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terça-feira, 29 de setembro de 2020

ECONOMIA: A ICÓGNITA DO "RENDA CIDADÃ"

 

A ICÓGNITA DO “RENDA CIDADÔ

 

O governo de Jair Bolsonaro anunciou ontem, 28/09/2020, a criação do programa “Renda Cidadã” que vai substituir o Bolsa Família, criado no governo Lula. Sem informar qual será o valor do novo benefício e o custo total do programa, o governo federal diz que novo programa vai beneficiar também o auxílio emergencial, que termina em dezembro.

O anúncio traz poucos detalhes e veio após meses de expectativa em torno da criação de um novo programa de transferência de renda para a população carente. Isso é visto dentro do governo como um importante trunfo. Por que? Porque  acende a perspectiva de manter o ganho de popularidade do presidente Bolsonaro, obtido depois da adoção do auxílio emergencial para proteger os brasileiros mais pobres do impacto da pandemia de coronavírus na economia.

Os tempos são de alerta. E já começa pela demora para criação do novo benefício — que originalmente seria chamado de Renda Brasil — que decorre da dificuldade de garantir recursos para um programa de elevado custo. Principalmente num momento de crise fiscal e despesas limitadas pelo Teto dos Gastos, regra que restringe o crescimento das despesas à inflação.

Bolsonaro, na sua fala, explica que o governo está buscando recursos com responsabilidade fiscal e respeitando a lei do teto. Segundo ele, a intenção é mostrar à sociedade, ao investidor, que o Brasil é um país confiável. Ele falou isso após reunião com o ministro da Economia, Paulo Guedes, com os líderes do governo no Congresso e com outros parlamentares para discutir o novo programa.

Apesar da explicação do presidente, logo após o anúncio já surgiram críticas entre economistas. A crítica gira em torno da proposta do governo de retirar recursos do Fundeb (Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação) e do pagamento de precatórios. O tom da crítica gira em torno dos valores que a União tem de pagar por decisão judicial para financiar o Renda Cidadã.

O senador Marcio Bittar (MDB-AC), relator da PEC Emergencial, explicou que a proposta do governo é o Renda Cidadã incorporar os R$ 34,8 bilhões previstos para o Bolsa Família em 2021. Além disso, a ideia é usar até 5% do aumento dos recursos do Fundeb, recentemente aprovado no Congresso, para o novo programa.

Em síntese, a terceira fonte de recursos virá da criação de um limite anual para os gastos com precatórios equivalente a 2% da Receita Corrente Líquida da União, o que liberaria parte dos R$ 55 bilhões previstos para essa despesa na proposta de Orçamento do governo para 2021.

A PEC Emergencial, da qual o senador Bittar é o relator, é uma proposta de emenda à Constituição que busca criar gatilhos para redução de despesas da União, inclusive com corte de salários dos servidores. A intenção do governo federal é criar o Renda Brasil também por meio dessa PEC.

Resta saber é o que vem por aí, a parir de 2021. Se o governo não criar políticas de crédito para produção e desenvolvimento para a população carente, com acompanhamento técnico e fiscalização regionalizada, vamos enfrentar uma crise de tamanho hercúleo com precedentes inexplicáveis. O povo tem que trabalhar, produzir e fazer a economia girar em torno do desenvolvimento social e econômico.

 

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Fonte: BBC Brasil

sexta-feira, 18 de setembro de 2020

ELEIÇÕES 2020 — Artigo: O SILÊNCIO DO FENÔMENO — PR. BATTISTA SOAREZ

 

O silêncio do fenômeno


 


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PR. BATTISTA SOAREZ
Escritor, jornalista, teólogo, sociólogo e professor universitário
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A PALAVRA FENÔMENO tem uma explicação em especial. Alguns lexicógrafos a definem como, dentre outros significados, “pessoa que se distingue por algum talento extraordinário”. Quero me ater a este ponto para falar das eleições de 2020, em particular do pastor Fábio Leite.

Mas, antes de falar diretamente do pastor candidato, quero dizer algo sobre minha experiência em análise política como jornalista e escritor.

Nunca fui candidato, embora tenha recebido convite por algumas vezes. Todavia, minha experiência com política tem a mesma idade da minha vida jornalística: 35 anos. Comecei em 1985 no jornalismo, e sempre transitando no meio político e, portanto, escrevendo sobre política. Fui assessor de comunicação em duas casas legislativas e dei consultoria de gestão em algumas prefeituras no estado. Com isso, aprendi muita coisa sobre política. Aprendi, inclusive, com as decepções e mentiras que existem no meio. Não há escola de mentira maior do que na política.

Em síntese, meu primeiro contanto com um ensaio sobre política se deu ainda no final da década de 1980, quando li Wolfgand Leo Maar o qual escreveu o livro O que é política?, publicado pelo antigo Círculo do Livro. No seu texto, Maar escreve o seguinte: “A política é uma referência permanente em todas as dimensões do nosso cotidiano na medida em que este se desenvolve como vida em sociedade”.

Portanto, uma vez que a política é parte da nossa vida diária, me tornei no mínimo um observador da política. Aprendi, ao longo da minha carreira jornalística, que política serve para se atingir o poder. E daí por diante, política é simplesmente a própria atividade exercida no plano desse poder. Na maioria das vezes, é um jogo sujo e injusto. Logo fica claro que a lógica das eleições descortina o sentido de que elas, as eleições, são armas que servem para confirmar ou para transformar realidades. O grande problema é quem vai operacionalizar essas armas.

Durante as entrevistas que fiz com o pastor Fábio Leite, vi um homem visionário. Um cidadão que nutre respeito pela vida e que tem uma visão acima de tudo planetária: centrada na “pessoa” e em “pessoas”. Quando recebeu o convite de um grupo para ser candidato, Leite silenciou, olhou seguidamente para os lados e asseverou: “me deem um tempo para eu orar”. Alguns dias se passaram, nova reunião. Fábio Leite, mais uma vez, foi ponderado nas palavras: “Eu só entro na política, se Deus for junto comigo. Se Ele não for comigo, pois saibam que eu não irei”.

