação de pastores: unidos, devemos convocar o nosso povo em geral para cumprir essa missão para a qual Deus tem nos chamado.
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FIM