Política, educação e mediocridade
Por BATTISTA SOAREZ
(Jornalista, escritor, sociólogo, psicanalista, consultor e professor universitário).
RECENTEMENTE estive na casa do Dr. Jomar Câmara, subprocurador-geral do Estado do Maranhão. Pelo nível da nossa amizade, temos a liberdade de conversar sobre vários assuntos como, por exemplo, cultura, ciência jurídica, literatura, advocacia, política, religião, teologia, psicanálise e outros assuntos. Então, oportunamente, conversamos sobre política, educação e mediocridade.
— Dr. Battista — disse ele, gentilmente — o cenário atual da política brasileira e mundial preconiza algumas situações que nos levam a pensar em consequências que podem colocar o país em uma trilha de mudanças degradativas difíceis de serem reparadas. O que o senhor acha? Eu acredito que, a partir de agora, a sociedade brasileira entrará num processo de crises fora de controle. O senhor concorda?
— A questão, Dr. Jomar, é que as sociedades usualmente mudam menos do que a maior parte dos indivíduos em períodos de uma a duas décadas. A maioria das sociedades, de modo geral, apresenta, além de outros fatores, períodos de vida muito mais longos, embora ocasionalmente um grande evento (como uma guerra ou um boom econômico excepcional) possa abalar as condições e perspectivas de uma nação rapidamente. Desta forma, forças mais amplas e poderosas, além do controle de qualquer país ou de seu líder, podem alterar o curso dos acontecimentos.
— De fato — interveio Dr. Jomar. — Alguma força nova muda a maneira como as pessoas abordam a vida familiar, como, por exemplo, o surgimento de novas tecnologias que transformam fatores fundamentais em todas as economias ou, então, a queda de um império global. Esses eventos ocorrem e sempre estão ocorrendo no decorrer da história. Estamos vivendo, Dr. Battista, em um período em que três acontecimentos de grandes proporções estão se desdobrando ao mesmo tempo. O primeiro é uma extraordinária mudança demográfica global. O segundo, em nível de globalização, é o rápido avanço de redes mundiais de enorme complexidade de dinheiro, recursos, produção e necessidades do consumidor. O terceiro grande evento histórico é, ainda, o que se relaciona à queda da União Soviética que agora, com a guerra da Ucrânia, trás para o debate global um certo império europeu e sua ideologia politico-socialista de cunho dominante. É um efeito duradouro.
Dr. Jomar e eu avaliamos o fato de que, no último século, toda sociedade avançada e a maior parte dos países em desenvolvimento passaram por um forte crescimento na taxa de natalidade (baby boom), seguido por uma retração na taxa de nascimento (baby bust). No século XIII, a mortandade reduziu um quarto da população europeia. No século XX, as guerras mundiais dizimaram a população jovem masculina de alguns países. E agora, no século XXI, pandemias e vacinas mataram e continuam matando milhares de pessoas (de todas as idades) em todos os países do mundo.
Mas há uma questão que precisa ser avaliada. O que está acontecendo hoje na maior parte do planeta, com relação ao envelhecimento da população, num comparativo com pessoas na idade de trabalho, não tem precedentes históricos.
— Isso terá grande efeito — disse eu, esfregando as duas mãos na cabeça — tanto sobre quão rapidamente os diferentes países crescem quanto sobre a capacidade básica de os governos atenderem às necessidades de dezenas de milhões de pessoas que serão idosas. Isso levou os líderes mundiais, a partir da China, a pensarem na redução da população global.
Essa é a política atual. E esse é o caminho que a humanidade está seguindo. A ideia de vírus, pandemias, vacinas e guerras nasceu exatamente daí.
E mais: há um período inóspito, em que o comércio e as comunicações mundiais se expandiram rapidamente. Nasce, aí, uma guerra contra as mazelas sociais geradas em razão da explosão demográfica. E a fase atual é mais profunda. As novas tecnologias da informação estão afetando as sociedades com mais rapidez.
Dr. Jomar Câmara, com uma brilhante maneira de pensar, fez-me entender que, com relação à política do comércio mundial, o que abre cada país membro da OMC (Organização Mundial do Comércio) ao investimento estrangeiro e à competição externa e interna são as regras gerais que os regem. De fato, se a maioria das pessoas na Europa, no Japão ou nos EUA prospera — ou simplesmente se arranja — isso vai depender de como, e se, seus governos e sociedades encontram um caminho para prosperar sob essas regras e para competir com as combinações sem precedentes de tecnologias avançadas com o imenso número de trabalhadores especializados e de baixo custo na China e na Índia.