Dias mais tarde, depois de entender a confirmação de Deus, Leite aceitou o convite. Renunciou a capelania militar e mais recentemente ficou sem igreja para pastorear. O pastor José Guimarães Coutinho, presidente da Assembleia de Deus em São Luís, não aceitou o pastor Fábio ser candidato e pastorar ao mesmo tempo. Teve de entregar a área onde pastoreava. As renúncias do pastor em prol da sua candidatura, portanto, demonstram um ato de fé e coragem, diante daquilo em que ele acredita.

De conduta ilibada e pai de família exemplar, pastor Fábio Leite é benquisto no meio evangélico, nas comunidades e nas instituições por onde trabalhou, inclusive na Polícia Militar do Maranhão. Seu nome chegou a ser cogitado para ser candidato a vice-prefeito ao lado de Eduardo Braide. Mas Braide rejeitou nomes ligados à igreja evangélica, optando por uma escolha de natureza ideológica. Escolheu a professora e policial militar Esmênia Miranda. Segundo Braide, a escolha se deu “pela sua história, competência, capacidade, trabalho na educação e história de vida”. Com isso, subestimou o insubestimável.

Como tudo na vida tem uma lógica, a escolha do candidato Eduardo Braide não parece agregar muita coisa que venha contribuir para sua vitória rumo à prefeitura. A menos que haja um milagre. Ele teria que escolher um nome que pudesse ser peso na sua eleição logo no primeiro turno. Agora, por conta do erro estratégico, vai ter de enfrentar uma coesa união de grupos com muito dinheiro no segundo turno. Braide esqueceu que o peso da soberba só puxa para baixo, levando à queda  já dizia Salomão, o grande sábio da Bíblia. E soberba parece que tem sido o problema do candidato do PODEMOS.

Depois de uma reunião de grupo favorável a Braide, conversei pessoalmente com o então pré-candidato informando que iria lhe ligar para uma entrevista. No dia seguinte, liguei dezenas de vezes, mas fui ignorado por ele. Mandei mensagem via whatsapp, mas Braide leu e mais uma vez me ignorou, o que prova um certo tom de soberba e menosprezo. Não sei se pelo jornalista ou pelo pastor evangélico. De qualquer forma, foi um menosprezo a um eleitor de São Luís. E para ser bem claro, não costumo votar em político metido a besta.

No geral, é pura ingenuidade de quem quer que seja ignorar ou subestimar, nos dias de hoje, a igreja evangélica como grupo social. As igrejas evangélicas, juntas, somam mais de 30 por cento da população de São Luís. É um grande público capaz de definir qualquer eleição. Se Braide perder as eleições 2020 para prefeito, será por conta da sua escolha mal orientada. Caso ocorra, ficarão a lição e o exemplo para futuras situações políticas.

Política é multiplicidade resultante de estratégias da ciência do marketing e das relações. As facetas, no bom sentido, não podem ser ignoradas. Existem “política” e “políticas”. Uma delas, como disse Maar, goza de indiscutível unanimidade. Então, nesse cenário de “política” e “políticas”, os personagens e/ou atores precisam estabelecer visão do “todo” e do “mínimo”. Do “mais” e do “menos”. E isto vai além da referência ao poder político, à esfera da política institucional.

Um deputado ou um órgão de administração pública são políticos para a totalidade das pessoas. “Política” é... relações com pessoas. “Políticas” são... relações com negócios, com a “coisa” adversante. Há um espaço onde tudo isso se realiza. Esse espaço é um ambiente formador de visão. Se o candidato ignorar isso ou cometer erros estratégicos porque não tem visão, como acaba de fazer o candidato Eduardo Braide, haverá perdas consideráveis e, portanto, redução de possibilidades. Será que Braide tem noção do que isso significa? Ficou claro que não. O Braide carismático não tem visão estratégica do espaço “político”. Ignorou o ignorável. E tomou decisões com base meramente em “políticas” e relações de “negócios” adversantes. E agora? É esperar pra ver.

quinta-feira, 17 de setembro de 2020

ELEIÇÕES 2020: PR. FÁBIO LEITE

 

Cresce apoio ao Pr. Fábio Leite

Candidato a vereador por São Luís, o pastor surpreende recebendo apoio maciço de lideranças evangélicas

Por Battista Soarez

(De São Luís-MA)

 


O pastor Fábio Leite (PODEMOS), candidato a vereador de São Luís, vem surpreendendo muita gente na última semana. Ele recebeu apoio considerável da Assembleia de Deus, campo do Tirirical-São Cristóvão, liderada pelo pastor Oziel Gomes, um dos líderes mais importantes da AD no Maranhão.

Depois de uma reunião do colegiado, na segunda-feira, 14, a liderança da igreja em todas as áreas lideradas pelo pastor Oziel Gomes se fez unânime em torno do nome de Fábio Leite.


No culto de terça-feira, 15, em que toda a liderança da igreja do campo do Tirirical-São Cristão — que compreende os bairros São Cristóvão, Tirirical e todos os outros bairros do entorno da BR 135 até Estiva — se reuniu em assembleia geral, o apoio a Fábio Leite foi consolidado. Leite falou à igreja e às lideranças de todas as áreas e, depois, se ajoelhou no púlpito para receber oração dos fiéis. Com isso, o candidato ampliou consideravelmente a sua base de apoio para a sua campanha eleitoral.

“Fiz uma articulação excelente no campo da Assembleia de Deus do Tirirical-São Cristóvão, que é o segundo maior campo da nossa denominação”, pondera Fábio Leite.

Ex-capelão da Polícia Militar do Maranhão e ex-candidato a vice-prefeito de São Luís, Fábio Leite é candidato apoiado pelo pastor José Guimarães Coutinho, pastor-presidente da Assembleia de Deus em São Luís, com mais de cem pastores de áreas sub sua liderança. Agora são dois grandes campos, São Luís e Tirirical-São Cristóvão, que se uniram em torno da candidatura de Fábio Leite. Além da Assembleia de Deus, outras denominações estão aderindo à candidatura do pastor Fábio.

Na zona rural, o candidato do PODEMOS também está recebendo apoio de várias lideranças comunitárias. Com isso, Fábio Leite vem crescendo politicamente e sua eleição dá sinais de certeza no dia 15 de novembro. “Como pastor e cidadão, só posso contar com Deus e com o povo”, observa Leite.

O nome de Fábio Leite chegou a ser ventilado como candidato a vice-prefeito na chapa de Eduardo Braide. Mas Braide ignorou o nome de alguém ligado à igreja evangélica e, possivelmente, reduziu a possibilidade de ser eleito logo no primeiro turno. Cometeu, finalmente, um grave erro estratégico na escolha do vice e, agora, vai ter de enfrentar um segundo turno arrojado com sério risco de não ser eleito. O nome do pastor Fábio Leite traria a igreja evangélica em peso para o candidato Braide e as eleições certamente seriam definidas no primeiro turno.

 

segunda-feira, 24 de agosto de 2020

A FÉ CRISTÃ QUE ME INCOMODA - Artigo - PR. BATTISTA SOAREZ

 A FÉ CRISTÃ QUE ME INCOMODA

 




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PR. BATTISTA SOAREZ

Escritor, jornalista, professor universitário, psicoterapeuta e teólogo. Autor de vários livros, dentre eles A igreja cidadã, publicado pela AD Santos Editora.

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NOS ÚLTIMOS ANOS, algo na igreja cristã tem me chamado atenção. Vivemos um cristianismo complexo e confuso. Formas de pensamento que dividem o corpo de Cristo aos pedaços. Falta de compreensão no que concerne aos princípios ensinados por Jesus que caracterizam a lógica daquilo que define, de fato, o sentido do reino de Deus. A noção de salvação é o tema central do cristianismo, mas isso tem de ser compreendido na perspectiva do reino. E este deve ser o magistério da igreja ao longo de sua trajetória.

Na ótica do reino de Deus, o Novo Testamento nos apresenta muitas expressões do que significa a “certeza da salvação”. O fato de estarmos salvos é uma convicção de liberdade e consciência na pessoa do Cristo. Essa liberdade não é, de maneira alguma, uma liberdade que nos tira da escravidão do pecado e nos torna escravos da religião. Jesus nos tirou da escravidão do pecado e, também, da escravidão da religião. Mas o que eu vejo é que as pessoas se libertam do pecado para se tornarem escravas da religião, ignorando verdades bíblicas que afirmam que “se o Filho vos libertar, verdadeiramente sereis livres” (Jo 8.36) e que “foi para liberdade que Cristo nos libertou” (Gl 5.1).

Isto quer dizer que fomos libertados do pecado, da lei, da morte, das trevas, do mundo perdido. Quer dizer, também, que fomos reconciliados com Deus, perdoados de todas as nossas culpas. Então, na perspectiva do reino de Deus fomos chamados para vivermos uma nova vida. Isto porque, em Cristo, o Senhor do Reino, fomos justificados, santificados, filhos de Deus, templos do Espírito Santo e irmãos de Jesus Cristo.

No reino de Deus, nós experimentamos a alegria, a consolação, a verdadeira liberdade, os dons do Espírito. Nisto, somos capacitados no amor, na perseverança, na esperança da ressurreição e, assim, todas estas coisas nos fazem participar da vida em Deus.

Na perspectiva do reino, a salvação é a plenitude do ser humano, isto é, o sentido último de sua vida. Uma espécie de realização total em matéria de felicidade. E isso para toda a eternidade. Em Cristo Jesus, a salvação do ser humano é Deus. É uma comunicação Deus-homem-Deus que só será plenamente vivida na eternidade. No século 21, a fé cristã moderna não tem conseguido compreender essa dimensionalidade do evangelho do reino. Se tivesse compreendido a salvação na perspectiva do reino, não estaria vivendo as fraturas sociais que ela tem vivido no plano de uma certa pedagogia da espiritualidade cristã (Mt 28.19-20), que deveria estar impactando todas as nações da terra.

A fé cristã nos dias atuais tornou-se complexa e plural. Primeiramente porque não existe um ser humano abstrato. Todos nós, humanos, estamos inseridos num contexto vital de sociabilidade, historicidade e culturalidade. Nesse contexto, estamos cercados de ameaças concretas, desafios, mentalidades específicas e culturas distintas umas das outras. É neste contexto que a fé cristã coloca os habitantes da terra na experiência da salvação, conectando-os ao reino de Deus. Aqui, na cultura do reino, tudo é diferente. Aqui não há mais lei, nem dogma e nem religião. Tudo se transformou em princípios do reino. “As coisas velhas se passaram, e eis que tudo se fez novo” (2 Co 5.17). Quem entra para o reino de Deus, entra na maior plenitude da vida. E a pessoa, então, estará liberta do mal social que a perturba: o pecado. Sim, o pecado é um mal social que afeta toda a existencialidade da pessoa humana (o pecador).

No decorrer da história cristã, as expressões da salvação tendem a ser contextualizadas e a fé cristã — termômetro da igreja corpo de Cristo — estará apta para protagonizar novos questionamentos e novas linguagens frente às atuais mudanças de um mundo supramoderno. Tão moderno a ponto de não se entender mais sua complexidade.