— Penso — disse eu ao Dr. Jomar — que as ideologias e os superpoderes globais ruíram muitas vezes em momentos anteriores, mas, desde há tempos, nenhum evento desse tipo deixou uma superpotência militar e econômica em tal situação. Os períodos de mudança mundial são gerados por uma absurda globalização econômica.
Mudanças sísmicas na geopolítica, do tipo que vemos hoje, evidenciam rápida transformação dos maiores países do mundo do socialismo para uma forma turbinada de capitalismo e a mudança do centro da política global das nações do Atlântico para a costa do Pacífico. No lugar da Guerra Fria — e de tudo o que ela exigiu da maioria dos países — a geopolítica dos próximos anos será conduzida por uma combinação de todos esses acontecimentos extraordinários. E o Brasil acaba de embarcar nessa jornada sem rumo e sem porto seguro.
Esses eventos, suas combinações e interações terão efeito profundo no curso de cada sociedade importante e na vida diária de sua população. E nenhuma nação ou pessoa pode optar por evitar suas consequências. Não irão determinar o futuro preciso de ninguém. Guerras e novas alianças, booms e recessões, progresso social e terríveis conflitos domésticos se sucederão nos próximos anos, e cada um surgirá de inúmeras decisões e eventos que ninguém pode conhecer hoje. Mas o que quer que o futuro próximo reserve exatamente para todos nós, ele se desdobrará em um mundo em que essas três grandes forças darão sustentáculo a seu início e a seus resultados. Os efeitos poderosos dessas forças advêm de sua profundidade e de sua amplitude.
Toda essa construção política está ligada ao contexto da educação que concebemos atualmente. Dr. Jomar e eu observamos que, por várias razões, a educação de hoje, no Brasil, é medíocre. Medíocre porque não é nem boa e nem ruim. Mas o que está por trás dela é intencional. Vinda do setor público, a educação brasileira parece ter por objetivo, intencionalmente, produzir pessoas medíocres. É ela, infelizmente, que constrói todas as políticas. Nosso sistema já é medíocre. Por isso a sociedade se conforma com uma cultura educacional medíocre, formando alunos medíocres e jogando no mercado profissionais medíocres. São muitos os detalhes socioculturais que contribuem para essa mediocridade.
A mediocridade já começa pelo plano do sistema educacional. Níveis de prova, seleção de conteúdos, capacitação de professores, relações no ambiente escolar, excessos de trabalhos simplistas e outras deformidades cooperam com a mediocridade da nossa educação. Para piorar, nossos alunos são portadores de uma cultura mental medíocre.
No ensino superior, o professor tem que se esforçar para inculcar na cabeça dos alunos o conhecimento-aprendizagem como se estivesse lidando com criança do ensino fundamental. Não é raro a gente ver em salas de universitários um bando de marmanjos e marmanjas batendo “palminhas”, cantando “musiquinhas” e, juntamente com o professor, fazendo “brincadeirinhas” de crianças como se fossem bebês do jardim de infância. Depois se juntam para falar mal do professor que passa a vida toda em livrarias comprando livros caros, estudando, pesquisando, elaborando, comparando, revisando e contextualizando conhecimentos para dar boas aulas para alunos de mentes medíocres que não têm nenhum compromisso com a vida acadêmica, profissional e nem consigo mesmo.
São mentes preguiçosas que querem diploma mas não querem estudar para dominar o conhecimento que, na hora de buscar um emprego, o mercado vai exigir. Esses alunos medíocres de hoje serão os profissionais medíocres de amanhã que certamente passarão vergonha em razão de uma cultura universitária tosca e deformada.
— Dr. Battista — concluiu o Dr. Jomar Câmara — essa nova geração de alunos e profissionais não sabe ler, não sabe escrever e não sabe pensar. Porque quem não lê, não sabe escrever. E quem não lê e nem sabe escrever, também não sabe pensar.
Isso significa que vivemos em um mundo de mediocridade porque somos formados por uma educação medíocre, em uma cultura de alunos com um nível de mentalidade medíocre. Pior de tudo é que as universidades distribuem formulariozinhos para alunos medíocres avaliarem professores. Desde quando aluno entende de método pedagógico para avaliar professor? Principalmente alunos medíocres que não gostam de ler, não sabem escrever e de absurda pequenez intelectual?
Mas é exatamente dessa educação medíocre que saem os nossos governantes, nossos legisladores, nossos operadores do direito e, portanto, toda essa gente que ascende ao poder e domina politicamente sobre nós. Tudo medíocre: educação medíocre, alunos medíocres, profissionais medíocres, políticos medíocres, judiciário medíocre. Enfim, governantes medíocres. Somos governados por medíocres. Que lástima!