Como jornalista, escritor e pastor, tenho observado que as expressões do passado têm se evidenciado em postulado de verdades que não devem ser descartadas em hipóteses alguma, haja vista representarem a riqueza da novidade de vida da qual se nutre a nossa fé no Deus criador de todas as coisas. E, assim, estaremos em absoluta segurança na caminhada de vitória contra as mazelas deste mundo tenebroso. Por mais que soframos, venceremos — caso a nossa fé em Cristo não for irrelevante.

Nos últimos anos, o tom das minhas pregações tem sido no âmbito de uma igreja que valoriza a riqueza das relações. Isto é um fator da inteligência espiritual que valoriza a ideia de uma salvação diversificada que vem a ser o próprio indivíduo, o humano, que é gente de carne e osso. Aliás, o indivíduo [humano] constitui uma rica realidade complexa. Complexa no sentido de ele ser um “ser”, isto é, um corpo (soma) constituído de uma natureza espiritual, pessoal, social, psicológica, ambiental, política e cultural ao mesmo tempo. No nível das relações — com Deus e com o outro social-antropológico — qualquer uma dessas áreas da vida humana pode clamar por vida eterna [salvação].

A fé cristã, por conseguinte, é intrínseca à salvação da pessoa humana. Quando recebemos a salvação em Cristo, confessando-o pela fé, somos iluminados, orientados, saneados, corrigidos, estimulados, plenificados e instruídos em todos os setores da vida. Nisto se manifesta a plenitude do reino de Deus. E quando estamos revestidos da plenitude do reino não estamos limitados em nenhuma dessas áreas. Isto porque, uma vez confessando “a Jesus como Senhor” (Rm 10.8-10), o poder do Cristo de Deus logo preenche, em nós, todas essas áreas. Consequente e inevitavelmente, surgem compreensões diversas no universo das experiências salvíficas que preenchem todas essas áreas. Toda a história cristã, no plano neotestamentário, nos confirma isto.

A partir desta visão, o dom de Deus aponta para uma humanidade fraternizada. Isto justifica o nosso empreendimento para a fé cristã salvífica nos dias de hoje. Como dom de Deus, a salvação é oferecida a todos os seres humanos — independente de etnias — gratuitamente em Cristo Jesus. É graça de graça. Nenhuma ideologia, seja ela qual for, consegue substituir ou contradizer a verdade absoluta da graça de Deus. Por que? Porque a graça de Deus está fundamentada no evangelho da Cruz: morte e ressurreição de Jesus Cristo, na qualidade de Senhor do universo, no qual se formou a igreja (Ef 1.22).

Nos dias de hoje, as cosmovisões e/ou ideologias prometem uma humanidade feliz e sem os males da vida. Mas cada vez mais mergulhamos em ruinas sociais. As tentativas de autossalvação do homem sempre o conduzem a tragédias sociais. Muitas são as contradições e os desacreditamentos. As tentações são frequentes em torno dos seres humanos, levando-os a atitudes absurdas de emancipação de Deus. Mas isso tem um preço doloroso: a perdição eterna. Tudo é uma loucura. Todos estão perdidos sem Deus no mundo. E Deus parece estar calado nas palavras, mas falando alto em forma de tragédias e sofrimentos no seio das sociedades modernas e complexas. A ciência está perdida. E a tecnologia está confundida e causando danos na humanidade.

Enquanto isso, a fé cristã se esfria a cada passo na história da igreja. Uma igreja que não tem mais noção de si mesma, isto é, não tem mais compreensão sobre sua própria identidade. E uma igreja sem noção de sua própria identidade é uma igreja perdida no espaço e no tempo, sem previsibilidade de como será seu amanhã. É como eu disse numa de minhas pregações algum tempo atrás: a moral do evangelho da religião-igreja é de causa e efeito. Mas o efeito acaba extrapolando a causa.

Recentemente eu falei para um pastor — que falou mal de outro pastor para mim — assim: “quando você não estiver mais vazio de Deus, conseguirá ver Deus no outro seu irmão. Você só está falando mal do outro pastor porque você está vazio de Deus. Quem está cheio de Deus não vê os defeitos do outro”. Dias depois fui informado de que o pastor que falou do outro pastor para mim estava dando em cima de duas jovens bonitas de uma outra igreja, sendo que uma era casada.

Como cristão, vejo que essas coisas me cansam. E a minha decepção com a igreja visível é que ela esconde o que é real e usa o púlpito para pregar o que não é real. Regras e doutrinas igrejeiras servem de chicotes para baterem em pessoas humildes que vão aos cultos em busca alívio, sentido e cura para suas vidas sem significado. Mas, ao ouvirem o pastor ou conviverem com os crentes, saem do ambiente piores do que entraram. A decepção abre feridas e lacunas emocionais que logo se transformam em crises existenciais. As pessoas ficam frias e se afastam. E aí ficam desconectadas do processo do “puro-amor” de Deus. Saem do alinhamento espiritual que dá sentido e significado à nossa existência, em que somos capacitados a atuar na busca significante por uma humanidade mais fraterna e justa.

Quando encontramos sentido e significado em Deus, nossos erros e pecados não conseguem anular nossa responsabilidade diante da história. Eles são eliminados e, então, recebemos a graça da governança pessoal guiada pelo Espírito de Cristo. O dom de Deus se manifesta e nossa inteligência descobre a liberdade de governar até mesmo as coisas mais complexas da vida. E, então, se aprende sabiamente que religiosidade não tem nenhum valor no reino de Deus. Na verdade o que importa é a graça e o dom de Deus. Porque a graça e o dom de Deus apagam as bestialidades humanas. Apagam até mesmo as desigualdades no ambiente da espiritualidade da igreja. A espiritualidade atual, no entanto, precisa receber a graça e o dom de Deus para poder encontrar sentido e significado e, assim, impactar as conexões do mundo.

sexta-feira, 19 de junho de 2020

VIDA CRISTÃ PÓS-PANDEMIA - Artigo - PR. ANDRÉ SOUZA


VIDA CRISTÃ PÓS-PANDEMIA





PR. ANDRÉ SOUZA
Presidente da COMADEMA/CADB no estado do Maranhão.




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EM APOCALIPSE 3.11 lemos: “Eis que venho sem demora; guarda o que tens para que ninguém tome a tua coroa”.
Como pastor, me preocupo com as novas formas de vida cristã após um período de pandemia como este. O impacto da pandemia na vida da igreja — com a vinda do coronavírus sobre a humanidade — pode ser visto com outro olhar a partir do afastamento da comunhão dos crentes uns com os outros.
O momento atual é de profunda reflexão, haja vista que todos nós ficamos preocupados. Até aqui parece ser um momento único. Igrejas fecharam suas portas. Polícia na rua controlando a vida e o direito de ir e vir das pessoas. O medo instalado no coração e na mente daqueles de ideias mais fixas. Pastores doentes. E nós, de fato, perdendo muitos amigos e parentes.
Mas, por outro lado, vemos muita gente mais preocupada com a impossibilidade de poder ir ao culto e adorar a Deus do que com a doença da COVID-19. Muitos buscaram alternativas e formas diferentes de fazer viver a fé. Os cultos on-line vieram como uma luva. O distanciamento entre seres humanos imprimiu na mente da humanidade uma nova cultura. Inclusive na mente da igreja.
A fé, de repente, passou a ser transmitida por computador, numa perspectiva diferenciada, suscitando perguntas e respostas sobre a vida cristã atual. Viver a espiritualidade de forma intensa passou ser um desafio para homens e mulheres em busca de sentido para suas vidas. Aliás, é um desafio que nos coloca frente a frente com o sofrimento e a morte em que a situação nos joga.
Todavia, em Mateus 28.20, Jesus disse: “Eis que estou convosco todos os dias até a consumação dos séculos”. Isto nos garante que, em qualquer situação, nunca estamos sozinhos. Em meio a problemas, desilusões, sofrimentos, crises, pandemias, etc... o Senhor sempre estará conosco. Estamos vivendo em tempos difíceis. Tempos em que, por vezes, temos a sensação de que Deus se distanciou. Parece que, por um momento, o Senhor deixou a humanidade sofrer um pouco as consequências do seu pecado.
No mínimo, as trevas do isolamento social, das ruas vazias, lojas fechadas e funerárias abertas 24 horas por dia mostram um espelho nada animador. O quatro é de incertezas, medo, dúvidas, silêncio mórbido e tristeza. Sempre que nos deparamos com pessoas na rua, seus olhares nos dão a impressão de um vazio desolador, que paralisa tudo no transitar do cotidiano. A verdade é que, nesse prisma sociológico, nos vemos temerosos e perdidos.
Mas a narrativa bíblica dos discípulos a caminho de Emaús nos dá a certeza de que, nas noites escuras da vida e da história, o nosso Senhor Jesus Cristo caminha conosco nos servindo com sombra e proteção. É certo que quando mantemos comunhão com Ele, temos a certeza de sua presença: ou nos livrando do leito da doença ou nos agraciando com o paraíso maravilhoso da vida eterna. Mas a verdade é que nunca estamos sozinhos. Ele só nos tira deste plano terreno quando nossa tarefa, aqui, terminou. Quando não faz mais sentido estarmos aqui neste mundo, Ele nos promove para uma vida superior ao lado dEle na eternidade.
Se você tem convicção da sua fé em Cristo, este tempo grave de pandemia pode até fechar as portas do templo para você assistir ao culto de forma física, mas não poderá fechar a porta do seu coração para orar, buscar a Deus, pregar a palavra e ler a Bíblia. Não poderá privá-lo de assistir aos necessitados com a justiça do evangelho: criando redes de solidariedade e levando pão e água a quem tem fome e sede de justiça. Esta e outras práticas cristãs da igreja invisível, de fato, nos enchem de espiritualidade em Deus.
Mesmo com os desmandos dos governos estaduais e municipais — tirando proveito financeiro da situação de crise e praticando suas injustiças contra a sociedade que já sofre com tantas mazelas da realidade social — a vida cristã segue seu plano de crescimento espiritual naqueles crentes que realmente nasceram de novo em Cristo.
Não se pode prevê até quando esta crise vai durar. Mas podemos intensificar o nosso compromisso com Cristo e nossa responsabilidade de vivermos este momento sem titubeio. Como pastor, tenho a responsabilidade de incentivar a minha igreja a cuidar da sua própria vida e da vida do próximo dentro da lógica do sentido bíblico.
É importante pensar na vida espiritual [e também social] da igreja de Jesus após a pandemia. Certamente nossa inteligência espiritual continuará se esforçando para descobrir uma nova forma de se fazer presente nas casas, nas famílias e na vida das pessoas sem quebrar a comunhão no aspecto físico. O corpo de Cristo é uma comunidade de fé, comunhão e, portanto, relacionamento. Um aperto de mão, um abraço afetuoso, uma conversa olho-no-olho e um sorriso gracioso são coisas que nunca devem ser trocadas por distanciamentos e/ou isolamentos.
Nossas celebrações na Assembleia de Deus Missão (ADM) voltaram e continuarão sendo presenciais. Jesus Cristo está presente em nós e, por isso, somos um corpo de verdade nEle. Por isso nos reunimos para orar, louvar, ouvir a palavra, pregar, celebrar a Santa Ceia e, assim, ter vida abundante em Jesus. Afinal de contas, a igreja reunida fisicamente é sinal da presença real do Cristo ressuscitado (Mt 18.20). É isso que faz os nossos corações se manterem aquecidos no amor do Senhor, de forma ardente e não fingida (1Pe 1.22-25). É este nível de espiritualidade que faz a igreja ser bênção na vida das pessoas no âmbito da comunidade. Há absoluta primazia no culto presencial.
Portanto, em vez de se alimentar o medo de visitar alguém e ficar vendo o que algumas televisões propagam para causar pânico nas pessoas, é momento de a igreja se voltar para a palavra de Deus. Devemos alimentar nossa esperança no Cristo de Deus, crescer nEle porque, pelos sinais que vemos acontecendo, uma nova ordem econômica mundial, no após-pandemia, poderá estar se organizando, em que o anticristo estará pronto para assumir e governar o mundo. Todavia, sabemos que Cristo está perto de voltar para levar a sua igreja para o céu de glória quando, então, estaremos com Ele para sempre.
Afinal, Ele nos garantiu: “Eis que venho sem demora; guarda o que tens para que ninguém tome a tua coroa” (Ap 3.11).


segunda-feira, 8 de junho de 2020

DOR E SOFRIMENTO - Artigo - PR. BATTISTA SOAREZ

ONDE ESTÁ DEUS 
QUANDO A DOR 
NOS ATORMENTA?





PR. BATTISTA SOAREZ
Escritor, jornalista, professor universitário, psicoterapeuta e teólogo. Autor do livro A igreja cidadã (AD Santos Editora).





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MORO NUMA CIDADE cercada de praias por todos os lados. Quem conhece São Luís, capital do Maranhão, sabe que para qualquer direção que a gente caminhe vai se deparar com maravilhosas águas do oceano atlântico. Quando quero pegar um mergulho nas ondas do mar, relaxar e higienizar a mente, não preciso percorrer muitos quilômetros e nem me preocupar com a distância.
A casa onde hoje moro, localizada na parte central da “ilha do amor” — como São Luís é conhecida pelos maranhenses, principalmente escritores, poetas e artistas da terra — é rodeada de algumas árvores frondosas e frutíferas. Isso atrai pássaros de várias espécies que, logo de manhã cedo, por volta das cinco horas, me acordam todos os dias. Então, num cantarolar festivo de passarinhos, me acostumei levantar nessas horas da manhã para fazer meu café, preparar cuscuz de milho e, assim, fazer a primeira refeição do dia. Depois de comer algumas frutas frescas, me debruço nos livros para estudar, orar. preparar aulas ou escrever. E olha que até pouco tempo atrás, eu morava no bairro do Turú, o que me aproximava ainda mais da praia, possibilitando-me descer a pé e, em poucos minutos, estava pegando ondas, depois de um breve exercício físico.
Quem ler este relato de parte da minha vida cotidiana poderá imaginar que, por vezes, a felicidade não se afasta, dando lugar ao sofrimento e à dor. Mas é fato. Nesse período de pandemia, eu fui infectado. Passei quase dois meses na fossa, tentando superar a dor de estar doente e a dor da preocupação com o meu filho, de apenas sete anos, que ainda depende muito de Deus me manter vivo para criá-lo. “Deus, eu não tenho medo de ir para junto te ti, mas ainda tenho algumas missões que tu me deste, e elas ainda não estão concluídas”, era a minha oração diária. Depois de quase dois meses, orando, recuperei com ajuda de remédios e uma alimentação balanceada.
Alguns amigos meus não tiveram a mesma sorte. Partiram para a eternidade após serem infectados pela Covid-19. Um amigo muito chegado morava numa casa de luxo a poucos metros da praia do Calhau, na avenida Litorânea, uma das mais bonitas da capital. Recebendo mensalmente uma generosa quantia como desembargador aposentado, ele praticamente não sabia o que era sofrimento. Sua vida podia ser definida numa palavra: conforto. Mas um dia a dor da doença causada pelo coronavírus chegou. Mesmo sendo internado no melhor hospital particular da cidade — que a sua generosa condição financeira lhe permitia — não resistiu às complicações respiratórias implicadas pelo vírus. Ele foi a óbito. E o pior de tudo é que a família não pôde fazer um velório digno para celebrar o último adeus. Do hospital, o corpo foi direto para o cemitério.
Você de fato sente o peso da dor quando pega uma doença grave, quando é desprezado, jogado à solidão ou quando perde um ente muito amado. É nessa hora que a sua alma grita a Deus com toda força da pressão psicológica e emocional: “Deus, onde tu estás?”. Na dor, o amor e o sofrimento parecem se convergir. No holocausto, Hitler não sentia dor alguma quando estava matando os judeus com toda frieza do ódio etnocêntrico. Ele não tinha amor humano. Por isso não sentia dor, nem remorso. Mas, e os familiares que ficaram vivos sentindo a dor da perda dos seus parentes? E a dor psicológica daqueles que estavam na fila esperando a hora de morrer, sentindo desesperadamente o tic-tac das batidas do relógio de seu coração que contavam até o último segundo? Dizem que, no sofrimento, as sensações de vida e de amor se misturam.
O escritor cristão Philip Yancey traz à lembrança o fato de que os estudiosos da medicina falam que, numa ferida profunda, há dois tipos de tecido que precisam de cirurgia. Há o tecido conjuntivo — sob a superfície — e a camada externa que protege a pele. Em situação de rompimento profundo, ambas precisam ser curadas. Num comparativo com a dor do sofrimento, as camadas física e emocional da pessoa precisam ser tratadas. Não adianta só orar ou tratar a dor física. É preciso um processo de cura interior, em que entram em ação as sessões psicológicas nas relações com a pessoa ferida. Nossas feridas emocionais precisam ser cicatrizadas. Recentemente, vi na televisão sobre um caso em que um homem deu vários golpes de faca na própria esposa. Ela foi para o hospital, recebeu tratamento médico e ficou bem. As feridas no seu corpo físico foram cicatrizadas. Mas e as emocionais? As pessoas precisam entender que feridas emocionais são profundas e matam até mesmo o prazer de viver. Matam a alegria da alma.
Como cristãos, almejamos seguir um homem que veio de Deus, enviado por Ele, há dois mil anos. A gente lê os evangelhos e encontra uma única cena em que alguém se dirige a Jesus diretamente como Deus, dizendo: “Senhor meu e Deus meu!”. Quem falou isto foi Tomé. Aquele que todo mundo chama de incrédulo, mas eu o vejo com outro olhar. Tomé estava mergulhado na dor da tristeza de ter perdido recentemente o amigo e Senhor, a quem aprendeu a amar com dedicação e admiração. Jesus, para os discípulos, não só era amável, mas também admirável. Quando Ele morreu na cruz, aos olhos de todos, os discípulos mergulharam em profunda dor e tristeza, haja vista a forma cruel do sofrimento e morte que eles presenciaram. Aquelas imagens pincharam a sua mente e certamente lhes deixaram profundamente perturbados. Imagine! Portanto, Tomé ficou impactado com a surpresa gerada pela notícia da incrível ressurreição. Ele viu Jesus morrer e ser lançado numa tumba. E como é que, de repente, alguém chega e diz “eu sou o Senhor”? Além disso, Jesus havia orientado os discípulos dizendo que se alguém lhes dissesse “eu sou o Cristo”, era pra eles não acreditarem. E parece que Tomé foi o único que guardou essa orientação do Mestre. Por isso duvidou, e exigiu provas de que aquela figura era mesmo o Cristo. Claro, Tomé não queria ser enganado. Qualquer crente cuidadoso e vigilante faria o mesmo. Inclusive eu.
Jesus, então, compreendeu a dúvida de Tomé e fez questão de aparecer ao discípulo tristonho em seu novo corpo transformado para apagar todas as dúvidas. Todavia, o que parece ter motivado aquela explosão de fé em Tomé — que se alegrou dizendo “Senhor meu e Deus meu!” — foi exatamente a presença das cicatrizes. Jesus disse a ele: “Vê as minhas mãos”. “Chega também a mão e põe-na ao meu lado”. Numa revelação surpreendente, depois de verificar as devidas evidências, Tomé viu a maravilha de Deus, o Senhor, sendo condescendente e assumindo nossa dor, completando a união com a raça humana.
Na hora da dor — em que, por vezes, somos levados a perguntar “onde está Deus que não vê o meu sofrimento” — imaginemos que nem mesmo Deus ficou isento dela. E quando perguntamos “onde está Deus agora em que estou sofrendo?”, a resposta da verdade absoluta é: Ele está junto a nós participando plenamente da nossa condição humana. Ele está sentindo conosco a nossa aflição. Naquele momento, Tomé reconheceu a verdade mais fundamental do universo. A verdade de que Deus é amor. Por isso Ele nos ama. E amar significa sentir a dor do outro. Por isso Ele sente a nossa dor. E a dor manifesta a vida. Foi o que Jesus fez. Ele levou sobre si nossas dores e enfermidades, e nos deu vida em Deus.
Agora, tudo o que devemos fazer é seguir Jesus de perto e observar como Ele respondeu às tragédias do seu tempo. É só você olhar para os milagres que Ele fez e logo verá onde está Deus quando estamos em situação de dor. Ele está exatamente no mesmo lugar e situação em que você se encontra em sofrimento. Normalmente, as pessoas que se aproximavam de Jesus clamando por socorro estavam em situação de dor. Como, por exemplo, uma viúva que perdeu seu único filho. Um homem por nome Jairo cuja filha falecera. Ou até mesmo um soldado romano cujo servo contraiu uma enfermidade. Em momento como esses, Jesus nunca fazia sermões de julgamentos. Em vez disso, Ele respondia com compaixão, palavras de conforto e cura. Em latim, a palavra “compaixão” significa “sofrer com...”. Portanto, Deus sempre está ao lado de quem está sofrendo. Você está sofrendo dor e decepção? Lembre-se: Ele está exatamente aí, junto a você.

quarta-feira, 20 de maio de 2020

POR QUE PESSOAS BOAS SOFREM?

POR QUE PESSOAS BOAS SOFREM?

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Pr. Battista Soarez
Escritor, jornalista, teólogo, psicoterapeuta e professor universitário.
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Anos atrás, lá por volta de 1986, eu estava numa antiga livraria na rua Grande, centro comercial de São Luís, como era de costume fazê-lo todos os dias no intervalo do expediente do Jornal de Hoje, onde trabalhava como revisor de texto. Percorrendo prateleira por prateleira, procurando curiosamente os novos títulos do mercado editorial, quando, de repente, meus olhos se depararam com a obra “Por que sofrem os escritores”. Não lembro mais o nome do autor, mas parece-me que era um psicanalista. Lembro também de ter comentado, sobre o livro, com a minha namorada da época, chamada Tânia. Ela também gostava muito de ler e me deu vários livros de presente. Então, tudo o que eu via de novidade literária, comentava com ela, obviamente.
O livro falava da história de vida de grandes nomes da literatura mundial, dentre eles Leon Tolstói e Thomas Mann, considerados entre os maiores escritores de todos os tempos. Tanto Tolstói quanto Mann sofreram perseguição e descasos nas suas próprias famílias. Tolstói, inclusive, teve tantos problemas com familiares que, em vida, doou toda a sua riqueza — adquirida com o ofício de escritor, claro — aos trabalhadores camponeses aos quais dedicou sua vida fazendo obras sociais. Aos 82 anos de idade, após uma briga familiar, Tolstói saiu de casa com apenas uma maleta. Dias depois, o famoso escritor foi reconhecido pelo diretor da estação ferroviária de Astapovo, na província de Riaz, na Rússia. Ao vê-lo doente, com febre e tossindo muito, o diretor se aproximou e exclamou: “Doutor Tolstói!”. Então, o generoso diretor da estação levou o escritor para sua própria casa dando-lhe os devidos cuidados. Ali, Tolstói morreu dias depois de pneumonia.
Bem, uma das questões abordadas no livro “Por que sofrem os escritores” é a espiritualidade. O ofício de escritor tem a ver com inspiração. E inspiração envolve a espiritualidade. Há um jogo de energias cósmicas propulsoras: positivas e negativas. As energias cósmicas positivas são do bem, enquanto as negativas são do mal. Na positiva está Deus e os princípios da sua justiça. Na energia cósmica negativa estão as forças demoníacas que lutam contra o bem. Portanto, qualquer pessoa que promove o bem é perseguida.
Outra questão é que o escritor trabalha para transformar o mundo com suas ideias de ética e moralidade na construção do bem, e as forças demoníacas lutam para que isso não aconteça. De fato, os escritores sofrem porque há uma retaliação das forças do mal contra eles. E não só contra os escritores, mas contra qualquer uma pessoa de coração bom e que trabalha para o bem da sociedade.
Isso não acontece só com os escritores clássicos. Aliás, a gente imagina que por serem ricos e famosos, isso não pudesse acontecer com eles. Mas aconteceu com eles e pode acontecer com escritores que não são clássicos, ainda nos dias de hoje. Normalmente, os escritores são pessoas sérias, responsáveis e éticas. Porque acabam limando o seu caráter na educação que recebem baseada naquilo que leem. E o primeiro impacto no coração de um escritor ou de uma pessoa boa, é o não-reconhecimento e o não-respeito da própria família. Nisso, o nosso Senhor Jesus Cristo sabia muito bem o que estava dizendo quando asseverou: “Não há profeta sem honra, senão na sua terra e na sua casa” (Mt 13.57). Também em Mateus 10.36, ele diz: “Assim, os inimigos do homem serão os da sua própria casa”.
E este pensamento bíblico não era novo nos dias de Jesus. O profeta Miquéias, sete séculos antes de Cristo (séc. VIII a.C.), já alertava: “Porque o filho despreza o pai, a filha se levanta contra a mãe, a nora contra a sogra; os inimigos do homem são os da sua própria casa” (Mq 7.6). Esses males fazem parte do amplo conjunto de males do nosso tempo. Nossa sociedade está exatamente assim, impregnada dessas mazelas na família e nas relações sociais.
Vários homens de Deus, hoje em dia, trabalham para o bem da igreja, trabalham para o bem da família e depois descobrem que a sua família os odeia, é a sua primeira inimiga. Muitos pais de família sacrificam suas vidas dia e noite, trabalhando para ver os da sua casa vivendo confortavelmente. Todavia, nem sabiam que, ao fazer isto, estavam construindo inimigos debaixo do seu próprio teto. Na época de Jesus, ele mesmo previu esses desencontros no meio das instituições familiares. Em nossos dias, a estabilidade familiar deixou de existir. E o respeito dos filhos pelos pais sucumbiu-se no lamaçal de pecados e injustiças humanas de toda sorte. Por isso e com isso, as pessoas boas sofrem. Elas lutam pelo bem de todos, e recebem como paga o ódio, a perseguição, a falta de respeito e a ingratidão por parte da própria família.
Face a isto, Jesus ensinou, em Mateus 10.34-36, que não devemos ser coniventes com patifarias de gente ingrata e rebelde da nossa família. Eles são os nossos verdadeiros inimigos. E não só nosso, mas também de Deus. Porque, ao serem ingratos e rebeldes, estão se levantando como inimigos de Deus e da sua justiça. Por isso não devemos passar mão na cabeça de familiares rebeldes e ingratos. Eles não merecem nosso carinho. Eles são a causa da nossa vergonha e do nosso sofrimento. Isso não quer dizer que não devemos amá-los e orar por eles. Mas amar e orar não significa ser conivente com o pecado deles.
No livro de Samuel, a Bíblia relata a triste história do profeta Eli. Ele era o tempo todo conivente com o pecado intencional dos filhos. E pagou caro por isso. Meu pai sempre dizia: “Meu filho, se você fizer alguma coisa errada por aí e for preso, não conte comigo para nada. Não vou gastar um centavo, não vou mover um dedo para tirar você da cadeia”.
Em 2013, após dar uma entrevista na Rádio 92, de São Luís, sobre o lançamento do meu livro "E assim o amor acontece" (Arte Editorial, SP, 2013), uma jovem mulher me ligou. Ela disse que o seu marido acabara de deixá-la e estava vivendo com uma moça de dezoito anos. A coisa mais difícil de entender é que ela não tinha feito nada. Segundo ela, foram 13 anos de casamento equilibrado e feliz. O casal teve uma filha, que ficou com a mãe. Ela me disse que, ao perguntar ao marido o porquê da decisão, ele respondeu: “É que essa menina era virgem”.
O que eu aprendi com esse casal de jovens é que não há mais compromisso em nossas instituições modernas. Além de inimigos familiares, são irresponsáveis. Não têm a quem responder por seus atos. Não se importam.
Dizem que o credo do narcisista é: “Não tenho nada a ver com você. Nem você comigo. Eu cuido de mim e você cuida de você. Cada um por si”. O problema é que esse credo não é novo. É tão antigo quanto a história de Caim e seu irmão. Na história da humanidade, foi Caim o primeiro a dizer para Deus com desdém: “Não sei. Acaso sou guardião do meu irmão?”.
Caim não disse isso para justificar o assassinato de seu irmão Abel, mas sim para justificar sua falta de interesse pelo bem-estar do seu irmão. “Eu cuido dos meus interesses, e ele que cuide dos seus”. E qual foi a punição de Caim por isso? Por não se importar? Caim foi condenado a vagar sozinho pela face da terra, sem nenhum lugar que pudesse chamar de: "este é o meu lar". Sem nenhuma comunidade de pessoas que pudesse dizer: “estes são meus irmãos”. Caim foi condenado a caminhar na escuridão, isolado do mundo. Porque quem não se importa, quem é estúpido, quem é rebelde e ingrato e faz os outros sofrer com as suas injustiças, caminha na escuridão.
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Pr. Battista Soarez